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Conheça Pollyanna Andrade, a voz do futebol mineiro há quase 24 anos

Pollyanna Andrade

Foto: Arquivo pessoal

O que compõe uma grande partida? Um estádio lotado, um gramado impecável, grandes craques, golaços. Mas no futebol mineiro, um elemento, quase imperceptível, engrandece ainda mais o jogo há 23 anos. Trata-se de Pollyanna Andrade, locutora do Mineirão desde 1999, quando tinha apenas 18 anos.

Em entrevista exclusiva à DeFato, a carmopolitana falou sobre sua trajetória, a angústia durante o trabalho remoto na pandemia, suas lembranças mais marcantes da carreira e deixou registrada sua torcida por um final feliz no imbróglio atual envolvendo Mineirão e Cruzeiro. No mês internacional da mulher, Pollyanna Andrade é símbolo do protagonismo feminino no futebol atualmente.

Foto: Arquivo pessoal

Apoio da “Bel”

A história que contaremos realmente parecia predestinada a acontecer. Hoje locutora no Independência, casa do América-MG e “segunda casa” de Cruzeiro e Atlético, Isabel Andrade foi quem recebeu o convite para trabalhar no Gigante da Pampulha em 1999. Porém, devido à indisponibilidade de fazer todos os jogos, a “Bel”, como é carinhosamente conhecida, indicou a irmã, Pollyanna, que sequer pensava em trabalhar apenas com a voz no futuro.

“Não foi nem uma coisa assim ‘ah, eu vou trabalhar com voz’, as coisas foram acontecendo naturalmente. A minha irmã tem um papel muito importante na minha vida, não só pessoal mas profissional também. Ela é quatro anos mais velha do que eu e foi abrindo as portas para mim, nossas vozes são muito parecidas. Ela faz a locução no Independência e tem gente que acha que sou eu (risos). Morávamos em Divinópolis, a “Bel” veio para BH fazer Jornalismo e começou a trabalhar no canal 23, na Rede Super. À época, eu tinha 16 anos e ela me indicou em Divinópolis para apresentar o telejornal que ela apresentava, em uma afiliada da Rede Minas. E aí comecei a apresentar”, relembra.

Pollyanna e Isabel Andrade, irmãs de sangue e de profissão. Foto: Arquivo pessoal

Após a experiência com apresentação de um telejornal na terra natal, Pollyanna também rumou a Belo Horizonte para fazer Jornalismo, com apenas 17 anos. Lá, além do curso, acumulou trabalhos como assessora de imprensa, mestre de cerimônias, TV Câmara, entre outros. Até surgir o convite que mudou sua vida para sempre.

Uma jovem Pollyanna Andrade, com apenas 18 anos, em um dia de jogo no Mineirão. Foto: Arquivo pessoal

Porém, o início não foi fácil. A jornalista conciliava a locução no estádio com outros trabalhos, como o período no Diário dos Associados, onde dividiu espaço com nomes importantes do meio esportivo mineiro, entre eles Son Salvador, Nelinho e Jaeci Carvalho. Por isso, “batia ponto” somente no dia das partidas.

O trabalho passou a ser exclusivo, mesmo, depois da reforma do Mineirão, entregue em 2013. Naquele momento, Pollyanna Andrade trocou a incerteza em relação ao futuro pela realização de um sonho.

“Quando o Mineirão fechou para reforma, fui para Sete Lagoas fazer os jogos na Arena do Jacaré. E vivíamos uma expectativa muito grande sobre como seria após o retorno do Mineirão, com um novo contrato, nova administração… era um sonho continuar no Mineirão reformado. E como se não bastasse esse sonho de continuar na locução do estádio, quando o Mineirão reabriu, em 2013, recebi o convite para, além de estar lá no dia dos jogos, assumir a ouvidoria do estádio. Hoje sou a responsável por esse setor e passei a ir também no dia a dia, de segunda a sexta. E aí precisei abrir mão das outras coisas”, explica.

Apaixonada por futebol desde a infância, quando sentava ao lado do pai para assistir aos jogos, a locutora demonstrou certa apreensão com a nova função. Porém, o trabalho na ouvidoria se consolidou e hoje ela demonstra muito orgulho em atender os visitantes não só nos dias de jogos, como também em shows e outros tipos de evento.

Após o fechamento do Mineirão para reforma, Pollyanna seguiu o trabalho de locução em Sete Lagoas, casa de Cruzeiro e Atlético durante o período. Foto: Arquivo pessoal

Momentos mais marcantes

E quais foram os momentos mais marcantes até aqui? Diante de uma caminhada prestes a completar 24 anos, responder a essa pergunta não é das missões mais simples. Porém, como alguém acostumada a atender aos dois lados da lagoa, Pollyanna cita lembranças envolvendo Cruzeiro, Atlético e até a seleção brasileira.

