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Maquiavel italiano ou Maquiavel paraguaio?

Maquiavel italiano ou Maquiavel paraguaio?

Foto: Reprodução / Internet

É preciso desmistificar Nicolau Maquiavel. Mas quem sou eu para isso. Não detenho o monopólio da verdade. Pelo contrário. E até pior. Desconheço a minha própria verdade. Mas tudo bem. Não custa mergulhar nas teses do controvertido italiano.

O descompromisso com a veracidade começa com uma suposta premissa maquiavélica: “os fins justificam os meios”. Nicolau jamais fez essa afirmação. É descarada “fake News”, desde sempre. A citação é tão verídica quanto o suposto “o Brasil não é um país sério”, uma fantasia atribuída a Charles de Gaulle. A frase do estadista europeu seria referência a um extravagante paraíso periférico de bananas. O ex-presidente francês- herói da Segunda Guerra Mundial- jamais cometeria tamanha deselegância com uma nação estrangeira. Mas o tempo passa. Não espere um comportamento elegante, por exemplo, de Emmanuel Macron. O atual morador do Palácio do Eliseu e o presidente Jair Bolsonaro já trocaram insultos na zona das relações internacionais. Foi um bate-boca típico de frequentadores de outra natureza de zona. Quase colocaram as respectivas mães no meio. Mas segue o jogo.

Nunca, em tempo algum, em lugar nenhum, o filósofo italiano relativizou o “vale tudo” para alcançar determinados objetivos. O conterrâneo de Dante Alighieri (a minha vontade- em alguns momentos- é mandar tudo para o mais periférico dos infernos) tinha outras ideias na cabeça. Para começo- ou continuidade de conversa- não é bom tom o uso da palavra “maquiavélico”, uma conotação pejorativa, que virou sinônimo de péssimas intenções. Melhor empregar maquiavelismo ou maquiaveliano.

É interessante analisar atentamente o livro “O Príncipe”, uma obra- prima do pensamento universal. E vamos ao ponto. Essa publicação (O Príncipe) – ao contrário do que parece- não é um manual de sacanagens da politicalha. Nada disso. Em suas páginas, Maquiavel ensina as artimanhas do dia a dia dos labirintos palacianos. As lições são duras, diretas e objetivas, sem compromisso com a hipocrisia. Em suma, é um relato da política como ela é. Os conselhos do polêmico “compêndio” foram dedicados aos governantes de Florença, a terra natal do escritor. Nada é de graça e nem por acaso. É claro. Na verdade, o filósofo estava à cata de uma boquinha na corte da família Médici. Então, ele esbaldou e revelou a real faceta da arte de se fazer a política, de uma forma fria e pragmática.

“O Príncipe”, na verdade, é um roteiro para conquista e manutenção do poder. A imagem maquiavélica que o senso comum disseminou pelos tempos, portanto, nada tem de maquiaveliana. Niccoló dei Machiavelli mostrou os encantos e desencantos da política para a desatenta plateia. Até mesmo por isso, o italiano é considerado o pai da moderna Ciência Política. Leia com atenção e deguste calmamente “O Príncipe”. O primoroso tratado não engorda e nem tem contraindicação. Mas ignore esse papo de que os fins justificam os meios. O protegido dos Médici jamais disse ou escreveu isso. E ponto final.

Em tempo: os fins justificando os meios, na verdade, é uma lengalenga do poeta romano Públio Ovídio, em sua obra “Heroides”.

PS: E por falar naquilo que não foi falado, Jânio Quadros jamais falou que sua renúncia foi provocada por “forças terríveis e ocultas”. Terríveis sim, ocultas nunca.

Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato

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