Rosilene Gomes de Moura, moradora do distrito de Itacolomi, em Conceição do Mato Dentro, levanta às 6h30 todos os dias para dar início às entregas dos produtos que fabrica em casa. Aos 50 anos, a produtora rural costumava expor suas quitandas no Mercado Municipal Maurílio Lages, local em que trabalha há 21 anos. Contudo, desde o decreto municipal que proíbe a realização de feiras livres, Rosilene precisa bater de porta em porta para vender farinha, doce, rosquinha e várias outras iguarias que garantem o sustento da família.
Ela e o marido, que atualmente está desempregado, moram com os dois filhos, a neta e o genro. Segundo Rosilene, a maioria da renda da família vem da produção rural. “A gente faz queijo e requeijão também, meu marido me ajuda. Desde quando fechou o Mercado, a gente não sabe se vai abrir ou não. A situação está difícil e continuamos com as bocas para alimentar”, conta a conceicionense. Rosilene afirma que a situação financeira ficou ainda mais apertada depois que precisou fazer um empréstimo no banco.
Rotina pesada
Diante do cenário, dona Rosilene precisou reorganizar a sua rotina para manter a clientela. Até às 17h30, a produtora aborda aproximadamente 40 casas de diferentes bairros do município para oferecer os produtos. Ela ainda relata que se o dia for positivo e todas as quitandas forem vendidas, não há obstáculos para voltar em casa e buscar mais, para oferecer em outros locais.
“Vou andando pelos bairros de Conceição afora mostrando meus produtos. Seria muito bom se o mercado voltasse a funcionar porque está fazendo muita falta. Ir de porta em porta deixa a gente mais cansada”, conta a produtora.
Apesar do esforço, para Rosilene, a sua rotina não é tão pesada quando comparada com a das amigas, que precisam vender frutas, verduras e legumes. “Eu já acostumei a vender de porta em porta, mas eu fico com dó das minhas colegas que são mais de baixa renda. Elas vendem bananas e coisas da roça. Pensa na penca de banana, não tem como carregar porque é muito pesada, sem contar que a fruta perde rápido e a verdura também”, conta.
Uma das colegas que Rosilene cita é Maria das Dores, de 60 anos. Também moradora do distrito de Itacolomi, Maria costumava vender frutas, verduras, legumes, frango e muitos outros alimentos advindos da vida na roça. Ela conta que o mais difícil sem o Mercado Municipal é vender o frango, já que não tem como carregá-lo para comercializar de porta em porta.
“Está mais difícil porque a gente cansa muito para fazer entregas. Eu estou entregando de porta em porta tudo que tenho da roça. Se voltasse a funcionar o Mercado seria bom, a gente ia ficar menos cansada”, conta a produtora.
Atualmente, Maria mora com mais três irmãos e está prestes de completar 40 anos como produtora rural do Mercado Municipal.
Sem queijo
Com a produção pequena e a venda direta aos consumidores, o produtor Afrânio Lages Neto, conhecido como Netinho, também está preocupado com o período em que o Mercado Municipal está fechado. Ele vende queijo artesanal e desde muito novo reconhece a atividade rural como ofício. Netinho conta que o mercado era o único local disponibilizado de forma democrática para o produtor rural em Conceição do Mato Dentro, já que o espaço era ponto de atendimento direto com o consumidor final.
“O produtor no mercado consegue fazer uma boa venda e ainda é pago à vista. O horário de funcionamento também é de acordo com a rotina dos produtores, sem falar do ponto estratégico e da autonomia no processo de venda. O mercado foi fechado abruptamente, não foi conversado sobre uma possível reabertura até o momento”, reclama o produtor.
Para Netinho, o produtor rural de Conceição não está tendo onde expor seus produtos e por isso se arrisca até em vender os produtos pelas ruas da cidade, na clandestinidade, desrespeitando o decreto municipal. “O questionamento é: porque permitir a abertura de sacolões e não do mercado? Claro que se for reaberto vamos tomar todas as medidas para a prevenção sanitária”, afirma o conceicionense, que também é ex-presidente do sindicato dos produtores rurais.
Netinho ainda conta que junto do Mercado também foram fechadas a loja da Associação dos Fabricantes de Queijo (AMPAQS) e a loja de artesanato. “Vários estabelecimentos semelhantes permanecem abertos. Lá, além de queijo, também temos espaços para produtores de doces, cachaça e linguiça, por exemplo”, relata.
Segundo Netinho, com o fechamento da loja, 12 produtores de queijo foram impactados, além dos 15 que ofereciam o produto no Mercado Municipal. Ele disse que para evitar aglomerações, as reuniões da AMPAQS foram canceladas e, desde então, organizar um movimento para pedir o retorno do Mercado Municipal tem ficado cada vez mais difícil, visto que encontro virtuais divergem da realidade da maioria dos produtores, que vivem na zona rural.
A Prefeitura de Conceição foi procurada pela reportagem para se posicionar sobre o assunto. Contudo, até a publicação dessa matéria, a DeFato não obteve retorno.