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O prefeito Marco Antônio Lage faz uma aposta de alto risco

Marco Antônio Lage

Foto: Reprodução/Internet

A jabuticaba é tipicamente brasileira. Só dá nessas bandas do planeta. O Brasil, então, é o país das jabuticabas. E aqui está um exemplo do saboroso fruto: o presidencialismo de coalizão, uma “obra-prima” tipicamente tupiniquim.

O modelo (governo de coalizão) é filho bastardo da multidão de partidos que assola a política brasileira. Essas agremiações proliferam em todos os níveis da nação. A esculhambação partidária começa na União (Brasília), passa pelas federações (estados) e desagua nos municípios. É uma festa. Há partidos para todos os gostos e fins. Esse ajuntamento (filosófico, fisiológico e ideológico) dificulta muito o relacionamento entre os poderes.  

Nesse cenário caótico, a administração pública faz complicados malabarismos retóricos. E tome blá- blá -blá pra convencimento de propósitos. O Executivo não tem como economizar saliva. Os projetos de interesse do governo (e da população) só conseguem aprovação do parlamento, depois de muita conversa. Essa dialogia fatalmente descamba para o tradicional toma- lá –dá- cá. O troca-troca nem sempre é ilegal, apenas eticamente questionável. 

Mas não tem jeito. O governante – que tenta escapulir dessa prática – enfrenta sérios problemas. Falhas na condução do processo de coalizão provocam o aparecimento de pedras no meio do caminho. Essa anomalia (fissuras na coalizão) causa inquietações na terra de Drummond, até com inesperada intensidade. 

A atual crise política de Itabira é precoce. O “governo Marco” conta apenas sete meses. Mas várias nuvens negras já despontam no céu. Uma forte tempestade institucional se insinua na linha do horizonte. Existe uma complicada encrenca em gestação. Aqui- bem em meio às montanhas de Minas Gerais- o prefeito Marco Antônio Lage decidiu interpretar a teoria do Barão de Montesquieu (a separação dos poderes) literalmente ao pé da letra.

É Prefeitura pra lá, Câmara pra cá. Em Mato Dentro, o pragmatismo tem atropelado a boa prosa. “Os vereadores necessitam atender obrigatoriamente as minhas demandas, pois eu sou o povo”, filosofaria o mandarim da pólis- em confabulação com o seu travesseiro de estimação, nas noites de insônia. É uma tática ousada e inovadora, convenhamos. Afinal, vivemos no paraíso das jabuticabas.    

A estratégia do Executivo itabirano apresenta um elevado grau de insegurança. O embate entre Prefeitura e Câmara teve dois rounds, até agora. O governo perdeu em ambos. No primeiro, os vereadores derrubaram a autorização para um empréstimo de R$ 70 milhões, junto à Caixa Econômica Federal. Um prejuízo relevante. Na semana passada, a bancada oposicionista “engessou” a administração pública.  

Em 2022, Lage ficará refém de uma margem de 10% para fazer remanejamentos no orçamento, sem autorização do Legislativo. É muito pouco. O gestor da cidade reivindicava uma flexibilidade de até 25%. Os edis cravaram um sonoro “não”. Esse revés provocará acentuado impacto na infraestrutura. 

A derrapagem teve uma repercussão negativa. Essa nova derrota fez acender a luz amarela no terceiro andar da Prefeitura. O cenário ficou complexo. O governo perdeu o controle da Câmara e esse panorama pode ter consequências imprevisíveis (ou bem previsíveis), um pouco mais à frente. Afinal, dez vereadores resolveram confrontar abertamente o mandatário- mor. Apenas sete – e alguns até sem muito entusiasmo – ainda topam matar no peito as bolas lançadas na área pelo prefeito. Esse quadro é prenúncio de arruaças, num  futuro nem tão distante. Claro, se persistir a beligerância entre os dois poderes. 

As cenas dos próximos capítulos prometem intensas emoções.  A alegoria do momento é essa: caso pudesse, Marco Lage botaria dez vereadores no olho da rua. Pelo menos, o socialista deixa transparecer isso em suas famosas lives semanais. Esse desejo surreal do prefeito é sonho de uma noite de verão, mas o sonho dos camaristas não é ilusão outonal. Por um motivo fatal: os vereadores podem defenestrar o prefeito, a qualquer momento. As ferramentas para isso são prerrogativas do Legislativo:  impeachment ou cassação de mandato. Note-se: ainda não existe o mais leve motivo para o acionamento desses dispositivos.  

Há apenas um jeito de colocar ponto final nessa confusão toda (ou tola): um dos poderes terá que entrar no modo “conciliação”. Mas – ao que tudo indica- o filho dileto de Ipoema sustentará a queda de braço. Ele até poderá sair vitorioso desse certame, mas a aposta é de alto risco. O último episódio do arranca-rabo institucional (a refrega da LDO) mostra que Mato Dentro atravessou a antessala da ingovernabilidade.

A maioria dos vereadores  “engessou” o prefeito. Um político, nessa situação, se locomove com  muita dificuldade. E, pior. Manquitola-se perigosamente em direção ao precipício. É muito real a possiblidade  de coalizão virar colisão. Fernando Collor de Mello e Dilma Rousseff conhecem muito bem o capítulo final desse folhetim. O “the end” costuma não ser bom para ninguém.

PS: A crise política itabirana tem solução? Claro que sim. Basta o governo municipal plantar uma jabuticabeira na Câmara de Vereadores. Mas, atenção: muita gente não gosta da fruta.

Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

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