Na noite desta quinta-feira (25), o torcedor flamenguista pôde dormir feliz e aliviado com o título brasileiro do seu time. A derrota para o São Paulo por 2 a 1 não foi capaz de evitar a conquista, já que o Internacional, vice-colocado, não fez sua parte e empatou em 0 a 0 com o Corinthians.
Após o jogo, a felicidade dos jogadores era visível, já que se trata de um campeão que só foi assumir a liderança na penúltima rodada do Brasileirão. Entre os torcedores, reinava a sensação maravilhosa em perceber que o clube de coração está cada vez mais dominante no território brasileiro.
Mas uma pessoa, em específico, não parecia aproveitar tão plenamente a festa. Hugo Souza, jovem goleiro flamenguista, se mostrava mais aliviado do que propriamente feliz. As duas falhas cometidas durante o jogo foram cruciais na derrota, embora não tenham sido escandalosas.
No primeiro gol são-paulino, torcedores contestaram o posicionamento da barreira formada por Hugo. No segundo tento, um erro mais notório: uma saída de bola ruim que resultou no gol de Pablo.
Na entrevista pós-jogo, o arqueiro tratou de pedir desculpas imediatamente. Suas palavras eram de alguém com plena noção de que, caso o título brasileiro trocasse de mãos, sofreria muito nos dias seguintes. Meses, talvez.
Em sua conta oficial do twitter, dos três tweets que “celebravam” a conquista de ontem, dois demonstravam, novamente, uma sensação de remorso de Hugo. Apenas um deles lembrava de algo importante: com 22 anos, ele acabara de se tornar o goleiro mais jovem a levantar a taça do Brasileirão pelo Flamengo.
Se por um lado, a insistente lembrança das falhas demonstra uma maturidade da jovem revelação flamenguista, por outro fica o questionamento: este é um sinal da intolerância e do ódio que tomaram conta do futebol? Entre os torcedores, principalmente, isso tem se tornado cada vez mais comum.
Granit Xhaka, meio campista suíço que atua pelo Arsenal, concedeu uma entrevista há poucos dias na qual comentava sobre isso. As reações às falhas ou resultados negativos estão cada vez mais extremas. Em alguns momentos, elas passam a envolver até as famílias dos boleiros.
A proximidade atual entre atletas, torcedores e imprensa, propiciada, principalmente, pelas redes sociais, está deixando o ambiente do futebol cada vez mais pesado. Tratamos os jogadores como robôs, numa relação análoga à “patrão x funcionário”.
Em que momento nos esquecemos que aqueles 11 caras correndo atrás de uma bola são nossos representantes em campo? Esta mudança na visão dos torcedores sobre os jogadores fica clara até em algumas respostas aos tweets de Hugo.
Alguns comentários como “Infelizmente vc vacila demais, cria” ou “Some do Flamengo. Não aguento mais ver tuas cagadas” demonstram que alguns flamenguistas não o perdoaram nem com a conquista do título.
Em tempos normais, não poderíamos permitir a Hugo Souza celebrar a grande conquista e, algum tempo depois, se concentrar em refletir sobre seus próprios erros? Talvez sim.
Mas “normal” é um termo cada vez mais démodé no Brasil do século XXI. Mesmo no futebol, uma espécie de desafogo em meio à loucura do nosso país, as coisas estão cada vez mais pesadas. Pesadas a ponto de um goleiro, que acabou de ganhar seu primeiro título brasileiro da carreira, virar a noite pedindo desculpas. Nós que lhe pedimos, Hugo.
Victor Eduardo é jornalista e escreve sobre esportes em DeFato Online.
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