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Fizeram e fazem de Itabira uma “vaca tonta”

O domingo terá pancadas de preguiça e sono... quanto ao clima? É só conferir a nossa previsão do tempo!

Foto: Arquivo/DeFato

“Vaca leiteira geralmente cai por desequilíbrio agudo dos íons de cálcio diluídos no sangue. Fica tonta, confusa e cambaleante, até despencar-se. Quando chega a sofrer queda, não levanta mais” — palavras de um estudante de Agropecuária do Rio Grande do Sul, Nelson Jesus Essvein Grohs. Anotei a frase por curiosidade, pensando não em termos como gado, pasto, roça, bovino, matadouro, açougue. Mas em Itabira.

Questionaria algum leitor, ou leitora, que Itabira não é uma vaca, quanto menos levou tombo físico em lugar algum. Responderia a ele, ou a ela, que o caso da vaca vamos discutir, mas o do baque temos prova.

Tutu Caramujo

Em Itabira, toda narrativa histórica e literária começa com Carlos Drummond de Andrade (1902-1987). E foi Drummond quem buscou, lá pelo século anterior a ele, o XIX, a ideia de imortalizar um personagem itabirano, Antônio Alves de Araújo. Enfiou-o na última linha do poema “Itabira” (Alguma Poesia, 1930) para ter seu nome eternizado. Refiro-me a Tutu Caramujo, prefeito e presidente da Câmara Municipal (1860-1972).

Afirmativa: além de imortal, Tutu Caramujo viu Itabira do Mato Dentro como uma vaca tombada. Ele teria deixado para lá a discussão sobre a “derrota incomparável”, se era ou não um irracional a terra que amava. Mas alertou para o grande problema do futuro, um bolsão de pobreza que viria em decorrência da exploração mineral sem critérios estabelecidos.

CSN: derrota incomparável

No advento da Vale, quando a mineração estava sendo executada pela Itabira Iron Ore Company, sob as ordens do norte-americano Percival Farquhar, tudo se fez por políticos e empresários brasileiros para que se implantasse uma usina siderúrgica em Itabira, conforme compromisso do governo dos EUA.

Reparem a manobra espúria que experimentou a “Vaca Itabira”: enquanto Israel Pinheiro quis transformar o Vale do Rio Doce no Ruhr brasileiro, trazendo para Governador Valadares a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e políticos itabiranos puxavam para Itabira, o interventor no Rio de Janeiro Amaral Peixoto, genro de Getúlio Vargas, bateu o pé e levou o empreendimento para o Estado do Rio de Janeiro.

E assim funcionou a politicagem naquele tempo: duas pessoas conversando e a CSN virou a bomba de Volta Redonda (RJ). A Vaca Itabira despencou-se mais uma vez da pirambeira. O pior, ofendendo a honra itabirana, alguns puxas-sacos e traidores ainda forçaram o que acabou ocorrendo: deram o nome de Presidente Vargas à nossa humilhada terra. Isto no período de criação da CVRD. Só em 1947 foi possível consertar a indesejável tramoia e voltarmos ao nosso nome original.

O estatuto da Vale nada vale

Em dezembro de 1954, um notável itabirano, advogado, José Hindenburgo Gonçalves, liderou um movimento chamado “Campanha de Itabira”. Com a participação de importantes filhos da terra — Carlos Drummond de Andrade, João Camilo de Oliveira Torres, prefeito Daniel Jardim de Grisolia, vereadores e a sociedade civil organizada —, lutavam pela instalação da sede da antiga CVRD no berço originário.

Embasados no artigo 2º do estatuto da mineradora — a sede da empresa deveria ser instalada no município de origem —, o movimento durou até maio de 1957. Na Campanha de Itabira faziam parte das reivindicações os itens: aplicação do Fundo de Reserva, instalação da usina siderúrgica e cobrança de impostos. Mais uma vez ocorre na história itabirana uma desabada da vaca tonta. Eita Itabira sempre pisoteada!

