A construção de três novos prédios do campus local da Unifei voltou a ser tema de debate na Câmara Municipal de Itabira. Devido ao feriado de Carnaval, a reunião ordinária, que tradicionalmente acontece às terças-feiras, foi transferida, nesta semana, para a quinta-feira (23). Durante o encontro, os parlamentares debateram, mais uma vez, as possíveis causas para os atrasos no empreendimento — que deveria ter sido concluído em 2022. Houve críticas à mineradora Vale, à Prefeitura de Itabira e questionamentos sobre a necessidade de reequilíbrio financeiro do empreendimento.
Novo capítulo
A discussão no Legislativo foi motivada por uma entrevista do secretário de Obras, Transporte e Trânsito, Danilo Alvarenga, publicada na quinta-feira pelo jornal Diário de Itabira. Na ocasião, ele afirmou que os atrasos na construção dos prédios 4, 5 e 6 da Unifei não são motivados pela demora na prestação de contas das etapas executadas do projeto. Segundo ele, essa situação acontece porque no convênio firmado entre Prefeitura e Vale não prevê recomposição financeira das planilhas de custo da empreitada. Esse processo se faz necessário devido ao aumento no preço dos materiais de construção, ocasionado pela pandemia de Covid-19 — porém, como não está estabelecido em contrato, a mineradora não aceita arcar com esse pagamento.
“O problema é que o convênio com a Vale não previa o pagamento de reequilíbrio financeiro. Então, os aumentos de preços que observamos nos preços em geral, incluindo os materiais de construção, não estavam contemplados, a Vale não paga. E isso é que está gerando o atraso, basicamente”, declarou Danilo Alvarenga na entrevista.
As informações repassadas pelo secretário de Obras ao Diário de Itabira mostram que relatórios, com datas de 26 de janeiro e 23 de fevereiro de 2022, produzidos por uma comissão da Vale para acompanhamento do empreendimento, indicaram inconformidades na prestação de contas apresentada pela Prefeitura — como itens executados e medidos em desacordo com o caderno de especificações das obras; itens medidos e que não foram feitos; e itens com medição antecipada.
“O parecer final da comissão de acompanhamento é pela aprovação da prestação de contas apresentada, e que desconsiderados os valores não aptos e não validados totaliza R$ 10.011.304,15”, diz trecho dos relatórios, que também declara que a Prefeitura de Itabira estaria apta a receber a segunda parcela da obra, avaliada em R$ 10 milhões.
Danilo Alvarenga esclarece, ainda, que as prestações de contas estão sendo realizadas pelo Executivo, assim como funcionários da mineradora realizam fiscalização constante do empreendimento — eles “acompanham diariamente e prestam contas diretamente à empresa [Vale]”, conta.
Dessa forma, o secretário de Obras defende que o problema para os atrasos na execução do projeto é o reequilíbrio financeiro, já que a alta nos insumos da construção civil elevou o custo da obra — gerando, até o momento, uma dívida aproximada de R$ 7 milhões da Prefeitura de Itabira com as empresas responsáveis pela construção dos prédios.
“Agora, nós estamos em negociação com a Vale para tentar ver essa questão do reequilíbrio financeiro do termo de colaboração. Já tivemos reuniões com a empresa e estamos aguardando o parecer. Hoje, o município está inadimplente em cerca de R$ 7 milhões, que são referentes apenas ao que não está previsto”, explicou Danilo Alvarenga.
Repercussão na Câmara
O vereador Neidson Dias Freitas (MDB), que compõe o bloco de oposição ao prefeito Marco Antônio Lage (PSB), deu início à discussão no Legislativo ao mencionar a reportagem do jornal Diário de Itabira. Ele solicitou a inclusão de um representante da Unifei na comissão de acompanhamento do empreendimento, além de cobrar um posicionamento da mineradora Vale e da Prefeitura de Itabira para que venham a público esclarecer a real situação da expansão do campus da Unifei.
“Gostaria de pedir que o jurídico desta Casa para que fizesse oficialmente um pedido à Prefeitura para inserir um membro da Unifei nas discussão do campus. (…) O jogo de empurra-empurra continua: a Vale dizendo que está em dia com os seus repasses e a Prefeitura falando que está em dia com a prestação de contas da Unifei. (…) Então o que está acontecendo é que a obra está atrasada em mais de um ano e que deveria ter sido entregue para a população de Itabira, já deveria ter centenas de novos alunos estudando. É importante que o empresário, o comerciante e as pessoas que vivem [em Itabira] e sabem que esse projeto está acima de prefeitos, saibam sobre o prejuízo que Itabira está tendo com essas obras paradas. E até agora ninguém veio aqui explicar o que está acontecendo”, disparou Neidson Freitas.
Em resposta, Weverton Leandro Santos Andrade “Vetão” (PSB), correligionário e base parlamentar de Marco Antônio Lage, destacou que os atrasos têm sido motivados pela necessidade de um reequilíbrio financeiro das planilhas de obras. Ele também defendeu que é necessário fiscalizar o contrato de colaboração entre Prefeitura e Vale desde a sua formatação, ainda no governo Ronaldo Lage Magalhães (à época no PTB e, atualmente, no União Brasil).
“É importante a Câmara realmente adentrar sobre o assunto, mas compreender o que é esse reequilíbrio financeiro que as empresas estão solicitando, se esses reequilíbrios financeiros estão dentro da normalidade e o que pode ser feito. [Entender] se há necessidade de paralisação daquelas obras, entender a fundo se o contrato, desde o início, teve algum vício ou algo nesse sentido. Agora é muito importante que a Unifei não seja utilizado por questões políticas partidárias, porque a Unifei é o único caminho para a nossa diversificação econômica”, afirmou Weverton Vetão.
