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Projeto para municipalização de quatro escolas em Itabira tramita na Câmara; saiba mais

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Fachada da Escola Estadual Major Lage - Foto: Arquivo/Defato

A Prefeitura de Itabira encaminhou à Câmara Municipal um projeto de lei que autoriza a adesão ao programa Mãos Dadas, do Governo de Minas Gerais. A iniciativa prevê a transferência da gestão dos anos iniciais do ensino fundamental, do 1º ao 5º ano das escolas estaduais para a rede municipal. Em Itabira, a mudança afetaria quatro instituições: Escola Estadual Major Lage, Escola José Ricardo Martins Fonseca, Escola Dona Eleonora Nunes Pereira e Escola Antônio Martins Pereira. O Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação – subsede Itabira (SindUte) se posicionou contra a adesão ao projeto. A entidade teme que a medida sobrecarregue o município e comprometa a qualidade do ensino.

A proposta tramita em regime de urgência e prevê que, após a adesão, o município assuma a gestão administrativa, financeira e operacional das turmas.

Em entrevista ao portal DeFato Online, o prefeito Marco Antônio Lage (PSB), explicou que a adesão está sendo analisada diante da redução de matrículas nas escolas estaduais para as séries iniciais. “As escolas públicas estaduais já estão deixando de aceitar matrículas do 1º ao 5º ano. Esses alunos obrigatoriamente recorrem à rede municipal, que já atende essa faixa, mas de forma híbrida. Então, ou recebemos esses alunos agora com investimentos do Estado, ou, nos próximos anos, vamos absorvê-los sem nenhum centavo de apoio”, afirmou.

Segundo ele, caso a adesão ocorra, a estimativa é que 1.200 novos alunos ingressem na rede municipal, que hoje atende cerca de 9 mil estudantes. Para comportar essa demanda, a prefeitura calcula um investimento de R$25 milhões, incluindo construção e ampliação de escolas, especialmente nos distritos. “Ou a gente aceita agora e garante recursos para infraestrutura e custeio, ou a pressão vai aumentar, sem estrutura adequada”, completou.

Custeio

Sobre o custeio, Marco Antônio afirmou que a promessa do governo estadual é repassar recursos equivalentes aos alunos transferidos, incluindo verbas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). No entanto, ele ponderou que o acordo precisa ser formalizado para evitar problemas futuros. “Não pode ser algo verbal. É necessário um compromisso definitivo, com garantias claras”, disse, destacando a preocupação com a falta de repasses do Estado em outras áreas.

Questionado sobre a avaliação geral do processo, o prefeito apontou riscos tanto na omissão do Estado quanto na transferência sem planejamento. “Nos preocupa a visão de que recursos da educação possam ser flexibilizados para outras áreas. Educação precisa ser prioridade real. E também é preciso garantir padrão e igualdade de oportunidades. Caso contrário, cidades com mais recursos terão educação melhor, e as mais pobres, uma educação precária, ampliando o abismo social”, alertou.

SindUte é contrário ao projeto

Em nota enviada à reportagem, o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação – subsede Itabira (SindUte), por meio da coordenadora Vanderléia de Freitas, criticou a proposta de adesão ao projeto Mãos Dadas. A entidade afirma que a justificativa apresentada pela Prefeitura “não serve de base” e considera desrespeitoso o argumento de que a municipalização garantiria maior eficiência.

O sindicato alerta para impactos financeiros, pedagógicos e sociais, ressaltando que a contrapartida oferecida pelo Estado é pontual e restrita a obras e equipamentos, não contemplando custeio ou folha de pagamento. Segundo a nota, isso pode sobrecarregar os municípios, comprometer a qualidade do ensino, afetar metas da educação infantil e gerar desemprego entre profissionais da rede estadual.

A entidade cobra transparência, debate público e avaliação da capacidade de atendimento antes de qualquer decisão, e pede que o prefeito Marco Antônio Lage retire o projeto da Câmara (confira a nota na íntegra ao final da matéria).

TCE-MG suspende iniciativa

A discussão surge em meio a uma decisão recente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCEMG), que determinou a suspensão imediata de novas adesões ao projeto Mãos Dadas. A medida cautelar, tomada no início de julho, atende a uma representação da deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT), que aponta riscos à qualidade e continuidade do ensino público.

Segundo o TCEMG, a adesão de municípios ao projeto vem ocorrendo sem comprovação da capacidade técnica, financeira e estrutural das prefeituras para assumir novas matrículas, especialmente de estudantes com deficiência ou necessidades educacionais específicas.

Atualmente, 163 municípios mineiros já estão vinculados à iniciativa. O relator do processo alertou que municípios situados em regiões com baixa capacidade arrecadatória podem enfrentar dificuldades em destinar recursos adicionais para ampliar ou qualificar a rede educacional. Por isso, segundo ele, “a implementação deste programa não pode ocorrer de forma indiscriminada ou automática”.

