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Em um acordo de R$ 900 mi, Anglo American reassentará comunidades em Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas; entenda

Em um acordo de R$ 900 mi, Anglo American reassentará comunidades em Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas; entenda

Comunidade São José do Jassém, na região de Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas - Foto: Divulgação/Nacab

Após mais de um ano em negociações, cerca de 400 famílias atingidas pela mineração fecharam um acordo de R$ 900 milhões com a empresa Anglo American para o reassentamento de quatro comunidades rurais localizadas abaixo da barragem de rejeitos da multinacional, em Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas.

O Termo de Acordo foi assinado no dia 27 de novembro de 2024 por representantes dessas quatro comunidades; da mineradora Anglo American; dos dois municípios; do governo do Estado; do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e do Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab), que é uma Assessoria Técnica Independente (ATI) responsável por atender as famílias atingidas pela mineração em Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas.

Entre agosto e novembro, as últimas negociações foram mediadas pelo Centro de Autocomposição de Conflitos e Segurança Jurídica (Compor-MPMG) e pela Câmara de Prevenção e Resolução de Conflitos (CPRAC-MG). Foi uma conquista inédita a participação das pessoas atingidas nessas reuniões, por meio de representantes eleitos por elas, que fizeram diretamente a defesa de seus direitos.

Essas famílias contaram com o apoio da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais do Ministério Público (Cimos-MPMG) e do assessoramento técnico do Nacab.

Reunião para assinatura do acordo no MPMG – Foto: Ascom/MPMG

Inédito e transformador

O Compor-MPMG chamou de “consenso inédito e transformador” por ter sido a primeira vez que pessoas atingidas participaram da mesa de negociação para um acordo dessa relevância.

Foi também a primeira vez que a Lei Mar de Lama Nunca Mais (nº 23.291/2019), que instituiu a Política Estadual de Segurança de Barragens, foi aplicada em contexto fora de emergência ou de rompimento de barragem, determinando um reassentamento preventivo.

Ainda, foi inovadora a aplicação da recente Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB), Lei nº 14.755/2023, que estabelece em seu artigo 3º os direitos das populações atingidas por barragem.

Momento de votação das propostas do Plano de Reassentamento – Foto: Cecília Santos

Embora tenha havido acordo, é importante ressaltar que o reassentamento é involuntário, pois as famílias serão obrigadas a deixar seus territórios devido ao risco de permanecerem abaixo da barragem de rejeitos. “Não é momento de festejar porque um reassentamento forçado nunca é bom, mas parabenizo as comunidades pela maturidade demonstrada nesse processo tão difícil. Em nossa visão, há pontos nessa proposta que não contemplam plenamente os direitos das pessoas atingidas, mas as comunidades chegaram à solução possível para o momento, considerando principalmente a incerteza e a demora comuns na via judicial. Celebro o direito de participação que foi reconhecido às comunidades, de maneira que as pessoas puderam acompanhar e participar diretamente das negociações”, avalia José Ignácio Esperança, coordenador jurídico do Nacab.

Acordo não cobre todos os direitos previstos nas leis

Um dos dissensos levados ao Compor-MGPM passou pelo tamanho do terreno para reassentamento rural. A proposta da Anglo American inicialmente era de destinar 2 hectares e a proposta final foi fechada em 5 hectares livres por propriedade (descontando a reserva legal).

Já a proposta das comunidades, com base na PNAB, apontava como parâmetro o módulo fiscal dos municípios, que em Conceição do Mato Dentro é de 20 hectares e em Alvorada de Minas é de 30 hectares. “A proposta comunitária defendeu o módulo fiscal por ser a unidade de medida definida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária [INCRA], que corresponde à área mínima necessária para que uma propriedade rural seja economicamente viável. É uma forma de possibilitar que as famílias consigam progredir economicamente após o reassentamento, tendo em vista os diversos impactos que a realocação trará para as relações econômicas e sociais existentes atualmente. A proposta possui respaldo na Lei nº 14.755/2023, da PNAB, que prevê o módulo fiscal como parâmetro para os reassentamentos rurais”, explica a analista jurídica do Nacab, Josiane Guimarães.

O que dizem as pessoas atingidas

Moradora da comunidade de Passa Sete, Silmara Marcelina Silva afirma que “como representantes das comunidades abaixo da barragem, reconhecemos que foi extremamente importante participar de uma mesa de negociação de um processo judicial. E por mais que todo esse processo tenha sido amplamente divulgado e informado, com o apoio da assessoria técnica, ainda assim, nos vimos obrigados a tomar decisões em curtos prazos e na pressão de estarmos abaixo de uma barragem. Tivemos de abrir mão de alguns direitos, mas também tivemos conquistas. Quem imaginava que atingidos iriam ter falas na mesa de negociação com vários representantes de estado, vários órgãos? A participação comunitária foi muito assertiva e foi muito efetiva. E assim, esperamos que em processo como esse, as comunidades tenham voz, cada vez mais”.

Silmara Marcelina da Silva – Foto: Patrícia Castanheira

Já José Miguel Rodrigues, morador da comunidade do Beco, desta que “essa participação comunitária seja um exemplo para outras, porque é um negócio assim que tivemos que ter garra, pois estávamos em uma mesa negociando e esse caminho está sendo aberto para que outras comunidades tenham voz em processos como esse. A participação comunitária e o apoio do Nacab foram essenciais. Peço que a comunidade continue participando”.

José Miguel Rodrigues – Foto: Patrícia Castanheira

Relembre

As negociações iniciaram após sentença judicial, de setembro de 2023, que obriga a Anglo American a reassentar as famílias, baseada na Lei Mar de Lama Nunca Mais. A Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad-MG), também ré nessa ação, ficou proibida de emitir novas licenças ambientais para alteamento ou ampliação da barragem.

Com a homologação desse acordo, o processo judicial será extinto e, a partir daí, se inicia outra longa jornada: a execução do Plano de Reassentamento, que será feita com participação e monitoramento das pessoas atingidas.

Dados sobre a barragem da Mina do Sapo, da Anglo American

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