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Suspensão de pagamentos de empréstimos consignados: alívio imediato e um convite à reflexão

prefeito

O plenário do Senado aprovou, na última semana, Projeto de Lei que garante suspensão dos pagamentos de empréstimos consignados contraídos por aposentados durante 120 dias. A medida está relacionada aos impactos financeiros da pandemia do coronavírus e ainda precisa ser aprovada pela Câmara dos Deputados e depois sancionada pelo presidente. Ao entrar em vigor, a nova legislação garantirá um suspiro a milhões de brasileiros que têm, mensalmente, parte da aposentadoria abocanhada por instituições financeiras. Oportunidade também para um momento de reflexão sobre esse tipo de transação que motiva grande volume de reclamações em órgãos de proteção ao consumidor por causa de armadilhas.

Os empréstimos consignados são aqueles descontados diretamente na folha de pagamento do aposentado. É um tipo de contrato praticado em larga escala no Brasil, como mostram os números do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Segundo o órgão, existem 34,2 milhões desse modelo de empréstimo no país, isso para uma população de 35 milhões de aposentados. O assédio das financeiras é grande e a principal sedução está nos juros baixos, geralmente menores e mais atrativos que aqueles praticados em outras opções de repasse de crédito.

De acordo com o INSS, o número de aposentados que contraíram algum tipo de empréstimo consignado aumentou em mais de 5% entre 2019 e 2020. O aumento coincide com medidas adotadas pelo governo federal para diminuir os impactos da Covid-19 na economia, como a dilatação do prazo de pagamento de empréstimos para os segurados, que passou de 72 para 84 meses. O projeto de lei aprovado pelo Senado é mais uma ação direcionada a dar respiro aos aposentados e o mais importante é que esses movimentos não sejam interpretados como um estímulo à contratação de novos empréstimos.

Os consignados, assim como qualquer outro tipo de empréstimo, devem ser vistos como medidas de última instância. Precisam ser bem estudados e, se possível, analisado por um especialista no assunto. Uma realidade muito distante da grande maioria dos aposentados brasileiros, quase sempre bastante humildes, geralmente endividados e sem acesso digno à informação. É nesse cenário de vulnerabilidade que mora o perigo das ofertas tentadoras e do dinheiro fácil. Não cabe aqui uma generalização, mas os índices de reclamações e ações judiciais ainda mostram que a relação entre contratantes e instituições financeiras continuam conflituosas, para dizer o mínimo.

Em todo ano passado, a plataforma ReclameAqui, famosa por dar espaço a consumidores insatisfeitos com algum produto adquirido, registrou cerca de 15 mil denúncias contra empréstimos consignados contraídos por aposentados. Dados do Banco Central mostram que reclamações contra esse modelo de transação aumentou 80% entre os anos de 2017 e 2019. A situação começou a sair do controle e forçou o INSS a adotar novas regras no ano passado, criando algumas condicionantes e tornando mais rígida a fiscalização.

As principais reclamações estão relacionadas à dificuldade de portabilidade do empréstimo para outro banco ou financeira, cobranças de créditos que não foram solicitados ou de taxas que não foram informadas no momento da contratação. Também são citadas pelos reclamantes as constantes e infernais ligações com ofertas, dificuldades de quitar a dívida de uma só vez ou então negociar o débito.

Desde 2019, aposentados e pensionistas só podem receber propostas de empréstimos após seis meses da concessão do benefício. Os bancos e financeiras ficaram obrigados a passar informações mais detalhadas sobre o consignado e as novas solicitações passaram a demandar um Termo de Consentimento Esclarecido (TCE). Vale lembrar que o aposentado não pode comprometer mais de 35% da renda mensal líquida com o pagamento das despesas do consignado.

A diminuição desse cenário prejudicial aos aposentados brasileiros passa por fiscalização mais rigorosa dos órgãos competentes, uma nova postura das instituições financeiras e atenção redobrada de quem demanda o empréstimo. É preciso que haja mais proteção às possíveis vítimas e uma resposta mais rápida às denúncias de irregularidades. A realidade do trabalhador brasileiro já é dura o bastante para ainda ter que enfrentar mais dores de cabeça depois da almejada aposentadoria.

Gustavo Milânio é advogado e chefe de gabinete da Presidência do TCE/MG

O conteúdo expresso neste espaço é de total responsabilidade do colunista e não representa necessariamente a opinião da DeFato.

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