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Afinal, como funciona essa tal intervenção federal?

intervenção federal

Foto: Marcelo Camargo/Agência brasil

O primeiro passo para elucidar essa dúvida é a Constituição. O “livrinho” legal tem solução para quase tudo. E regula muito bem até quando as normas batem cabeças. A harmonia do todo, porém, ameniza possíveis contradições das leis. A Carta Magna do Brasil é rígida. As tentativas de alterações do texto são malabarismos de difícil execução. Além disso, o conjunto da obra tem um núcleo “imexível”, ou cláusula pétrea. Os preceitos dessa “clausura” não podem ser modificados, em hipótese alguma.

Fique atento com o artigo primeiro. Ele determina resumidamente o seguinte: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, Municípios e Distrito Federal, constitui-se em Estado de Direito”. O “X” da questão é o termo “indissolúvel”. Vamos ao ponto. Convém revelar, agora, a verdadeira dinâmica de funcionamento do Estado Nacional Brasileiro. A forma de governo é a República. Já a forma de estado atende pelo nome federação. O sistema de governo é o badalado presidencialismo e o regime de governo foi denominado Estado Democrático de Direito.  

O federalismo é o principal atalho para a resposta ao título do texto. E aqui, só para variar, pintou a jabuticaba- a deliciosa fruta natural da Terra de Santa Cruz. O pacto federativo brasileiro tem uma ocorrência inédita: a inclusão dos municípios na sua estrutura. Essa intromissão inusitada não existe  em nenhum outro ponto planeta. Nem nos Estados Unidos, o símbolo maior do federalismo.  

Mas, como funciona a federação nesse paraíso das bananas? Os Estados e Distrito Federal têm autonomia administrativa e política. Mas,  não são soberanos.  A autodeterminação completa é contida por barreiras constitucionais. A união federativa se encontra em Brasília. Lá na capital federal, cada Estado é representado por três senadores. A “União”- o poder central da nação – é o único detentor de soberania plena.  

E, nesse ponto, entra em campo a palavrinha mágica: “indissolúvel”. O enigmático vocábulo é simples eufemismo para “veto à secessão”. Os Estados brasileiros, portanto, não podem dar “um grito do Ipiranga individual”, mesmo às margens plácidas de um riacho qualquer. Uma unidade federativa não conseguirá se separar do resto do país. Caso ocorra uma tentativa de insubordinação, o presidente da República fatalmente decretará intervenção federal no membro rebelde. Outras circunstâncias provocam imediata ingerência da União. Grave crise institucional ou total descontrole da ordem pública, por exemplo. 

Até o momento, apenas dois presidentes usaram a ferramenta radical. Michel Temer, no Rio de Janeiro, em 2018. A escalada da violência alcançou um patamar incontrolável, na “Cidade Maravilhosa”. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decretou intervenção federal, em Brasília, depois da arruaça de 8 de janeiro. Nessa paisagem de excepcionalidade, os chefes do Executivo estaduais podem, ou não, ser mantidos no exercício do poder. Na capital fluminense, Luiz Fernando Pezão continuou no cargo. Em Brasília, Ibaneis Rocha foi afastado (pela Justiça). A medida extrema tem prazo de validade. E ponto. Depois de toda essa lorota, fica claro que intervenção federal nada tem a ver com recente conversa confusa. A patética reivindicação não passou de confusão mental coletiva.

PS1: os municípios- embora membros da união indissolúvel- não são entes passivos de intervenção federal. Essa prerrogativa é de governador de Estado. Romeu Zema, por exemplo, pode decretar intervenção estadual, em Itabira. O presidente Lula, porém, não pode intervir na terra de Drummond.

PS2: Ao contrário do que garante o senso comum, o Distrito Federal não pertence ao estado de Goiás. Esse pedaço de terra (com status de Estado) apenas abriga a sede da União. Então, é preciso ficar bastante claro o seguinte conceito: Brasília não é Distrito Federal. A capital da República apenas encontra-se no Distrito Federal.

PS3: E aqui está a jabuticaba. A participação indissolúvel dos municípios na federação é de mentirinha. Os Estados têm representantes na União (três senadores). As cidades, porém, não são representadas na Câmara Alta. Os Estados têm poder Legislativo (as Assembleias) e Tribunal de Justiça. Os munícipios até contam com legislativo local (a Câmara de Vereadores), mas não têm judiciário próprio.  Até mesmo por isso, intervenção nas Prefeituras é conversa para governadores.

Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato

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