“Nós precisamos ter uma grande responsabilidade porque há recursos do privado e nós temos que ter a intenção de querer resultado e não apenas desgaste. A Câmara precisa discutir e vamos discutir todos os pormenores: por que está paralisada? Como foi dado início a essa construção? Se é realmente o reequilíbrio financeiro que as empresas estão pedindo? O que está acontecendo? É importante, talvez, o secretário de Obras vir à Câmara para apresentar justificativa, fazer encontro com todas as partes, chamar Vale e Unifei. Até porque se tiver qualquer pressão de empresa por reequilíbrio financeiro dentro da não normalidade, nós temos que trazer a tona também. (…) Tem que se fazer dentro da legalidade e da normalidade, dinheiro público não pode simplesmente ir porque um empresário está pedindo. Tem que saber se está dentro da normalidade”, completou Weverton Vetão.
O presidente da Câmara de Itabira, Heraldo Noronha Rodrigues (PTB), disse que os atrasos nas obras da Unifei podem fazer com que o município perca o projeto, assim como aconteceu nos casos da Receita Federal, da unidade prisional do município e da Sotreq, empresa que deixou a cidade para se instalar em São Gonçalo do Rio Abaixo. O petebista também voltou a defender a criação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para apurar os atrasos nas obras da Unifei.
“A situação da Unifei já virou novela, está igual aquelas novelas do SBT, que fica no vai e vem e não muda. A situação da Unifei para nós, itabiranos, já está uma vergonha. Já tem outra cidade fazendo uma nova Unifei e, nós, com dinheiro, projeto aprovado, tudo belezinha e não sai do papel. Fica um jogando para o outro. O reitor estava aqui, falou belas palavras, que a gente vai reunir talvez no Rio de Janeiro, que vai conversar com o prefeito, vai conversar com a Vale, mas, infelizmente, se nós, representantes do povo, não tomarmos uma decisão séria em relação à Unifei vamos perder a universidade igual perdemos a Receita Federal, o presídio e a Sotreq”, analisou Heraldo Noronha.
José Júlio Rodrigues “do Combem” (PP) também se posicionou sobre o caso. Ele considerou que a Prefeitura de Itabira é a principal responsável pelo empreendimento — e que é preciso diálogo entre as partes, Vale, Prefeitura e Unifei, com participação do Legislativo, para que se possa chegar a uma solução para a demora na conclusão dessa etapa de expansão do campus.
“Eu tenho claro para mim de quem é a responsabilidade pela obra e tenho isso muito tranquilo. É uma responsabilidade da Prefeitura. Eu tenho visto a todo momento muito disse que me disse, fala uma coisa e depois a gente percebe que aquilo que foi dito não é mais, é mentira. Então a gente precisa sentar com Vale, Prefeitura e Unifei para podermos entender melhor e ter clareza quanto a isso. Mas uma coisa é certa: a Vale tem compromisso de repassar o dinheiro para a Prefeitura a medida que ela for executando a obra e que, até então, pelo o que parece, a responsabilidade é que a Prefeitura não está conseguindo executar isso. Está muito tranquilo em todas as informações que são colocadas. Com todo o respeito ao prefeito atual, nós não podemos deixar de enxergar a realidade em relação a Unifei”, observou Júlio do Combem.
Posicionamento oficial
O portal DeFato solicitou para a assessoria de comunicação da Prefeitura de Itabira um posicionamento oficial sobre o caso. O Executivo alegou que tem realizado todas as prestações de contas junto a Vale. Também destacou que o prefeito Marco Antônio Lage se reunirá com a mineradora em março para discutir o contrato de colaboração, assinado ainda na gestão Ronaldo Magalhães. Confira na íntegra a nota:
“A Prefeitura de Itabira, por meio da Secretaria Municipal de Obras, Transportes e Trânsito (SMOTT), e a Vale têm mantido contato constante para encontrar soluções para a questão das obras dos três novos prédios da Unifei Itabira. Por transparência, a Prefeitura de Itabira não só repassa as prestações de contas à Vale, mas informa sobre toda e qualquer movimentação nas obras, incluindo medições, projetos, acordos para reequilíbrio financeiro e demais dados técnicos. O acordo firmado pela gestão passada para as obras será tema de discussão entre o prefeito Marco Antônio Lage e a direção da empresa no mês de março, para intensificar o diálogo entre as partes”.
Entenda
Em junho de 2020, foram assinadas as ordens de serviço para o início da construção dos prédios 4, 5 e 6 do campus local da Unifei. A previsão inicial de investimento era de R$ 116 milhões, mas com as adequações de planilhas e aditivos, o empreendimento pode chegar a R$ 190 milhões — com a Vale arcando com R$ 160 milhões e o município com R$ 30 milhões.
A empreitada estava prevista para terminar em 2022, porém, os atrasos na obra dilataram esse prazo. Agora, os novos prédios só devem ser entregues em 2024.
Em entrevista ao portal da DeFato, em janeiro deste ano, o presidente da Câmara Municipal, Heraldo Noronha, afirmou que irá propor a criação de uma CPI para entender a situação e o que está gerando os atrasos na construção dos prédios da Unifei. Porém, até o momento, o assunto não foi pautado no plenário do Legislativo.