A Aecom – empresa responsável pela auditoria das barragens existentes nas minas da Vale situadas em Itabira – recomendou a paralisação completa de todas as atividades relacionadas às obras da segunda Estrutura de Contenção à Jusante (ECJ2), do Sistema Pontal. A informação foi divulgada à promotora do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Giuliana Fonoff e repassada para a Assessoria Técnica Independente da Fundação Israel Pinheiro (ATI/FIP) na noite da última terça-feira (10).
A Aecom recomendou a paralisação das obras porque não foi informada previamente pela mineradora sobre alterações feitas nos estudos da mancha de inundação do Sistema Pontal, tendo tomado conhecimento somente ao acessar o Sistema Integrado de Gestão de Barragens de Mineração (SIGBM), mantido pela Agência Nacional de Mineração (ANM). De acordo com a auditoria técnica, a comunidade próxima também não foi comunicada a respeito da mudança.
Entenda a paralisação
A construção da ECJ2 é uma medida adotada pela Vale a partir do Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração (PAEBM) do Sistema Pontal. Esse documento estabelece ações imediatas a serem tomadas em caso de emergências envolvendo barragens, bem como prevê medidas para minimizar riscos às comunidades próximas. Os estudos técnicos elaborados para o PAEBM determinam a mancha de inundação considerando o pior cenário, que seria o rompimento da barragem. Para que essa mancha seja modificada, é necessário um novo estudo técnico e a atualização do PAEBM. Segundo a Assessoria Técnica Independente da Fundação Israel Pinheiro (ATI/FIP), a Vale protocolou no SIGBM, uma mancha de inundação menor do que a prevista no PAEBM.
“Ao protocolar a nova mancha no SIGBM, a Vale descumpriu ao menos três procedimentos que são obrigatórios: o Termo de Compromisso firmado com o Ministério Público; a realização dos estudos técnicos de ruptura para determinar a nova mancha e a atualização do PAEBM”, afirma Péricles Mattar, coordenador da ATI/FIP.
“A AECOM reforça que a mancha disponibilizada no SIGBM, em 01 de abril de 2024, não foi objeto de análise da auditoria. Destaca-se que, em caso de revisão de mancha de inundação, os Estudos de Ruptura Hipotética deverão ser apresentados à auditoria, de forma a seguir o rito de governança previsto no Termo de Compromisso firmado junto ao MPMG. Dessa forma, a AECOM recomenda que a Vale paralise todas as atividades relacionadas às obras da ECJ – Fase 02, do Sistema Pontal, até que seja solucionada a questão referente a mancha nos diques Minervino e Nova Vista”, diz um trecho da recomendação da Aecom.
A recomendação da paralisação surgiu a partir de uma nota técnica, que cita uma série de questões registradas pela Assessoria Técnica Independente: “A Vale precisa entender a importância de mudar a postura, e respeitar a governança estabelecida no Termo de Compromisso assinado com o Ministério Público, com a interveniência da auditoria técnica. É preciso entender e aceitar que existe um novo marco legal, tanto para a questão da Segurança das Barragens, quanto para a participação informada das pessoas atingidas nestes processos. Se insistir em continuar a agir de forma unilateral, como foi no passado, não vai dar certo”, disse Péricles Mattar, coordenador da ATI/FIP.
“Hoje, temos a legislação e atores presentes, em tempo integral, em campo. A empresa precisa iniciar um diálogo com vista à reparação das pessoas atingidas, ao invés de jogar tudo na conta do judiciário, para protelar e adiar. Esse tipo de comportamento só tensiona a relação e onera mais o processo. Quanto antes a mineradora propor decisões mais definitivas, melhor para a própria empresa e para a comunidade, que sofre com o desgaste imenso de cada etapa da Ação Civil Pública”, reforçou Péricles.
Obras da ECJ2 já tem causado diversos transtornos
A Vale retomou na segunda-feira (9) as demolições de oito imóveis adquiridos pela empresa no processo de descaracterização do Sistema Pontal. No entanto, já na terça-feira (10), moradores vizinhos à área de destruição das casas esvaziadas relataram temor e transtorno devido às obras. Poeira, barulho, fortes tremores e danos foram algumas das queixas, além da insatisfação e medo pela proximidade das máquinas pesadas que atuam a poucos metros de distância das residências – onde haviam idosas e crianças no momento das demolições.
O caso desta terça-feira já é a terceira grande queixa em relação às demolições dos imóveis para construção da Estrutura de Contenção a Jusante 2 (ECJ2), obra popularmente conhecida como “mega muro”. Em julho, a Procuradoria Fiscal da Secretaria de Meio Ambiente de Itabira aplicou um ato infracional contra a Vale, após a empresa ter realizado a demolição de imóveis sem ter obtido licença ambiental para tal ação. Devido a infração, que foi considerada grave, a mineradora foi penalizada com uma multa de R$1.106.560,00.
Em agosto, de acordo com o portal Vila de Utopia, o Ministério Público de Minas Gerais havia determinado a paralisação temporária das obras da ECJ2 por descumprimento de normas de segurança e de monitoramento, com ausência de sismógrafos móveis – equipamentos que monitoram as vibrações geradas no local.
O que diz a Vale?
“A Vale esclarece que trabalha para a retomada das atividades, que são fundamentais para a continuidade, com segurança para a comunidade e empregados, do Plano de Descaracterização de barragens a montante do Complexo Itabira, e mantém diálogo com o Ministério Público de Minas Gerais e equipe técnica independente, para resolução e retorno das obras. A Vale esclarece ainda que todas as ações tomadas estão em conformidade com a legislação vigente”, informou a mineradora em nota enviada à DeFato.