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‘‘Chega de empurra-empurra’’: Autoridades voltam a cobrar construção de novo presídio em Itabira

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

Foi realizada na tarde desta quarta-feira (9), no Fórum Desembargador Drummond, mais uma assembleia para discutir a necessidade da construção de uma nova unidade prisional em Itabira. O encontro contou com a presença de representantes políticos, autoridades de justiça, de segurança pública e familiares de apenados, que desde outubro de 2019 têm de conviver com a ausência de um presídio em Itabira. No total, mais de 450 itabiranos estão espalhados por unidades prisionais em cidades mineiras, longe de suas famílias e da observação direta dos executores penais. 

O advogado  João Paulo de Souza Júnior, que preside o Conselho da Comunidade na Execução Penal de Itabira, desde que o presídio foi desativado em Itabira, foram realizadas pelo menos seis reuniões com o município, duas com a OAB Minas Gerais, outras duas com procurador de justiça, além de diversos encontros internos e outras assembleias na Câmara Municipal de Itabira. Também nestes três anos, aproximadamente 10 policiais penais saíram da comarca de Itabira para trabalhar em outras cidades e outros diversos profissionais da segurança perderam seus empregos. 

‘‘O apenado vai voltar e nestes três anos não tivemos a oportunidade de sequer fiscalizar e reeducá-lo, porque ele não está sendo acompanhado pelo nosso juiz de direito […] E isso retorna como alto índice de criminalidade, porque não há uma educação.’’

Dirigindo-se diretamente à Danilo Alvarenga – secretário de Governo e representante do prefeito Marco Antônio Lage (PSB) no encontro -, João Paulo disse: ‘‘Há uma necessidade clara de indicar esse terreno, ao passo que a Vale se comprometeu no termo de ajustamento de conduta. E ainda que o município não tenha feito isso em momento oportuno, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública ou de acordo com o governo estadual, a Vale tem a obrigação dessa construção.’’

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

‘‘Confesso aos senhores que me cansa ter que insistir numa pauta, sendo que as autoridades de todos os poderes e todos os políticos que exercem os cargos necessitam entender que carcerário, o preso, ele é população. Ele é população itabirana e elegeu as pessoas. As famílias deles elegeram pessoas. Os anseios deles têm que ser ressarcidos. Eu preciso que todas essas autoridades que estão aqui hoje se comuniquem num propósito de convencer a Vale da responsabilidade dela.’’

João foi além e seguiu dizendo: ‘‘Não é possível que não tenhamos um terreno. Não é possível que não consigamos obrigar o Estado a uma construção, sendo que todas as questões das comarcas, das cidades que acompanham a comarca, querem a unidade prisional aqui. Até quando vamos deixar os familiares sofrendo?’’

‘‘Elas [as famílias] vão se tornar cada vez mais marginalizadas e elas vão substituir o crime se a gente não cuidar.’’

Ressocialização?

João Fábio Bomfim Machado Siqueira, juiz titular da Segunda Vara Criminal de Itabira e responsável pela Execução Penal na cidade, destacou a necessidade da construção da unidade prisional para os familiares ‘‘que querem o contato mais próximo dos encarcerados’’, os próprios itabiranos que estão presos e ‘‘têm o direito de cumprir as penas mais próximas da residência’’ ou para o Poder Judiciário que ‘‘precisa realizar um trabalho adequado de contenção à criminalidade’’

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

Segundo o juiz, são várias as audiências remarcadas por não conseguir realizar contato com a unidade prisional, além dos incontáveis deslocamentos de familiares, profissionais de segurança e da justiça. Segundo o juiz, todas essas questões impactam no processo de ressocialização dos apenados, algo que ‘‘não existe na cidade’’. 

