Em um julgamento que provoca intensos questionamentos e deixa empresários receosos quanto à reação da classe trabalhadora, o Tribunal de Direito Público da Suíça deu um veredito que permitiu à empresa Jean Singer et Cie, especializada em mostradores de relógio, a obrigar seus funcionários a marcar o ponto quando se dirigirem ao banheiro para suas necessidades fisiológicas.
A decisão do tribunal levanta questões delicadas sobre os direitos trabalhistas e o que pode ser considerado como parte da jornada do trabalho.
A decisão foi divulgada em setembro de 2024, aproveitando uma brecha na lei trabalhista suíça que não aborda essa situação e cria um espaço para que outras empresas também explorem essa decisão do tribunal.
Tudo começou em 2021, segundo o canal suíço RTS, quando inspetores do Gabinete de Relações e Condições de Trabalho (ORCT) de Neuchâtel foram verificar se as normas de proteção contra a Covid-19 eram seguidas pela empresa. Na oportunidade, os inspetores puderam constatar que a empresa monitorava as idas ao banheiro dos seus funcionários, contabilizando esse tempo como “não trabalhado “e, portanto, sem remuneração.
A medida gerou preocupação no ORCT, que argumentou que a prática poderia provocar desidratação aos funcionários e provocar problemas nos rins ao se conterem em utilizar o sanitário para as necessidades básicas.
Diante desse iminente quadro, em fevereiro de 2022, o órgão proibiu a Jean Singer dessa prática, afirmando que o tempo para as necessidades fisiológicas não deveria ser tratado como uma pausa convencional.
No entanto, a Jean Singer recorreu da decisão da ORCT e, surpreendentemente, o Tribunal acatou o recurso da empresa, sob alegação de que a legislação suíça não especifica que ir ao banheiro seja um direito trabalhista remunerado.
A decisão do Tribunal trouxe à tona uma questão polêmica: a discriminação de gênero, com o tribunal reconhecendo que as mulheres serão prejudicadas com a prática de registro de ponto ao sair do ambiente de trabalho, especialmente por questões fisiológicas, como o ciclo menstrual, que exige maior e mais prolongadas frequências das mulheres ao banheiro.
O tribunal sugeriu à empresa rever suas práticas e buscar soluções para reduzir essa desigualdade.
A legislação trabalhista suíça exige que as empresas garantam pausas durante a jornada de trabalho e, de acordo com o artigo 15, o tempo de descanso varia conforme a duração do expediente.
* 15 minutos para um dia superior a 5 horas e meia,
* 30 minutos para um dia superior a 7 horas,
* 1 hora para um dia superior a 9 horas.
As pausas devem ser remuneradas desde que o funcionário permaneça no local de trabalho, mas não há menção incisiva às necessidades fisiológicas, o que permitiu a argumentação da Jean Singer que o uso do banheiro deveria ser contabilizado como parte dessas pausas.
Florence Nater, conselheira estadual responsável pela área trabalhista, manifestou preocupação com o impacto dessa medida, temendo que outras empresas adotem prática semelhante, levando à erosão dos direitos trabalhistas.
Apesar da polêmica, empresários suíços minimizam o impacto de decisão, como é o caso de Bárbara Zimmermann-Gester, da associação patronal, que argumentou que essa política não representa um padrão para as empresas no seu país.
Bárbara destacou que, em meio à crescente falta de mão-de-obra qualificada, é essencial que as empresas ofereçam condições de trabalho atrativas para reter seus funcionários.
* Fonte: CPG