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“O cordão dos puxa-sacos cada vez aumenta mais”

Pra começar o dia: uma xícara de café e a previsão do tempo

Foto: Jackson Faustino/DeFato

Era 31 de janeiro de um ano qualquer. Estávamos  em Itabira, na antiga sede da Prefeitura, Praça do Centenário. Quatorze vereadores e eu, além de prefeito e vice, havíamos tomado posse para um novo mandato. Já é tarde da noite e estou transportando eleitores que vieram nos prestigiar. A minha condução era um jipe, cor prata, pau para toda obra. A cidade já caía nos braços de Morfeu, preparando-se para nova jornada.

Um cidadão apenas, e eu, segurávamos as pálpebras, evitando que os olhos fechassem-se.  E esses olhos iriam ficar mais um tempo pelo menos em alertas para um mandato profícuo. O cidadão em pé em um ponto de ônibus imaginário movia-se de um para outro lado calmamente. Mãos para trás, como um professor aplicando provas.

Ele tinha cumprido magistralmente um mandato de prefeito. Seu eleito preferido que ele praticamente elegeu e estava em outro endereço, curtindo com amigos o júbilo da posse. Esse do ponto imaginário de ônibus, só; o de sua casa distante, abrigando bajuladores até no teto, lustres a abajures, em  sua pomposa casa.

Parei o jipe. Nosso amigo apenas subiu no estribo e assentou-se no lugar da frente, tudo automaticamente, comunicávamos assim. Ainda morávamos na mesma rua. A carona em ação não se constituía como gentileza, portanto. Pouco conversamos na curta viagem, até porque, como disse, nosso entendimento era telepático. Já tínhamos gastado o repertório de fofocas de um tempão. Deixei-o na porta de sua casa e rodei mais um pouco para estacionar minha condução na garagem. E eu na cama.

Ninguém precisava convidar-me a uma reflexão sobre as cenas registradas mentalmente porque, como na melodia carnavalesca de Roberto Martins e Frazão, encaixava-se “O cordão dos puxa-sacos cada vez aumenta mais”. E é milimetricamente incontestável que as palavras se intercalam: “Quem está na frente é passado para trás”. Assim caminha a humanidade.

Segundo recente levantamento de entidades cientificamente políticas, o mundo tem muito mais puxa-sacos que indiferentes, ou resistentes, algo em torno de 91 a 9%. Em Itabira, especificamente, chegou-se à vergonhosa situação de inverter as posições. Ou seja, por infinito amor ao poder pelo pesadelo da maioria, e por falta da tal competência, alguém lança uma novidade assim sintetizada: “Se os puxa-sacos querem me ludibriar, eu lanço a ‘Operação Baba-Ovo’ para liquidar a fatura.

Para os não candidatos a nada (desculpem-me as duas negações), essas eleições vindouras terão momentos de diversão, mesmo sabendo que Itabira está na despedida da fartura. Já disse e repito: vamos ter que ensaiar um novo mundo de pobreza que nem nos tempos da brilhantina ou na pré-história do Cauê solene e hierático  existiu por essas bandas.

Itabira já se tornou uma cidade relaxada e não se preocupa nem com o dia de depois de amanhã, mesmo tendo esse virado filme de alerta à humanidade. Mais ainda a ex-Mato Dentro, especificamente, de tanta raiva vai pedir a volta do nome oficial para Presidente Vargas. Será o desespero que bate à porta.

Este carnaval que, graças a Deus, acabou, mas infelizmente não pegou no vira-vira, vejam que tragédia aconteceu: o povo revoltou-se ferrenhamente. E os restaurantes da sonhada cidade turística, essa que não passa de um suga-suga de dinheiro, estavam lacrados para Momo e para nós mesmos.

Agora, com certeza, haverá uma nova etapa de tiro do alvo ao cínico, que já virou claramente a bola da vez. Talvez a nossa gastança se amoleça e possa, finalmente, retornar àquela cena, do grande político abandonado porque, na verdade, ele representava a maioria itabirana, abandonada, achincalhada, mas disposta a reagir em pleno reinado dos baba-ovos.

José Sana é jornalista, historiador, professor de Letras e ex-vereador em Itabira por dois mandatos, onde reside desde 1966

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

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