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Delação de Mauro Cid preocupa Ministério Público e gera receio de efeito cascata

Áudio de Mauro Cid expõe Polícia Federal e Moraes a paralelo com Moro e Lava Jato

Foto: Lula Marques/Agência Brasil

O tenente-coronel Mauro Cid, ex-auxiliar de ordens do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL), acertou com a Polícia Federal (PF) a sua colaboração, por meio de uma delação premiada, no inquérito das chamadas milícias digitais e ações conexas, como a investigação sobre a venda de presentes oficiais recebidos pelo governo Bolsonaro. O acordo foi homologado no último sábado (9) pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Nas redes sociais, o procurador-geral da República, Augusto Aras, destoou da decisão de Alexandre de Moraes e afirmou que o Ministério Público Federal (MPF) não concorda com acordos de delações premiadas firmados com a PF, como no caso de Mauro Cid.

Aras lembrou que, pelo mesmo motivo, a instituição adotou entendimento anterior que foi aplicado às delações de Antônio Palocci e do ex-governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral. Aras acrescentou que o subprocurador-geral da República que se manifestou na delação de Cid apenas postulou “que se cumpra a lei”.

A decisão de Moares foi proferida no âmbito do inquérito das milícias digitais, a principal apuração no STF contra Bolsonaro, e mira, entre outros pontos, os ataques às instituições, a tentativa de golpe e o caso das joias.

Entendimentos

A decisão pode abrir um precedente inédito, segundo alguns especialistas. São lembrados casos de 2021 em que o plenário da Corte decidiu sobre a celebração de acordos de delação premiada pela PF e que tratavam de circunstâncias aparentemente diferentes.

Em 2018, o tribunal julgou ação movida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) que pedia a declaração de inconstitucionalidade de dispositivos da lei que trata das delações, sancionada em 2013.

À época, o tribunal rejeitou o pedido e entendeu, por dez votos contra 1, que delegados de polícia podem sim firmar acordos de delação durante o inquérito policial. O voto vencido foi do ministro Edson Fachin. Já o ministro Luiz Fux e Rosa Weber deram aval à PF, desde que o Ministério Público concordasse.

O tema voltou à pauta em 2021, com o caso de Sergio Cabral, quando sete dos 11 ministros votaram para revogar a homologação da delação dele com a PF, dando razão à PGR, que apontou ausência de aval do MP. O grande motivo de discordância à época foi a cláusula do acordo em que a PF deu a Cabral 120 dias para apresentar fatos novos e provas, após a homologação do acordo com a Justiça.

A delação é um meio de obtenção de prova, que não pode, isoladamente, fundamentar sentenças sem que outras informações confirmem as declarações feitas. Os relatos devem ser investigados, assim como os materiais apresentados no acordo. A instituição MP pode, por seu lado, decidir não usar o acordo de delação, o que em tese pode ocorrer no caso de Mauro Cid.

Efeito cascata

O professor de direito penal da USP, Marcelo Dieter, ressalta que, por sua vez, a homologação permite ao ministro Moraes decretar uma série de medidas a partir dela, desde quebra de sigilo até operações de busca apreensão e mesmo prisão preventiva. No caso de Mauro Cid, Moraes decidiu por liberá-lo de cumprir pena em regime fechado após o acordo entre as partes.

Fatos colhidos nessa homologação e outras etapas de investigação podem forçar que o MP não ignore o acordo. O mandato de Aras frente à PGR termina neste mês, o que pode permitir que outro procurador avalie o caso.

Dieter avalia que a decisão de Moraes pode provocar um efeito cascata, estimulando acordos feitos diretamente entre as defesas dos réus com a PF, independentemente da anuência do MP. Isso estimularia o poder das polícias, em âmbito federal e estadual, tendo efeito em diversos tipos de crime, desde o político ao comum.

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