Anote esse nome: Javier Milei. “Esse cara” é prenúncio de fortes emoções na linha do horizonte do Cone Sul.
O filósofo, jornalista e sociólogo Karl Marx — um dos idealizadores do Socialismo Científico — fez avaliação precisa sobre os acontecimentos da humanidade: “a história sempre se repete, como tragédia ou como uma farsa”. A história recente do Brasil poderá se repetir na Argentina. Como tragédia ou farsa? Apenas o tempo — o senhor da razão — responderá.
Adiante. O processo eleitoral argentino é interessante. O primeiro ato tem nome prolixo e pomposo: Primárias, Abertas, Simultâneas e Obrigatórias (Paso). Essa extensa nomenclatura é cognome de peneira. Uma rigorosa clivagem indicou os protagonistas das próximas eleições gerais do país vizinho. O primeiro turno acontecerá em 22 de outubro. A votação decisiva será no dia 19 de novembro. Apenas os candidatos com aceitação mínima de 1,5% na consulta popular (Paso) participarão do processo.
Essa sondagem de opinião é uma espécie de vestibular para os pretendentes aos cargos de presidente da República, deputado, senador, deputado do Parlasul (Parlamento do Mercosul) e chefe de governo da Cidade Autônoma de Buenos Aires. Então, as primárias cucarachas funcionam como uma espécie de bola de cristal. Elas são forte indício do resultado eleitoral do final do ano. A margem de erro é mínima. As prévias abertas foram realizadas em 13 de agosto. O resultado revelou um quê fora do comum.
A princípio, um trio disputará a Casa Rosada (sede do governo argentino). Os resultados das urnas indicaram um cenário acirrado. O deputado, economista e professor Javier Milei ficou com 30,04% dos votos. Sergio Massa — atual ministro da Economia — conquistou 21,22 % do eleitorado. Já a ex-ministra da Segurança — Patricia Bulrrich — alcançou a terceira posição com 17,01%.
E aqui a história ameaça pedir bis. Uma visita ao processo eleitoral brasileiro de 2018 justifica essa sensação. Naquela ocasião, parcela considerável da população brasileira demonstrava muita insatisfação com o Partido dos Trabalhadores (PT). A Operação Lava jato — que ainda não era um projeto de poder da República de Curitiba — desmontou o maior esquema de corrupção de Pindorama, em todos os tempos. Os “companheiros” do PT operaram a Petrobras. Noves fora o “engenho de fogo morto” deixado pela matriz econômica do governo Dilma Rousseff.
Os desatinos petistas apresentaram a previsível fatura nas eleições de 2018. A consequência foi óbvia. Um inexpressivo parlamentar do baixíssimo clero foi o porta-voz do descontentamento com a esquerda tapuia. Jair Messias Bolsonaro embalou o sonho conservador de uma direita órfã de moral e bons costumes. A retórica oportunista do ex- oficial do Exército foi demolidora. A prisão de Lula facilitou bastante a missão do “mito”. E deu no que deu. O morador do condomínio Vivendas da Barra virou improvável inquilino do Palácio da Alvorada. Os próximos capítulos dessa lengalenga ficarão registrados nos livros de história.
E aqui, agora, a sutil observação da terra do samba para a pátria do tango: “eu sou você amanhã”. Los hermanos andam desencantados com a “canhota” de lá. A dupla progressista Alberto Fernández/Cristina Kirchnner aprontou demais. A economia encontra-se em pandarecos. Grande parte da população (39,2%) está vivendo na linha da pobreza. A classe trabalhadora sofre com a dura realidade de uma implacável hiperinflação.
Esse panorama perverso é combustível para o agressivo discurso de Javier Milei — uma exótica figura típica de republiquetas de bananas. O sujeito era uma celebridade de programas sensacionalistas das emissoras de televisão de Buenos Aires. Daí para a política partidária foi simples pulo. Hoje é deputado. As propostas bizarras do personagem hipnotizaram uma multidão de platinos. O candidato da extrema direita promete fechar o Banco Central, acabar com 70% dos ministérios, romper com o Mercosul, legalizar a venda de órgãos humano, encerrar a parceria comercial com a China e dolarizar a economia local.
Javier é admirador incondicional de Jair Bolsonaro e Donald Trump. Em compensação, não economiza impropérios para “homenagear” o presidente Lula: “presidiário comunista”.
Anote esse nome: Javier Milei. “Esse cara” é prenúncio de fortes emoções na linha do horizonte do Cone Sul.
PS1: Javier Milei tem imenso prazer em parecer exótico. Adora representar o papel de maluco beleza. Recentemente, o portenho revelou porque candidatou-se a presidente da Argentina: “eu atendi a um pedido de Deus e de meus cachorros”. Ele é apaixonado por animais. É tutor de quatro cães, todos com nome de renomados economistas: Murray, Milton, Robert e Lucas. Um fator muito positivo, pelo menos.
PS2: o atual presidente da Argentina — Alberto Fernández — abriu mão de tentar a reeleição. O candidato governista será o ministro da economia em pandarecos, Sergio Massa. É muita colher de chá para Javier Milei.
Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.
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