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Por que Itabira perdeu a Companhia Siderúrgica Nacional?

Por que Itabira perdeu a Companhia Siderúrgica Nacional?

Usina da Companhia Siderúrgica Nacional - Foto: Redes Sociais

O tempo está acabando. Itabira seria o centro das atenções mas perdeu o “pique da bola”, como diriam comentaristas de futebol. Quem resguardou algo de Itabira, que pode estar rendendo correções no exterior, foi um dos prefeitos que era acusado de amar a Vale, ter medo da Vale, jamais brigar com a Vale. No contexto geral, somente ele peitou a Vale. Gente de confiança, a mim informava sempre seus passos profissionais.

LI  Guerra x Vale do Rio Doce

Fato nobre, ocorrido 56 anos depois, chamou a atenção do Brasil e deixou os itabiranos pasmos. Em duas ações movidas pela Prefeitura de Itabira contra a  Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), em agosto de 1996, o então prefeito Olímpio Pires Guerra, o Li, mencionou a “traição histórica” do governo brasileiro ao escolher Volta Redonda como sede da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) em detrimento de Itabira, que já dispunha da Estrada de Ferro Vitória-Minas e detinha grande estoque natural de reservas minerais. A mineradora reconheceu publicamente e ainda mencionou, há seis anos (deve haver correções), pendências em seus negócios.

Li Guerra e o autor desta crônica, José Sana – Foto: Taquinho Silva

Diz a Vale S. A. em correspondência encaminhada  às bolsas de Valores dos Estados Unidos no balanço de 2017: “Somos réus em duas ações separadas, movidas pelo município de Itabira, no estado brasileiro de Minas Gerais. Na primeira ação, iniciada em agosto de 1996, o município de Itabira alega que as nossas operações de mineração de minério de ferro causaram danos ambientais e sociais, e a alegada degradação ambiental do local de uma de nossas minas, bem como solicita imediata restauração do complexo ecológico afetado e do desempenho de compensações ambientais em programas na região”.

“A indenização pretendida, ajustada a partir da data do pedido, é de aproximadamente R$ 4,702 bilhões. Um laudo pericial favorável à Vale foi emitido, mas o tribunal concedeu pedido da municipalidade para provas periciais adicionais. A elaboração desta prova pericial adicional está pendente”, continua o documento.

E prossegue: “Na  segunda ação, iniciada em setembro de 1996, o município de Itabira reivindica o direito de ser ressarcido por despesas incorridas em conexão com serviços públicos prestados como consequência de nossas atividades. A indenização pretendida, ajustada a partir da data da reclamação, ascende a aproximadamente R$ 5,440 bilhões. Este processo foi suspenso para uma negociação de liquidação, mas retomou seu curso normal, pois as partes não chegaram a um acordo, e a fase de produção de evidências seguirá”.

Os prefeitos da lista sequente podem explicar o que houve no decorrer de suas gestões. Houve, sim, movimentações de um ou outro. E aí estão as armas itabiranas que merecem atenção de nossas atuais autoridades. Resta saber o que fazer com os bilhões a serem calculados e manipulados por algum dono da bola, caso Itabira vença essa empreitada. Mas é preciso lutar, brigar. Como todos sabem, “dinheiro nas mãos de mineiro é tiro no pé” (frase anônima que encontrei nas redes sociais).

Arrancando minério no Pico do Cauê na picareta – Foto: Arquivo/Vale

Israel Pinheiro, o primeiro

Em 15 de junho de 1996, como repórter e editor da revista DeFato, estive no gabinete do então deputado federal e secretário de Estado de Transportes e Obras Públicas do ex-governador Eduardo Azeredo, Israel Pinheiro Filho, para uma entrevista. O tema do encontro era a duplicação da BR-381, mas teve, também, referências à CVRD. O motivo não seria outro porque o pai de Israelzinho, Israel Pinheiro, foi o primeiro superintendente e presidente da mineradora.

Da entrevista surge um presente valioso, autografado pelo secretário, o livro “Israel, uma vida para a história”, de autoria de Alisson Mascarenhas Vaz (19.ª edição, Editora Rio de Janeiro, 1996, 415 páginas, biografia autorizada). A leitura da preciosa obra nos leva aos bastidores finais que terminaram com a decisão de implantar a CSN em Volta Redonda, essa que sempre foi a maior siderúrgica brasileira.

Itabira na década de 1930 – Foto: Brás Martins da Costa

Atentem-se para o fato que está claríssimo no livro de Alisson Mascarenhas, páginas 167 e 168: “Israel sonhava transformar o Vale do Rio Doce no Ruhr brasileiro, trazendo para Governador Valadares a CSN, projetada para implantação em Volta Redonda. Para realizar seus planos, Israel usava de todos os artifícios”.

Agora, o fato paralelo, segundo Clodomiro de Oliveira, autor do livro “A Concessão da Itabira Iron” (1934), que acabei de resenhar, o que definiu o destino. Havia um grupo mineiro, chefiado pelo governador Artur Bernardes, ultranacionalista por sinal, que não aceitou que o norte-americano Percival Farcquar tivesse autorização para construir a siderúrgica em Minas Gerais.

Mas eis o que pesou no fim: Amaral Peixoto, interventor do Rio de Janeiro, era genro de Getúlio Vargas, o ditador (página 168). A pressão familiar funcionou a favor do estado fluminense e Itabira de Drummond de Andrade perdeu uma grande batalha que tornaria sua sina no decorrer dos anos seguintes e que precisa ser detida para que até o retrato de Itabira na parede seja retirado.

José Sana é jornalista, historiador, professor de Letras e ex-vereador em Itabira por dois mandatos, onde reside desde 1966

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

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