O Ministério Público ajuizou uma Ação Civil Pública (ACP), nesta terça-feira (3), pedindo a cassação da licença que autorizou alteamento de uma barragem de rejeitos da Anglo American, em Conceição do Mato Dentro, em uma cota 9 metros mais alta. A deliberação aconteceu em uma reunião cercada de polêmicas e manifestações, com mais de 12 horas de duração, a mais longa da história da Câmara de Atividades Minerárias (CMI), órgão responsável pela concessão do licenciamento.
À DeFato, a Anglo American garantiu a segurança da barragem e afirmou que “possui eficiente sistema de gestão de riscos, conforme atestado pelos órgãos reguladores e também através de auditoria independente”.
“Não é tempo de recuar”, diz a expressão grifada e negritada na a ajuizada pelo MP, que cobra, de forma enfática, a devida aplicabilidade da Lei “Mar de Lama Nunca Mais” em relação ao empreendimento Minas-Rio. Além da mineradora, a ação inclui o Estado de Minas Gerais, que, segundo o MP, “de forma ilegal, concedeu licença ambiental de operação referente à atividade de alteamento da barragem”.
Na ACP, que tramita na Justiça, o Ministério Público requer, liminarmente, que sejam suspensos os efeitos da licença concedida e que o Estado seja impedido de conceder qualquer outra licença à Anglo American, referente à barragem, até que seja corrigida a ilegalidade e emitido novo ato administrativo, observando-se o artigo 12 da Lei “Mar de Lama Nunca Mais” e garantindo-se o direito ao reassentamento coletivo das três comunidades a jusante da barragem: Água Quente, Passa Sete e São José do Jassém.
A norma a ser observada diz que “fica vedada a concessão de licença ambiental para construção, instalação, ampliação ou alteamento de barragem em cujos estudos de cenários de rupturas seja identificada comunidade na zona de autossalvamento”.
A ACP destaca que a norma da Lei “Mar de Lama Nunca Mais” entrou em vigor em 25 de fevereiro de 2019, fruto de um projeto de iniciativa popular que contou com mais de 60 mil assinaturas de cidadãos, tendo em vista a adoção de normas mais rígidas para o licenciamento ambiental e a fiscalização de barragens no estado.
“A votação da licença de operação, por sua vez, ocorreu no dia 20 de dezembro de 2019. Ou seja, a proibição do artigo 12 é, inclusive, anterior à emissão do ato administrativo”, destaca o MP.
Proteção das comunidades
O Ministério Público requer também, na ação, que seja concedida liminar reconhecendo o direito à remoção da comunidade de São José do Jassém, por meio de parâmetros coletivos de indenização e reassentamento, resguardados os modos comunitários de vida e de uso da terra (reassentamento coletivo) e, também, por meio do Plano de Negociação Opcional (de caráter individual).
Em relação às comunidades Água Quente e Passa Sete, também pede que seja reconhecido o direito à remoção das pessoas, por meio dos parâmetros coletivos de indenização e reassentamento, resguardados os modos comunitários de vida e de uso da terra (reassentamento coletivo).
Caso os pedidos sejam providos, a Anglo American deverá custear o reassentamento coletivo, garantindo a participação das comunidades atingidas, por meio de assessorias técnicas independentes, e com a preservação das relações sociais, afetivas, econômicas e comunitárias delas. Para isso, o MP pede à Justiça que determine à mineradora garantia bancária no valor mínimo de R$500 milhões.
Projeto Minas-Rio
O projeto Minas-Rio, de propriedade da Anglo American, consiste na instalação e operação de um complexo de exploração de minério de ferro nas Serras da Ferrugem e do Sapo, englobando a extração e o beneficiamento do minério na região dos municípios de Conceição do Mato Dentro, Alvorada de Minas e Dom Joaquim, além do transporte do produto mineral por meio de mineroduto de Conceição do Mato Dentro, em Minas, até o Porto de Açu, em São João da Barra, norte do estado do Rio de Janeiro.
Em sua fase III, consistente no Projeto de Extensão da Mina do Sapo, o empreendimento prevê a implantação do primeiro alteamento de barragem de rejeitos, entre outras medidas, como ampliação de capacidade e de frentes de cavas da mina.
O Ministério Público argumenta que ingressou com a ação na Justiça uma vez que “os órgãos ambientais do Estado não acataram a recomendação ministerial, que buscava evitar o ato ilegal da Administração, e concederam a licença de operação à mineradora”.
“Não é tempo de recuar, de consagrar leituras de exceção, capazes de fazer desabar o edifício de um direito elaborado e posto em vigor para defender o patrimônio ambiental de Minas Gerais, a vida e a dignidade humana”, defendem os promotores Rafael Benedetti Parisoto, Luís Gustavo Patuzzi Bortoncello, André Sperling Prado e Francisco Chaves Generoso, que assinam a ACP.
Confira na íntegra o posicionamento da Anglo American
A regularidade do processo de licenciamento operacional da barragem do Minas-Rio foi reconhecida pelos órgãos competentes. A Advocacia Geral do Estado de Minas Gerais entendeu que as disposições do artigo 12 da Lei 23.291/2019 não são aplicáveis a este caso e, posteriormente, o Conselho Estadual de Política Ambiental votou pela concessão da licença.
A Anglo American tem em curso um Programa de Realocação Voluntária criado antes da promulgação da Lei Estadual 23.291/2019, que já beneficiou dezenas de famílias no entorno do empreendimento. Desde sua criação, inclui famílias residentes a jusante da barragem. O programa existe desde 2017.
A barragem da Anglo American é uma barragem segura, construída pelo método de alteamento à jusante, com aterro de solo compactado, considerado o mais seguro, e possui eficiente sistema de gestão de riscos, conforme atestado pelos órgãos reguladores e também através de auditoria independente, realizada pelo IPT.