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O Irã deixa de ser Caramelo e agrava a crise no Oriente Médio

O Irã deixa de ser Caramelo e agrava a crise no Oriente Médio

Foto: Reprodução

Caramelo é o nome do simpático cão brasileiro sem raça definida, o popular e tradicional vira-lata. A expressão é a cara do Brasil. Afinal, o viralatismo é comportamento típico dos habitantes dessas terras tupiniquins. Um aspecto é inegável. O bicho vadio usa o charme com muita eficiência para ganhos políticos. A conquista do voto é fruto de simples abanar de rabo ou marcante olhar hipnótico.

E mais. O animal é dono de uma saúde de ferro. A palavra “veterinário” não aparece no vocabulário desses peludos. Caramelo é pacato. Não é ansioso e tenso como o pinscher. Também não apresenta a agressividade típica do pitbull.  A sua extraordinária empatia tem consequência fundamental:  esse ser maravilhoso consegue conviver harmoniosamente   com o mais perigoso dos animais: o homem.

Caramelo não gosta de confusão. Mas, atenção. Não confiem integralmente nesse pacifismo. O inesperado consegue fazer algumas surpresas desagradáveis. Há um quê de dissimulação no teatro canino. O cachorro late e rosna aparentemente por nada. Nas condições normais de temperatura e pressão, resolve suas demandas com muito barulho e poucas atitudes. Eventualmente, porém, costuma perder a sua santa e aparente eterna paciência. Afinal, ninguém é de ferro. E saí de baixo quando isso acontece. O mundo literalmente desaba. A ira represada vem à tona na velocidade de um supersônico. Nesse caso, um improvável descontrole emocional toma conta do pedaço. E ponto.

Apeamos no lugar incomum. Aterrissamos no efervescente Oriente Médio com uma constatação: a geopolítica tem o seu vira-lata de estimação. Aqui se fala da pátria dos aiatolás. O Irã é uma nação paciente. Vocifera demais e age de menos. O governo israelita vive cutucando o rabo da fera asiática com vara curta. Os estranhos religiosos de turbantes negros apenas resmungam ameaçadoramente. “Os sionistas pagarão muito caro pela insolência. O sangue correrá pelas ruas de Tel Aviv e Jerusalém”. Tudo não passava de mera retórica. Esse sempre foi o discurso (ou piada pronta) de Ali Khamenei — o mandachuva de Teerã.

O bom senso, no entanto, recomenda: cuidado com as falsas aparências. Por trás da passividade, às vezes, esconde perturbadora psicose. A verborragia vai além da superficialidade. Anote aí. A “Pérsia” mantém um exército de 650 mil combatentes na ativa e 350 mil reservistas. É o segundo maior contingente da região. Perde apenas para o Egito. Os judeus contam com um efetivo bem inferior. A armada israelense, muito bem treinada, é formada por 177 mil militares. O irã provavelmente é detentor de alguma bomba atômica. Já Israel, com certeza, tem ogivas nucleares. Esse fator faz com que a balança oscile para o lado judeu.

O primeiro-ministro Benjamin (Bibi) Netanyahu joga todas as suas fichas na disseminação do conflito. E com razão. Essa é a única maneira para manter-se no poder e se livrar da cadeia. O ataque ao Hezbollah, no Líbano, foi uma jogada de alto risco. E pior. Bibi ousou ainda mais ao invadir o país vizinho por terra. A iniciativa foi clara provocação aos iranianos. Em seu discurso na ONU, o premier fez um alerta enviesado que pode ser interpretado assim: vocês, filhos de Alá, serão as próximas vítimas.

A agressão judia à soberania libanesa deixou o Irã numa encruzilhada crítica. Restaram apenas duas opções radicais às autoridades de um estado fundamentalista: humilha-se e se silencia ou reponde com consistente demonstração de força. E não deu outra. O Irã aumentou a extensão do fogo no inferno do Oriente Médio. Resumo da ópera bélica: a pátria dos aiatolás abriu mão da cômoda vida de vira-lata. E agora? Quem colocará o guizo no pescoço do Caramelo?

Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

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