As minas se fecharão

O atual secretário de Meio Ambiente da Prefeitura de Itabira, Denes Martins da Costa Lott, graduado em Direito, mestre em Sustentabilidade Socioeconônica (UFOP 2001), escreveu em seu livro (Fechamento de Mina), publicado pela Editora Del Rey, em 2014, quando ele atuava na Vale, o seguinte: “… o volume de recursos que a Vale internou em Itabira, desde 1942, considerando-se uma taxa de remuneração de 6% ao ano, pode ser calculada, a valor presente, em torno de US$ 6,50 bilhões”.

Há um cálculo errado do eminente mestre, visto que a história mostra que Itabira não recebeu imposto algum da empresa, em taxas ou qualquer benesse, de 1942 a 1967, quando foi criado o Imposto Único sobre Minerais (IUM). Ainda existem outros equívocos, infelizmente, se considerarmos o que pesquisou Denes e outros mestres e doutores. Vamos economizar, por enquanto. Se Denes não atuar pró-Itabira vai ser complicado, pois a sua tese de mestrado nos dá uma facada no peito. Para a frente, moço inteligente e capaz! As minas se fecharão já. E nós?

As mentiras deslavadas

Segundo as evidências, Marco Antônio Lage chegou a Itabira para sua campanha eleitoral com um plano totalmente diferente do que expôs. Desconhecido no geral, foi levado ao pódio pela classe média e pela elite. O pessoal da geral como sempre vota por influência. Ele soube se comportar. Afinal de contas, é muito inteligente. Foi para a rua e prometeu mundos e fundos. Nada executou de suas promessas ainda. O discurso de posse dele dá um livro de mentiras deslavadas, ritos numerados e comprometedores. Já tentei mostrar, mas parece uma enciclopédia do super-herói Pinóquio. Minha agenda contém essas proezas.

Uma vaca bom-jesuense

Para encerrar, provisoriamente, estas informações, recorro, a dezenas de bovinas, simbolizadas aqui por uma Vaca de Bom Jesus do Amparo, que estava atolando-se no brejo dia destes. Foi dado um jeito nela. Serviu para despontarem-se as vacas da região. Em sua posse como prefeito de Itabira, em janeiro, Marco prometeu (um verbo constante em sua fala) socorrer todos os municípios da região, criar uma entidade como um fundo de melhoramento, a exemplo do que existia antes da privatização da Vale. Acho que se esqueceu. Vamos, o tempo é curto e ele ficou até agora só ciscando o chão, pouco entendeu sobre o que tem para fazer até por Itabira.

São muitas as pernadas que Itabira vem levando na vida. Suas tetas estão ainda recheadas do leite que pinga e respinga, chutam o balde e nem se importam. Imagino o seguinte quadro que vi recentemente: uma vaca estava indo para o brejo num terreno perto de Bom Jesus do Amparo. Não era a Vaca Itabira, mas tinha as peitarias recheadas de leite até com muita gordura, nata grossa e amiga do colesterol. Uma bezerra foi lá ver. Meteu a boca. Puxou e a baba escorreu. Avisei ao dono. Ele veio correndo e conseguiu, com um trator, puxar a danada.

Em Itabira precisamos de tratores, muitos, para puxar a vaca da prefeitura. Lá o dinheiro parece leite-ouro, que transborda e jorra sem dó nem piedade. Agora, piorou: buscam empresas de fora, com especialistas de fora, malvistos e chatas. Como a vaca de Bom Jesus, a de Itabira está no rumo do atoleiro. Todos sabem que vai sucumbir e desta vez não valem mais alertas de pés-rapados e lambedores de rapadura como eu. Já avisei demais. O planejamento do prefeito é levar o município para o rumo de seus sonhos. Esses para nós serão pesadelos dos mais arrepiantes.

Nota ao pé da página

Aviso à administração Marco Lage: atente-se para a mudança climática que vem aí, misturada com seca (em quase mais três anos, o governo municipal pouco fez para adiantar a captação do Rio Tanque).Quando tudo passar, a Vaca Itabira já atolou no pântano da incapacidade, ineficiência, pequenez e completa letargia de nunca seguir o caminho certo. A Vaca levará mais uma queda, está completamente tonta, corre o risco de entrar para o cemitério superfaturado vertical. Que tristeza!

José Sana é jornalista, historiador, professor de Letras e ex-vereador em Itabira por dois mandatos, onde reside desde 1966

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