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O parque imaginário do Itabiruçu que só existe na cabeça da Vale

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Entrada do extinto Parque do Itabiruçu, às margens da MG-129, em Itabira - Foto: Google

Passear por entre árvores, observar animais exóticos, levar a família para curtir a natureza e recarregar as energias em meio a quilômetros de área verde devidamente preservada. Um banquinho na sombra, crianças correndo livremente. Casais em encontros românticos. Acredite, itabirano, esse poderia ser um belo programa de fim de semana bem aqui, na nossa cidade, se a Vale tivesse cumprido um acordo firmado por ela há quase 30 anos.

Para entender essa história, precisamos voltar no tempo. Mais exatamente em 1985, quando um promotor, José Adilson Marques Bevilácqua, impetrou ações contra a Vale até então inéditas na história da mineração no Brasil. Era a primeira vez que um agente do Judiciário se voltava contra uma mineradora por reparações ambientais. Ele questionava a destruição da Serra do Esmeril, a concentração de poeira no ar respirado pelo itabirano e a recomposição de florestas nativas.

Os anos se passaram e, em 1992, outro promotor, Giovanni Mansur, fez reviver as cobranças com nova Ação Civil Pública Ambiental em desfavor da Vale. No processo, ele citou que a atividade mineradora pode até trazer benefícios para a comunidade, mas destacou que “o preço pago por tais benefícios foi e está sendo altíssimo para o meio ambiente local”.

Veja bem! Em 1992, Itabira avançava para seu 50º ano de exploração mineral por parte da Vale. Uma marca impressionante já para aquela época. Agora, a atividade está próxima de alcançar 80 anos no solo itabirano. A tecnologia avançou, novos métodos surgiram, mas a percepção de quem mora no município é de que a destruição ao meio ambiente continua tal qual era no início do anos 90.

Mas voltemos à área Jurídica. Cobrada, então, novamente em 1992, a Vale procura o Ministério Público e a Prefeitura de Itabira para um acordo. Afirma que os danos ambientais são inerentes à atividade da mineração e que investe milhões de dólares em conservação nos locais em que atua (sim, o argumento é antigo!). Foi feito naquela época um grande seminário, de onde saíram obrigações que a empresa teria que cumprir a título de compensação pelos danos ao meio ambiente itabirano. Uma dos pontos acordados: implantar e manter em Itabira uma reserva florestal denominada Parque Ecológico do Itabiruçu.

O acordo ainda descrevia que essa área deveria servir como “mostruário de flora regional”, “refúgio de fauna” e como “apoio aos programas conservacionistas da empresa, principalmente educação ambiental”. Quem é das mais antigas em Itabira sabe que esse projeto até funcionou por algum tempo e que o Parque do Itabiruçu foi uma grande opção de lazer para o itabirano. Ir ao local, ver os belos pavões, era um programa e tanto. Mas os anos passaram e a prioridade da Vale passou a ser outro equipamento chamado Itabiruçu: a gigantesca barragem com milhões de metros cúbicos de rejeitos que hoje assombra toda a comunidade.

Em meados do ano passado, o atual governo municipal encaminhou à Justiça um documento com uma série de questionamentos a respeito de um relatório, elaborado por perito contratado pela Vale, que conclui que a empresa cumpriu todo o acordo elaborado em 1993, incluindo o Parque do Itabiruçu. Talvez estejamos diante, então, do primeiro caso de parque imaginário de que se tem notícia. Um parque que só existe na cabeça da Vale e de seus dirigentes.

A Vale já se manifestou na imprensa sobre o Parque do Ecológico do Itabiruçu. Argumentou que mantém uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) na região da barragem (quem quer visitar?) e que as instalações do parque desativado foram levadas para uma área na Mina Conceição, onde mantinha programa de visitação ambiental. Mas, mesmo essa atividade, também já foi abandonada. Além disso, o acordo do início dos anos 90 é explícito no que se refere à necessidade de um parque para a comunidade.

Ao simplesmente destruir o Parque Ecológico do Itabiruçu e abandonar a idéia, ignorando um acordo judicial, a Vale exemplifica bem como é a sua relação com Itabira. Uma relação exploratória, baseada sempre no “venha a nós” e distante do “seja feita a vossa vontade” quando há algum pleito da comunidade local. Era assim em 1992. É assim em 2020.

Gustavo Milânio
Advogado
Chefe de Gabinete do presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE)

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