O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) ajuizou Ação Civil Pública, nesta quinta-feira (3), que visa à defesa dos direitos humanos e fundamentais das comunidades localizadas na Zona de Autossalvamento (ZAS) da Barragem Córrego do Sítio II, de propriedade da Anglogold Ashanti Córrego do Sítio Mineração S.A., em Santa Bárbara.
A ACP requer adoção de medidas que mitiguem e/ou reparem os impactos e danos causados pela situação atual de reiterada violação de direitos humanos e fundamentais e do bem-estar das comunidades diante da ocorrência de eventos críticos decorrentes do exercício de atividade empresarial arriscada.
A ACP foi ajuizada por meio da Promotoria de Justiça de Santa Bárbara, com o apoio do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Apoio Comunitário, Inclusão e Mobilização Sociais (CAO-Cimos), e do Coordenadoria Regional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde da Macrorregião Sanitária Centro (CRDS-Centro). Assinam a petição os promotores de Justiça Lucas Bacelette Otto Quaresma, Shirley Machado de Oliveira e Vanessa Campolina Rebello Horta.
A ação judicial se baseia, entre outros elementos, em estudo efetuado pela Fiocruz em parceria com o MPMG, em que foram identificados diversos danos à saúde física e mental da população que mora na ZAS, sobretudo daquelas pessoas que habitam em áreas nas quais não seria possível se salvar em caso de rompimento. Entre os pedidos elencados, estão a condenação da empresa às seguintes obrigações, em tutela provisória de urgência:
Fornecimento de MORADIA DIGNA, SEGURA E ADEQUADA para as pessoas residentes nas áreas cujo autossalvamento for impossível, ou seja, em que estudos e simulados indiquem que o tempo de saída dos imóveis, para quaisquer de seus integrantes, seja superior ao tempo de chegada da lama em caso de rompimento. A realocação deverá ocorrer em local que esteja fora da zona de autossalvamento, à escolha das pessoas atingidas, em condições iguais ou superiores às atuais. Para o cálculo do tempo de saída dos imóveis deve se adotar fração adicional que represente uma margem de segurança em relação ao tempo de fuga identificado em simulado (tempo de pré-movimento).
Fornecimento de MORADIA DIGNA, SEGURA E ADEQUADA para as famílias residentes nas Zona de Autossalvamento (ZAS) que tiverem ao menos um integrante com dificuldade de locomoção ou que fizerem uso de medicação capaz de atrasar ou prejudicar a fuga em caso de desastre. A realocação deverá ocorrem em local que esteja fora da zona de autossalvamento, à escolha das pessoas atingidas, em condições iguais ou superiores às atuais. Para o cálculo do tempo de saída dos imóveis deve se adotar fração adicional que represente uma margem de segurança em relação ao tempo de fuga identificado em simulado (tempo de pré-movimento), levando-se em conta que o tempo de fuga é maior em caso real de desastre do que em situações de simulado.
Fornecimento de AUXÍLIO EMERGENCIAL a todas as famílias da ZAS, ou subsidiariamente, às famílias enquadradas nas situações descritas nos itens 1 e 2, independentemente de deixarem seus imóveis, em valor a ser definido por este Juízo, tendo em vista a situação de acidente e desastre, nos termos do art. 3º, VI da Política Nacional das Populações Atingidas por Barragens e art. 1º, I e V da Lei 12.608/12;
Custeio da elaboração de Análise de Situação de Saúde da população atingida, objetivando o monitoramento da situação de saúde, estudos e análises que identifiquem os problemas de saúde e o comportamento dos principais indicadores de saúde, contribuindo, para direcionar as medidas em saúde necessárias à reparação, e outros estudos e análises de saúde eventualmente necessários (incluindo a estratégia sugerida no item 7.2 da Nota Técnica elaborada pela Fiocruz: monitoramento e identificação das alterações de saúde e condições de vida das populações atingidas);
Custeio da elaboração do Plano de Preparação e Resposta do Setor Saúde Municipal de Santa Bárbara/ MG, para responder a desastres e emergências em saúde, conforme sugerido no item 7.3 da Nota Técnica elaborada pela Fiocruz.
Além desses, foram feitos os seguintes pedidos:
a) garantir tratamento protetivo às comunidades da Zona de Autossalvamento no mesmo nível daquele ofertado aos empregados das empresas mineradoras, em respeito à isonomia, sendo condenada a fornecer moradia digna, segura e adequada para todas as pessoas residentes na Zona de Autossalvamento, observado o direito ao reassentamento coletivo (art. 3º, II, PNPAB 4º, X da Lei Estadual nº 23.795/21);
b) fornecer auxílio emergencial nos termos do art. 3º, VI da Política Nacional das Populações Atingidas por Barragens e art. 1º, I e V da Lei 12.608/12;
c) elaborar e executar PLANO DE COMUNICAÇÃO COM AS COMUNIDADES, prevendo o fornecimento de informações adequadas, em linguagem acessível, sobre as atividades da empresa no território, inclusive, contendo cronograma de descaracterização da barragem;
d) custear entidade para prestar ASSESSORIA TÉCNICA INDEPENDENTE às pessoas atingidas, a ser escolhida por estas, como forma de garantir a adequada participação e informação das pessoas atingidas;
e) custear a elaboração de Análise de Situação de Saúde da população atingida, objetivando o monitoramento da situação de saúde, estudos e análises que identifiquem os problemas de saúde e o comportamento dos principais indicadores de saúde, contribuindo, para direcionar as medidas em saúde necessárias à reparação;
f) reparar integralmente OS DANOS E IMPACTOS SOCIOECONÔMICOS decorrentes das violações de direitos humanos e dos prejuízos ao bem-estar da comunidade, da situação atual de inviabilidade de manutenção da vida sob constante medo acometido às pessoas diante da ocorrência de eventos críticos e do exercício de sua atividade empresarial arriscada exercida pela Requerida, bem como daqueles decorrentes da elevação do nível de emergência ocorrida em 1º de junho de 2023 e do último acionamento de sirene, ocorrido em 11 de julho de 2023 (pela 5ª vez), com o fim de tutelar os direitos individuais homogêneos, coletivos e difusos de caráter econômico, social e cultural das pessoas atingidas na área afetada.
A Ação Civil Pública proposta traz ainda alguns relatos das pessoas atingidas colhidos durante a audiência pública realizada em 29 de agosto de 2024: “Se não tem nenhuma chance de sobrevivência para nós, o que estamos fazendo ali? Estamos jogados à sorte para morrer ali caso ela venha a romper? (…) para a gente, não tem nenhum socorro a não ser tirar a gente de lá. Nós estamos à sorte da morte. Eu digo, porque essas famílias não têm para onde correr. Aí até quando nós vamos ter que ficar lá aguardando um socorro que jamais vai chegar?”
“(…) são danos morais, são danos causados por várias situações, há vários tempos. Há várias situações e há vários tempos que a gente vem nesse enfrentamento, e por que, até hoje, a empresa não foi responsabilizada?”
“(…) a empresa não “tá” nem aí para a população! Ela só quer saber de chegar ali, tirar o ouro dela, fazer o dinheiro dela ali na região. Acabou? Ela pega e vai embora e deixa a população a Deus dará,”
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