O projeto de lei 490/2007, que trata do marco temporal das terras indígenas, entra na pauta da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (30). O texto foi aprovado em regime de urgência na semana passada, na tentativa de antecipar a pauta do Supremo Tribunal Federal (STF), que vai julgar sua constitucionalidade no dia 7 de junho.
Essa votação será um tira-teima para o governo Luiz Inácio lula da Silva (PT) no Congresso e provoca tensão entre o agronegócio e ambientalistas. Para Aldo Rebelo, ex-ministro da Defesa na gestão Dilma Rousseff (PT), o atual governo não tem unidade sobre o assunto.
Rebelo esteve em Brasília na última segunda-feira (29), quando se reuniu com alguns ministros e parlamentares, de forma reservada, e disse ter sentido preocupação da parte deles com a divisão no governo. “Uma parte do governo acha que esse projeto é uma porta aberta para a confusão”, disse.
É notória a dissidência entre os governistas, como é o caso da ministra Marina Silva, do Meio Ambiente e Mudança no Clima, e Sonia Guajajara, ministra dos Povos Originários, que se postam contra o projeto de lei, enquanto o ministro Carlos Fávaro, da Agricultura, defende o marco temporal.
O imbróglio envolvendo o projeto de lei está na redação do artigo 231 da Constituição. Os ruralistas entendem que uma terra indígena só poderia ser demarcada se ficar comprovada a presença dos índios no território requerido na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. Quem não habitasse essas terras até aquela data, não teria direito a pedir demarcação.
Essa tese dos ruralistas confronta com os interesses de ambientalistas e defensores dos indígenas. Para esses, a aprovação do projeto de lei nesses moldes poderia mudar o curso de ao menos 303 pedidos em andamento, que estejam em processo de demarcação, sem que tenha sido concluído. O centro do debate são os 11 milhões de hectares onde vivem 197 mil índios.
De acordo com o monitoramento do Instituto Socioambiental (ISA), embasado pelo Diário Oficial da União (DOU), o Brasil tem 421 terras indígenas devidamente homologadas, que somam 106,6 milhões de hectares e que abrigam 466 mil índios.
O julgamento pelo STF no próximo dia 7 de junho, sobre o projeto de lei 490/2007 terá uma abrangência para casos similares em todo o País. A decisão envolve uma ação de reintegração de posse do governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, que requer, por sua vez, a demarcação da terra indígena Ibirama-Laklanõ, onde também vivem indígenas das etnias Guarani e Kaingang.
O julgamento está paralisado desde 2021, quando o ministro Alexandre de Moraes pediu vista ao processo. Até então, o placar estava em um voto favorável e outro contrário à proposta.
O ministro Edson Fachim se posicionou contra a tese do projeto de lei, afirmando que “a promulgação da Constituição Federal de 1988 não constitui marco temporal para aferição dos direitos possessórios dos indígenas”. Por sua vez, o ministro Nunes Marques defendeu outro posicionamento, divergindo do seu colega, manifestando pela aplicação do marco temporal que, segundo ele, “reconhecer pedidos de posses posteriores à data da promulgação da Constituição implicaria o direito de expandi-las ilimitadamente para novas áreas já definitivamente incorporadas ao mercado imobiliário”.
Protesto
Nesta terça-feira (30), um grupo da etnia Guarani, da Terra Indígena Jaraguá, bloqueou a Rodovia dos Bandeirantes, na altura do Km 20, sentido São Paulo, protestando contra a votação do marco temporal.
Foram armadas barricadas antes das 6h, com fogos em pneus que interromperam totalmente o tráfego na via provocando mais de 6 km de congestionamento no início da manhã.
A Tropa de Choque da Polícia Militar usou bombas de efeito moral e jatos d’água para liberar a rodovia. Houve um princípio de confronto, mas o bloqueio foi derrubado após 15 minutos.