‘‘A gente sabe da necessidade de existir uma unidade prisional aqui na comarca. Até mesmo para que o engajamento e a cultura do método da APAC cresça, é necessário uma unidade prisional […] Os itabiranos que saem daqui e vão cumprir penas de outras unidades prisionais, não se ressocializam. Infelizmente eles voltam mais especializados na criminalidade, porque eles tomam contato com organizações e facções criminosas diversas e quando voltam aqui, eles voltam com uma expertise maior no cometimento de crimes […] Os que a gente condena e manda para fora cumprir a pena, eu não consigo acompanhar. Eu não sei como está sendo a execução deles. Se eles estão aqui, eu como juiz da execução penal, consigo me responsabilizar.”

Três anos – quase quatro – ‘‘empurrando com a barriga’’

A presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Itabira, Patrícia de Freitas Vieira, criticou o jogo de ‘‘empurra-empurra’’ que os responsáveis pela questão vem travando há quase 4 anos. Para Patrícia, desde que a unidade prisional foi fechada ‘‘reuniões e reuniões, conversas e conversas’’ foram realizadas, sem nada efetivo ser feito.

‘‘Já se passaram três anos e a gente não tem nada definido. A gente precisa parar um pouco com o ‘empurra-empurra’, com o ‘joga a responsabilidade para um, joga para outro’ e, de fato, conseguir trazer uma ação efetiva, uma convergência de ideias para que a gente possa cobrar quem realmente vai resolver o problema’’. A presidente da OAB disse acreditar que Vale vai construir o presídio, que a Prefeitura cederá o terreno e que o governo de Minas Gerais irá viabilizar a construção, porém:

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

‘‘Há três anos a gente está acreditando nisso e não tem visto nada de efetivo acontecer. Talvez porque não seja um assunto muito popular, talvez seja um assunto que não tenha interesse político eleitoral ou porque ninguém quer um presídio perto da sua casa. Mas precisamos enfrentar e discutir todos esses assuntos para que a gente consiga quebrar, inclusive, os preconceitos que circulam este tema.’’ 

O delegado regional da Polícia Civil, Dr. Helton Cota, endossou o coro e disse: ‘‘A gente podia tentar aproveitar todas as instituições aqui reunidas e começar a colocar isso no papel. Talvez utilizar uma ação civil pública, colher compromissos de possíveis candidatos à Prefeitura que aqui estão presentes, de atuais membros do governo… Não sei, pensar em alguma coisa diferente, porque essa conversa a gente já teve várias e várias vezes e não saímos do mesmo lugar.’’

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

Assinatura de Ata

João Paulo, presidente do Conselho, frisou a importância da participação das entidades e sociedade civil na discussão e também cobrou a responsabilidade dos responsáveis em solucionar o problema: ‘‘Eu preciso, de certa forma, que todos nós assinamos o documento. E que se isso não for feito [solução a respeito da unidade prisional], o Conselho da Comunidade, dentro de seis meses, proporá ações cabíveis aos órgãos e às entidades que, de fato, têm que construir essa unidade prisional e também, dar assistência aos familiares.’’

‘‘A responsabilidade pela construção [do presídio] é do Estado e da Vale. Da Vale por ter retirado nossa unidade prisional existente, e uma competência legislativa de construção, que é a do estado de Minas Gerais. A partir do momento que, mais uma vez, o município de Itabira expede um ofício dizendo que está à disposição e que o Governo pode escolher um terreno para que seja construído, nós já conseguimos caminhar […] Se foi firmado um TAC (termo de ajustamento de conduta), o próprio estado pode exigir que a Vale construa’’, finalizou João Paulo.

Em tempo

O presídio de Itabira estava em funcionamento há pouco mais de 10 anos e tinha capacidade para 200 detentos. Foi desativado por determinação da juíza Cibele Mourão Barroso de Figueiredo Oliveira, da 2ª Vara Criminal de Itabira, por ser localizado em Zona de Autossalvamento (ZAS), próximo à barragem de Itabiruçu. Os detentos foram transferidos para outras unidades prisionais de diversos municípios, de acordo com a disponibilidade de vagas.

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