O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) ocupou, na quarta-feira (13), a entrada da Vale, em Vitória, no Espírito Santo. A ação se deve ao descaso da mineradora nos últimos nove anos com as pessoas impactadas pelo crime da Samarco/Vale/BHP Billiton, considerado o maior desastre socioambiental na história do País.
Os manifestantes fecharam a entrada em frente ao viaduto Araceli Cabreira Crespo, às 7h da manhã de quarta-feira e, depois, se encaminharam à rotatória. Em acordo com a Polícia Militar do Espírito Santo (PMES), a entrada foi liberada, mas prometem um novo bloqueio caso a mineradoras não aceite conversar com o grupo.
As empresa responsáveis pelo desastre do rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, Minas Gerais, em 2015, até hoje não fizeram a reparação de milhares de pessoas atingidas.
Diante disso, o MAB tem uma pauta com nove reivindicações, como o retorno do Auxílio Financeiro Emergencial (AFE) para os que tiveram o corte do benefício pela Fundação Renova, bem como o pagamento retroativo àqueles que nunca receberam, mas se encaixam nos critérios.
Os manifestantes solicitam também a criação de um programa de renda para solucionar os problemas socioeconômicos dos atingidos, conforme a recém aprovada Política Nacional de Direitos dos Atingidos por Barragens (PNAB). Eles também reivindicam o pagamento de uma indenização justa, ainda pendente. Exigem, também, a garantia do fornecimento de água limpa, incluindo a criação da Tarifa Social da Água, e a efetivação imediata dos planos de ação em saúde, construídos desde 2019.
Outro ponto importante é o reconhecimento do litoral Norte e Sul do Espírito Santo como área atingida, dando início aos programas de reparação.
Outras questões apresentadas: a retomada dos pagamentos referentes aos lucros dos atingidos que cessaram por conta do crime ambiental; realização de cadastros atualizados dos atingidos; e o reconhecimento de mulheres e crianças atingidas, com acesso independente aos programas de reparação.
Heider Boza, um dos representantes do movimento afirma que o documento com as reivindicações foi endereçada ao presidente da empresa, Eduardo Bartolomeo, que teve seu mandato estendido até o final deste ano. A ocupação da entrada da Vale é parte da “Jornada Internacional de Lutas contra as Barragens, pelos Rios, pela Água e pela Vida-2024”.
Um dos pontos cruciais é a efetiva aplicação da PNAB, sancionada em dezembro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A política cria um marco legal para todos os atingidos do Brasil, com o objetivo de coibir o padrão vigente de violação de direitos humanos praticado por grandes empreendimentos no País controladores de barragens.
No Espírito Santo, a Política Estadual dos Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PEAB) está paralisada desde o ano passado.
Uma minuta no projeto de lei foi protocolada no Executivo, a partir de uma redação coletiva envolvendo o MAB, a Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES) e as deputadas Iryni Lopes (PT) e Camila Valadão (PSOL), mas não teve o parecer da Procuradoria-geral do Estado (PGE), o que deixa o Estado do Espírito Santo em débito com os atingidos capixabas pelo crime das mineradoras. Em Minas Gerais, a política já se tornou lei.
Em janeiro deste ano, a Justiça Federal condenou as empresas a pagarem R$ 47 bilhões pelos danos morais coletivos causados pelo crime ambiental. decisão cabe recurso e a maior parte dos atingidos não recebeu nenhum tipo de indenização.
Há, também, uma ação na Justiça Britânica, movida contra a Vale e a BHP Billiton por ao menos 700 mil atingidos, e o MAB considera fundamental esta ação em Londres para forçar um avanço em benefício dos atingidos por parte do Judiciário brasileiro e do processo de repactuação.
Helder Salomão, deputado federal (PT), relator da comissão externa da Câmara Federal que acompanha o processo de repactuação do acordo de compensação e reparação de danos requerem uma mudança de postura intransigente das mineradoras para ser concretizada. “O patamar da indenização deveria ser de no mínimo R$ 100 bilhões”, defende.
A sede da Procuradoria-geral do Estado (PGE), no último dia 8, foi palco de uma reunião com representantes dos qilombos de Linhares, São Mateus e Conceição da Barra, no Norte capixaba, que requerem reconhecimento de vítimas da barragem.
Eles relatam grave crise de segurança alimentar e hídrica decorrentes do não reconhecimento e pedem a adoção de medidas humanitárias urgentes.
“Espírito Santo não voltará para a mesa de negociação enquanto a Deliberação 58 do CIF [Comitê Interfederativo] não for atendida. Não é admissível que as empresas causadoras de tamanho dano fiquem insensíveis com a situação que abrange 32 comunidades remanescentes de quilombos”, afirmou na ocasião o procurador-geral do Estado, Jasson Hibner Amaral.