“É até difícil citar apenas um, mas o primeiro que me marcou foi a final da Copa do Brasil de 2000, a conquista do Cruzeiro em cima do São Paulo, foi meu primeiro jogo grande. Em 2004 e 2008, tivemos Brasil e Argentina no Mineirão, o de 2004 o Ronaldo Fenômeno marcou três gols, foi meu primeiro clássico sul-americano, um jogo muito marcante para mim. E outro jogo muito importante foi Atlético e River, em 2021, quando retornou o público após a flexibilização durante a pandemia”.

Um dos clássicos entre Brasil e Argentina acompanhados pela jornalista. Foto: Arquivo pessoal

A pandemia, aliás, representou um período difícil para Pollyanna. Seguir o trabalho remotamente causou uma angústia que só terminou após o retorno dos torcedores às arquibancadas.

“Foi muito ruim. Eu gravava as coisas e enviava, pois os jogos aconteciam, mas fechado, sem público, aquela coisa super rígida mesmo. Então eu gravava as escalações e a escala de arbitragem para imprensa, jogadores e comissão técnica, mas as coisas que aconteciam na hora, como substituições e acréscimos, não dava. E depois liberaram a gente fazer ao vivo, mas era muito ruim você olhar para a arquibancada e não ter torcedores. Então esse jogo do Atlético contra o River foi muito emocionante, foi sobre voltar a falar e ser respondido”, declara.

O período recente mais difícil para a locutora: o Mineirão vazio durante a pandemia. Foto: Arquivo pessoal

A “vibe” da partida

Quem costuma frequentar o Mineirão conhece bem o estilo de locução de Pollyanna. A alegria e a empolgação transmitidas pela voz contagiam a torcida, principalmente, antes dos jogos. Porém, isso nem sempre é possível.

Utilizando o Cruzeiro e Palmeiras de 2019 – que decretou o até então inédito rebaixamento da Raposa para a segunda divisão – como exemplo, questionamos à jornalista se o contexto do jogo interfere em seu estilo de locução. Ela confirmou que o início até pode ser empolgante, mas o ritmo dificilmente se mantém.

“Sim. Pegando esse jogo, por exemplo, você até começa animada, tentando colocar a torcida para cima. Mas se a bola rola, o time não corresponde, leva o gol e a torcida começa a vaiar e cobrar, não tem como eu continuar na mesma empolgação. É até perigoso te acusarem de torcer para o time rival, tem que ter muita responsabilidade de sentir mesmo o momento pra saber quando ir com um tom mais empolgante ou algo mais neutro e sério. Isso tem muito a ver com a despedida, a gente sempre inicia empolgado, mas o final nem sempre é (empolgante)”, pontua.

Porém, nos melhores dias de time e torcida, o ambiente dos jogos reforça uma tendência bem atual do futebol: a transição para o entretenimento. Ir ao estádio deixou de ser apenas sobre assistir seu time do coração, mas sim aproveitar uma experiência completa.

Pollyanna Andrade explica como o movimento contribui com sua função. “Acho positivo e gosto quando ajudo nessa questão (do entretenimento). Por exemplo, hoje temos um trabalho muito em conjunto com o telão. Então já tivemos quiz, com perguntas sobre a história do clube e quem acertasse ganhava um brinde. Recentemente, nos jogos do Cruzeiro, tínhamos o quadro conexão celeste, tem a câmera do beijo, pedimos para a pessoa mostrar qual vai ser o placar. E é algo totalmente no improviso, porque não sabemos o que vai aparecer no telão, então temos que estar prontos para sermos criativos. É uma troca com o torcedor que eu adoro”, comenta.

Foto: Arquivo pessoal

Preparação

Sobre a preparação para os jogos, é necessário um trabalho diário, que passa por exercícios voltados apenas à voz e cuidados cotidianos. A locutora dá mais detalhes sobre o processo.

“É até interessante essa pergunta, porque eu acho que é importante o aquecimento no dia do jogo, mas a voz é como um atleta, precisa aquecer diariamente. Os fonoaudiólogos falam que somos atletas da voz. Então tem que fazer um trabalho todo dia para, quando chegar a hora, você estar com a voz em boas condições. E aí antes (das partidas) também há os trabalhos de aquecimento, então o cuidado no dia a dia e antes do jogo é fundamental. Sem falar de outros cuidados diários, como beber água regularmente, não fumar, não ingerir muita bebida alcóolica, ter uma alimentação saudável, evitar gritar. São cuidados bons não só para a voz, mas para tudo na vida”, ressalta.

