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Famílias voltam a cobrar presídio em Itabira; governo afirma que cederá terreno para construção da unidade 

Valéria Barbosa

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

Familiares de presos itabiranos, que desde 2021 estão espalhados por presídios de pelo menos 15 cidades mineiras, foram até à Câmara Municipal na tarde desta segunda-feira (17), manifestar indignação pela ausência de uma unidade prisional em Itabira. O antigo presídio da cidade foi desativado em 2020, devido aos riscos da mancha de inundação da barragem de rejeito de minério de Itabiruçu (pertencente à mineradora Vale). Desde então, o município não dispõe de uma unidade prisional, o que tem deixado as famílias desamparadas e tendo que se deslocar centenas de quilômetros para visitarem seus parentes e gastando centenas de reais para enviar artigos e itens aos apenados, enquanto enfrentam dificuldades financeiras. 

Vestindo camisetas estampadas com a frase “Ser família não é crime”, os representantes estão novamente solicitando apoio do governo municipal para custear parte dos gastos com transporte (e eventuais hospedagens) durante as viagens de visitas aos presos, além da construção de uma nova penitenciária no município. “Hoje somos nós, amanhã pode ser um de vocês que podem  passar pelo que nós estamos passando. A gente também é tratado como criminoso e nós não incentivamos nossos filhos e nossos familiares a entrar no crime”, iniciou Valéria Barbosa, uma das lideranças dos familiares dos apenados. 

“Contamos com a sensibilidade e o compromisso dos senhores para que essa demanda seja atendida o quanto antes. É importante lembrar que família é família. Família de preso não é lixo, não é bandido”, pontuava um trecho do ofício lido no plenário aos vereadores presentes.

“Nós queremos o nosso direito, não estamos pedindo esmola, nós trabalhamos. A gente paga as nossas contas, pagamos nossos impostos. Nós temos direitos e sabemos que temos deveres também. Hoje aqui, falo por essas mães que aqui estão e por inúmeras outras que não puderam vir e que têm filhos dentro de um presídio. Nós estamos aqui representando a sociedade. Todo dia um vai preso, quero ver se você tiver um filho lá dentro: O que você vai fazer por ele?”, questionou outra mulher que possui familiar detido em penitenciária fora de Itabira.  

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

Como encaminhamento, os vereadores – através do parlamentar Bernardo Rosa (PSB) se comprometeram a formar uma comissão para discutir o tema,  mensurar o número de presos residentes do município de Itabira que estão detidos, além de fazer um planejamento sobre o que o município pode arcar, bem como estabelecer um diálogo entre a Vale e Governo de Minas Gerais. 

Município dará terreno para Estado para construir novo presídio

Na última semana, o prefeito Marco Antônio Lage (PSB) esteve presente na cerimônia de posse da nova diretoria da 52ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB Itabira), onde reconheceu a necessidade do município, afirmando que é favorável à construção, desde que o presídio seja de pequeno/médio porte. Para isso, conversas entre a gestão municipal e Governo de Minas estão acontecendo, com a Prefeitura oferecendo terrenos para a implantação da nova penitenciária. 

“Sempre defendemos, não um presídio grande, para trazer dois mil ou mais presos para a cidade, mas um presídio dos moldes que tínhamos. Hoje o Governo do Estado credencia presídios de no mínimo 306 presos, que eu acho que é a configuração ideal para Itabira. A gente já tem um terreno para destinação e esperamos que inclusive com a assinatura deste termo, que a gente possa ser contemplado com esse presídio de pequeno ou médio porte, para que possa assegurar que as famílias de Itabira fiquem próximas dos seus familiares que estão cumprindo pena”, finalizou.

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

O termo citado por Marco Antônio Lage é o “Termo de Autocomposição para a expansão da capacidade do Sistema Penitenciário de Minas”, assinado em 5 de fevereiro elo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCEMG) e o Governo do Estado. O documento prevê a criação de 22.032 novas vagas, viabilizadas tanto pela inauguração de novas unidades administrativas quanto pela edificação de novos prédios em estabelecimentos já existentes.

Ausência de presídio pune as famílias e prejudica a ressocialização dos apenados

O inciso XLV do artigo 5º, promulgado pela Constituição Federal de 1988, garante que somente a pessoa sentenciada poderá responder pelo crime que praticou, definindo que: “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”. No entanto, na avaliação das famílias dos itabiranos privados de liberdade, o “princípio da pessoalidade da pena” não vem sendo cumprido. “Hoje isso vem acontecendo, porque essa pessoa se sente distante, se sente desamparada e a família acaba tendo um gasto muito maior para conseguir de fato reeducar e ajudar na ressocialização dessa pessoa que está presa”, atesta João Paulo de Souza Júnior, presidente do Conselho da Comunidade na Execução Penal de Itabira.