Projeto Mãos Dadas

Criado em 2021, o projeto Mãos Dadas é facultativo e já repassou mais de R$1 bilhão em recursos às cidades que aderiram, segundo o Governo do Estado. No entanto, críticas persistem desde o lançamento, principalmente sobre a falta de garantia de custeio permanente para manutenção das novas responsabilidades pelas prefeituras. Em 2023, trabalhadores da educação realizaram atos contra a municipalização em várias cidades, incluindo Itabira, alegando que a medida poderia precarizar o serviço e reduzir salários.

Nota do SindUte

“Essa justificativa apresentada para a Prefeitura aderir ao projeto Mãos Dadas não serve de base. A rede municipal e a rede estadual têm qualidade. Tentar rivalizar as duas redes, com argumentos de que a rede municipal está mais perto das pessoas, podendo adaptar políticas e programas às necessidades locais, garantindo maior eficiência e qualidade no ensino, é jogar no lixo todo o trabalho que as escolas estaduais realizaram; é um grande desrespeito com as escolas estaduais.

Esse projeto tem vários impactos: impacto financeiro, pedagógico e social.

O Estado faz apenas repasses pontuais e temporários, mas transfere aos municípios a responsabilidade permanente pela educação — incluindo salários, manutenção, estrutura e transporte escolar. Essa sobrecarga ocorre sem garantir recursos suficientes nem condições reais de atendimento.

Quem mais sofre com isso são os estudantes, que enfrentam a precarização do ensino, a redução da oferta educacional e o risco de descontinuidade nos estudos, especialmente nas áreas rurais e nas periferias. Profissionais da educação também são duramente atingidos, com desemprego, perda de direitos e instabilidade nas carreiras. As comunidades escolares, por sua vez, enfrentam a insegurança e a fragmentação de vínculos construídos ao longo de décadas.

Essa contrapartida financeira que o Estado oferece ao Município não pode ser utilizada para custeio nem folha de pagamento. É restrita para obras, reformas ou compra de equipamentos. O valor é fixo. Na hipótese de ser insuficiente, não há complementação ou atualização de valores; ou seja, o Município terá que arcar. O custo de manutenção das novas matrículas fica integralmente com o município. Por isso, é preciso considerar a ótica dos investimentos realizados pela Prefeitura para manter o atual nível de investimento e evitar a queda na qualidade do ensino fundamental que oferta.

A metodologia de cálculo do Estado não considera os investimentos realizados pela Prefeitura com recursos próprios; considera apenas os investimentos realizados com recursos de transferência legais e constitucionais — FUNDEB, salário-educação, Programa Dinheiro Direto na Escola, Programa Nacional de Alimentação Escolar. De acordo com estudos técnicos, o valor que a Prefeitura terá que investir anualmente será mais do que os valores recebidos, porque vai aumentar as matrículas. Consequentemente, a qualidade do ensino tende a cair.

Outro ponto importante é a respeito do cumprimento das metas da educação infantil previstas no Plano Estadual de Educação e no Plano Municipal de Educação, pois a absorção de novas matrículas do ensino fundamental vai comprometer a oferta da educação infantil, que é competência exclusiva do Município.

O impacto social será as demissões, porque os trabalhadores contratados pelo Estado não serão absorvidos pela Prefeitura, visto que a legislação só permite contrato através de processo seletivo. É preocupante a questão das auxiliares de serviço, porque na Prefeitura esse serviço é terceirizado.

O ponto importante é que, justamente quando o Prefeito quer reduzir gastos em todas as secretarias, ele vai aumentar gastos sem necessidade, porque a Prefeitura não é obrigada a municipalizar as escolas estaduais.

Não existe prazo para a municipalização, pois não tem prazo legal determinado para isso. O Estado não pode deixar de ofertar o ensino fundamental sem que a Prefeitura concorde, pois se trata de acordo de cooperação (Resolução SEE 5.036/24, art. 35).

O que temos que levar em conta é que educação não é mercadoria. É muito importante e valiosa, não pode servir de barganha, como o governo de Minas Gerais quer fazer.

O Município, por força do caput do art. 3º da Lei Estadual nº 12.768/1998, deverá realizar avaliação da capacidade de atendimento escolar antes de solicitar autorização legislativa na Câmara Municipal para aderir ao projeto Mãos Dadas. Essa avaliação precisa ser pública.

Nós esperamos que o Prefeito Marco Antônio Lage retire esse projeto da Câmara Municipal, porque esse projeto complexo não pode ser votado a toque de caixa. Não houve debate com o SindUTE nem com o público interessado.

Somente uma vez a secretária da Educação conversou com o sindicato, mas não informou a quantidade de alunos, alegou que ainda estava negociando valores, somente isso, e que ainda não tinha nada confirmado. Nós nem sequer conversamos com o prefeito; enviamos ofício, mas não fomos recebidos.

Marco Antônio Lage, se realmente o senhor preza a educação de qualidade, e é o que nós esperamos, reveja o que está sendo feito e retire esse projeto da Câmara Municipal.”

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