E ainda há muito interesse em saber quem é a voz por trás do Mineirão? Pollyanna garante que sim, embora sua experiência com telejornalismo tenha dissipado um pouco dessa curiosidade.

“Sim, acontece. Tanto nas redes sociais quanto ao vivo tem gente, até hoje, que me identifica pela voz. Já aconteceu de eu estar em um estabelecimento comercial ou um posto de gasolina e alguém falar: ‘vish, conheço a sua voz’. Aí eu brinco e pergunto: ‘você gosta de futebol?’, e a pessoa ‘ahh, já sei’. E pelo fato de eu ter apresentado programa durante muito tempo, tem gente que me identificava pela imagem. Mas já tem muito tempo que eu não apresento o programa, então acontece menos”. 

“Na rede social é muito engraçado, porque tem gente que comenta: ‘nossa, é você? Achei que fosse um robô’. Eu tento humanizar o negócio, e tem gente que acha que é um robô (risos)’”, conta ela, de forma bem humorada.

As redes sociais, inclusive, eram tratadas com certo pé atrás pela carmopolitana, que aos poucos foi se tornando mais ativa. Pollyanna costuma utilizar seus perfis no Instagram e no TikTok para postar seu trabalho e receber o carinho dos torcedores.

No TikTok, por exemplo, seu primeiro conteúdo gravado no Mineirão rapidamente chegou a 100 mil visualizações. Repercussão que ainda impressiona a locutora, cuja missão atual é responder aos milhares de comentários recebidos nas redes.

Foto: Arquivo pessoal

Cruzeiro x Mineirão

Um dos principais temas do futebol mineiro em 2023 é o desacerto entre Cruzeiro e Mineirão. Insatisfeita com alguns termos impostos pela gestão do estádio, a Raposa tem atuado em outros campos, como o Estádio Kleber Andrade, em Cariacica, onde jogou no último sábado (4).

Perguntada sobre o seu sentimento ao acompanhar este imbróglio, Pollyanna enfatizou não poder falar em nome da administração do Mineirão, mas deixou sua torcida por um final feliz da história.

“Não posso falar pelo Mineirão, que tem seus próprios gestores que se manifestam sobre o assunto. Mas o que posso falar é que amo trabalhar nos jogos no Mineirão. Fiquei muito feliz com esse retorno do Atlético, e estou torcendo muito para que haja um acordo entre Cruzeiro e Mineirão, porque sinto falta, amo trabalhar em jogos. Pode ser domingo, quarta-feira à noite, não tem problema, vou trabalhar com prazer, porque é juntar o útil ao agradável. Queremos, sim, receber todos os jogos. Não vou entrar nesse mérito da questão dos shows, não cabe a mim falar, mas na minha opinião o Mineirão é a casa do futebol mineiro. Fiquei feliz com o retorno do Atlético, e estou torcendo muito para o Cruzeiro também voltar a jogar. Que isso aconteça logo, porque faz falta”, diz a locutora.

A mulher nos estádios

Por fim, seria impossível falar sobre o trabalho de Pollyanna no Mineirão, durante o mês internacional da mulher, sem citar o crescimento da presença feminina no futebol. Segundo a jornalista, já no final dos anos 90, o cenário já registrava uma tímida evolução.

Porém, 24 anos depois, o protagonismo das mulheres é uma realidade cada vez maior, embora ela mesmo admita que ainda há muito o que se conquistar. Pollyanna utiliza seu próprio exemplo, como quem teve que lidar com a desconfiança em um ambiente predominantemente masculino, para analisar essas mudanças.

“Quando comecei, no final da década de 90, esse movimento já estava começando, mas era bem discreto, em todos os sentidos, seja nos estádios, na arbitragem, no futebol feminino ou no jornalismo. Eu nunca sofri preconceito diretamente, mas percebia o olhar desconfiado em relação a nosso trabalho. Acho que não só pelo fato de eu ser mulher, mas era muito nova, tinha 18 anos. Então tinha que me provar independentemente da minha idade e do meu sexo. Mas com o passar dos anos, a gente viu uma mudança nesse cenário, as mulheres cada vez ganhando mais espaço em todos os pontos relacionados ao futebol. No jornalismo esportivo são inúmeras mulheres, nos estádios é muito interessante, converso com locutoras do nordeste, do sul. Sem contar o futebol feminino, que ainda não é o ideal, mas a gente vê que as coisas estão caminhando. E o que mais quero é a presença feminina nos estádios, acho sensacional. No Mineirão nos preocupamos muito com isso, queremos mostrar o quão importante é a mulher ocupar seu lugar, ser respeitada. Então fico muito feliz com essa evolução”, finaliza.

Foto: Arquivo pessoal
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