As mulheres brasileiras vivem uma pandemia dentro da pandemia. Desde 2013, a Organização Mundial da Saúde afirma que a violência contra mulheres é um problema global de saúde de proporções epidêmicas, além de uma grave violação dos direitos humanos.
A afirmação foi feita em audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta sexta-feira (5), que debateu a situação das mulheres durante a pandemia da Covid-19 e o aumento da violência doméstica durante esse período.
Dessa forma, a promotora de justiça e coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (MPMG), Patrícia Habkouk, afirmou também que o Brasil é o quinto país do mundo mais violento contra as mulheres, e Minas Gerais tem um infeliz destaque entre o número de feminicídios.
Portanto, foram 148 mil boletins de ocorrência em Minas nos últimos três anos, com uma média de 150 mulheres mortas em Minas,por feminicídio. “E se ampliarmos para o feminicídio tentado, no qual as mulheres sobrevivem, temos uma média de 426 vítimas por ano, nos últimos 3 anos”. Só esse ano 36 mulheres foram mortas por feminicídio.
Assim, a promotora destacou o importante papel da ALMG na aprovação de leis fundamentais para o enfrentamento da violência contra a mulher durante o período de isolamento provocado pela pandemia.
Leis
Por muitas mulheres estarem isoladas em casa, controladas por seus parceiros, mais expostas ao álcool e às drogas, o acesso à delegacia para denúncias e para a emissão de medidas protetivas, previstas pela Lei Maria da Penha, está dificultado. “Por isso precisamos da regulamentação da Lei 23.644, de 2020 o mais urgente possível. Em vários estados já existe a possibilidade da vítima fazer a denúncia pela delegacia virtual, além de pedir sua medida protetiva”, cobrou do governo.
Ela também destacou a aprovação das leis 23.634, 23.643 e 23.645, todas de 2020, que preveem a utilização de agentes comunitários de saúde na prevenção da violência doméstica, a informação pelos condomínios de casos ocorridos nas suas dependências, entre outras medidas de proteção social e de enfrentamento da violência contra a mulher. “Só em BH tivemos uma queda de dois terços em pedidos de medidas protetivas. Isso é muito sério e mostra a necessidade de atuação para garantir às mulheres o acesso à rede de proteção”, completou.
Chefe do Departamento Estadual de Investigação, Orientação e Proteção à Família (PCMG), Carla Cristina Oliveira Santos Vidal reforçou que durante a pandemia as delegacias da mulher estão atendendo presencialmente 24 horas por dia, com trabalho imediato e presencial. “Mantivemos o atendimento a ocorrências com conduzidos pela polícia, vítimas encaminhadas, precisando de abrigamento. Os demais temos feito de forma remota, via telefone ou Whatsapp, para evitar a ampliação de casos de Covid-19″, explicou.
Ela ressaltou que foram mais de 900 chamadas no Disque Denúncia 180 realizadas de janeiro a abril. A maior parte delas aconteceu durante o isolamento social.
Justiça
A desembargadora superintendente da Coordenadoria da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar, Alice de Souza Birchal, falou de um plano de ação de comprometimento dos Tribunais de Justiça de todo o País para a realização de uma ação de combate à violência, que deverá acontecer até o dia 10, com as farmácias como ponto de apoio. “Não posso dar detalhes dessa campanha nacional, mas estamos comprometidos a maximizar o acesso aos nossos serviços judiciais mesmo em tempo de pandemia”, afirmou.
Denúncia – A diretora de Comunicação da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, Denize Ornelas, denunciou a exoneração da equipe do Ministério da Mulher responsável pelas questões de direito sexual e reprodutivo, após publicação de uma nota técnica pedindo ao governo federal que mantenha o atendimento durante a pandemia.
“Querem ameaçar as profissionais que garantem o direito ao DIU, anticoncepcional, atendimento de vítimas de violência sexual a milhares de mulheres em todo o País. Mulheres pobres e periféricas dependem disso. Mulheres em situação de rua, trans, em prostituição, cada vez mais agredidas e em vulnerabilidade”, disse.
Discussão
A coordenadora de Política para Mulheres da Secretária de Desenvolvimento Social (Sedese), Jailane Devaroop Pereira Matos, disse que a pandemia provocou uma reinvenção necessária, para que as respostas de atendimento continuassem a ocorrer mesmo durante o isolamento social.
Ela citou a manutenção e monitoramento realizados pelo Projeto Sistema Estadual de Redes em Direitos Humanos (SER-DH). “Fizemos campanha em abril para mostrar que a mulher em distanciamento social não está sozinha e que ela pode acionar o 190 para casos emergenciais. Também temos feito reuniões da rede de enfrentamento e estudado ampliar essa campanha com a Rede Minas e usando os SMS da Defesa Civil para que mulheres recebam informativo”, explicou.
A presidenta da comissão, deputada Andréia de Jesus (Psol), enfatizou que pessoas que morrem de Covid-19 são aquelas que não tem o isolamento social como opção, porque precisam de segurança alimentar e continuam trabalhando, especialmente em trabalhos essenciais. “São mulheres que chefiam famílias e não podem deixar de estar presentes. Precisamos fazer esse recorte socioeconômico étnico e racial”.
A deputada Celise Laviola (MDB) propôs moção de apoio a Mirtes Renata de Souza, mãe de Miguel, criança de 5 anos que caiu de um prédio em Recife, porque a empregadora de Mirtes não quis cuidar do menino. “Cada vez que uma criança é agredida, uma mulher é agredida também”.
As deputadas Leninha e Marília Campos, ambas do PT, e a deputada delegada Sheila (PSL) apoiaram a colega e todas assinaram o requerimento.