Para a presidente da OAB Itabira, a ausência de um presídio na cidade também colabora para aumentar a dificuldade da ressocialização dos apenados. “Quando a gente fala de ressocialização, é importante ter essa unidade prisional perto, porque é só assim que a gente consegue realmente auxiliar os próprios responsáveis na condução daquela unidade prisional. Estando longe, nós não conseguimos, pelo menos a OAB não consegue atuar. O juiz da Execução Penal também não consegue oferecer esse recurso e por vezes temos recebido notícia de que os apenados de Itabira têm sido agredidos e nem sempre respeitados, digamos, nos outros presídios pelo Estado afora, afirmou Patrícia em entrevista à DeFato, após ter sido empossada para seu segundo mandato como presidente da OAB Itabira.

“Falar em ressocialização sem realmente acompanhar o trabalho dentro das unidades prisionais fica difícil. De fato, nós não temos nenhuma novidade concreta, mas pelo menos já temos uma postura de que, realmente, alguma coisa vai sair do papel e do discurso. Nós vamos cobrar para que isso aconteça”, finalizou Patrícia Freitas.

Expansão do sistema penitenciário de Minas Gerais

Atualmente, o sistema prisional do Estado abriga um total de 63.257 pessoas privadas de liberdade. As novas vagas serão distribuídas em 25 unidades prisionais de 864 vagas cada e uma unidade prisional de 432 vagas. O termo prevê a construção de três complexos prisionais somente na Região Metropolitana de Belo Horizonte, bem como a reforma integral do Complexo Penitenciário Nelson Hungria, em Contagem. Além disso, serão construídas mais de 20 unidades prisionais em diferentes regiões integradas de segurança pública (RISPs) 

Também está prevista a desativação de 69 unidades que se encontram interditadas por determinação judicial, com a devida transferência e realocação das pessoas privadas de liberdade, policiais penais e servidores técnicos para outras unidades. O termo também prevê a instalação de dez Unidades de Prevenção à Criminalidade (UPCs) nos municípios de Itabira, Araxá, Barbacena, Conselheiro Lafaiete, Nova Lima, Nova Serrana. Passos, Patos de Minas, Sabará e Teófilo Otoni. 

As UPCs buscam prevenir e reduzir a criminalidade através de programas sociais como o “Fica Vivo!“ e o “Mediação de Conflitos”, oferecendo atividades e serviços que buscam diminuir os índices de homicídios em áreas que registram maior número da prática, além de promover meios pacíficos para administração de conflitos em níveis interpessoais, comunitários e institucionais – visando minimizar, prevenir e/ou evitar que se desdobram em situações de violências e criminalidade.

Relembre

No primeiro semestre de 2021, o prefeito Marco Antônio Lage (PSB) optou pela não construção de um presídio de grande porte em Itabira — o empreendimento, negociado pelo governo de Minas Gerais, seria uma contrapartida pela desativação da unidade prisional local, em 2020, devido aos riscos da mancha de inundação da barragem de rejeito de minério de Itabiruçu. A obra seria custeada integralmente pela Vale.

Em março de 2021, um ofício foi encaminhado pela Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) à Prefeitura de Itabira — com cópias para Cibele Mourão Barroso Figueiredo Oliveira, então juíza em Itabira, e Giuliana Talamoni Fonoff, promotora de Justiça — comunicando o fim das tratativas para a construção de um novo presídio e a transferência dessa obra para outra cidade, que acabou sendo Matipó. O documento foi emitido após o Executivo itabirano não se posicionar oficialmente sobre o interesse em erguer uma nova unidade prisional ou não.

Diversas entidades ligadas à segurança pública no município já se manifestaram a favor da unidade prisional — a exemplo do Conselho da Comunidade na Execução Penal, da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), dentre outras. Mesmo assim, no início de março de 2023, o prefeito Marco Antônio Lage, durante inauguração de uma praça de esportes no bairro Praia, afirmou que não pretendia “construir presídio” na cidade — e destacou que tem como planejamento o investimento em áreas como Educação, Esporte e Saúde. As declarações não foram bem recebidas pelas instituições ligadas à segurança pública.

Posteriormente, em nota divulgada à época, a Prefeitura de Itabira disse que Marco Antônio Lage não era contra à unidade prisional, mas entendia que não deve aplicar recursos do município no empreendimento, já que a construção ou reativação do presídio é uma responsabilidade do Governo de Minas Gerais, responsável pela segurança pública, e da Vale, cujas atividades levaram ao fechamento da antiga cadeia da cidade.

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