Após mais de um ano afastadas das arquibancadas, as torcidas brasileiras, aos poucos, vão voltando ao seu habitat natural. Com a capacidade dos estádios variando de acordo com a realidade de cada estado, todos os times da Série A já podem contar com o apoio dos seus torcedores. No entanto, o que deveria ser motivo de alegria e emoção, tem se tornado pesado e problemático. O retorno dos torcedores aos campos de futebol resume, perfeitamente, nosso atual momento como sociedade.
São poucos os exemplos positivos de sintonia entre time e torcida. O Atlético-MG, cada vez mais próximo do título brasileiro, e o Corinthians claramente estão fazendo valer a volta dos fãs. Outro a ser citado é o Fortaleza, cuja torcida aplaudiu a equipe mesmo após a eliminação na Copa do Brasil, reconhecendo a grande temporada do Leão.
Fora isso, o que se vê são partidas com ambientes pesados, marcados pelas vaias, xingamentos, a tensão. Tal embate tem sido tão forte que tivemos dois casos recentes de comemorações de gols nas quais os jogadores se voltaram contra a torcida. Luiz Adriano, na vitória do Palmeiras sobre o Sport por 1 a 0, mandou a bola para o fundo das redes e não hesitou em desabafar contra quem pegava no seu pé.
No último sábado, o Fluminense também venceu o Sport pelo mesmo placar, com um gol aos 50 do segundo tempo. Cenário perfeito para uma linda celebração entre time e torcida, certo? Errado! Os atletas fizeram questão de comemorarem o tento afastados dos pouco mais de 3000 tricolores que compareceram ao Maracanã. Assim como Luiz Adriano, Lucca também proferiu xingamentos em direção à arquibancada.
No início de outubro, em partida contra o Avaí, Enderson Moreira, técnico do Botafogo, também teve desentendimentos com os botafoguenses que foram ao Engenhão. Na entrevista pós jogo, o treinador disse lamentar que alguns torcedores “tragam tanta negatividade”. E olha que estamos falando de um time que vinha embalado e assumiu a liderança da Série B neste domingo, após goleada contra o Vasco.
Mas há, ainda, casos mais graves. Na última rodada do Brasileirão, assistimos, incrédulos, torcedores do Grêmio invadindo o gramado depois da derrota para o Palmeiras por 3 a 1. A cabine do VAR e seguranças do estádio foram atacados por gremistas que estavam com sangue nos olhos. Ainda houve tempo para um confronto patético entre torcedores das duas equipes nas cadeiras da arena.
Símbolo de um país cada vez mais talhado pelo ódio. O Brasil do Maracanã, do Allianz ou da Arena do Grêmio é o Brasil da intolerância, do policial que agride uma mulher com o bebê ao colo, do manifestante atropelado por um “rival” político. Tal clima tem se intensificado há vários anos, e ainda pode piorar após uma experiência traumática como a pandemia. Seria inocência acreditar que o futebol passaria incólume por isso.
Victor Eduardo é jornalista e escreve sobre esportes em DeFato Online.
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