O Ministério Público do Trabalho (MPT) condenou a Universidade Federal de Itajubá (Unifei) a efetuar o pagamento de uma indenização por dano moral coletivo, no valor de R$100 mil, após verificar a ocorrência da prática de assédio moral dentro da instituição de ensino, no campus Itabira.
O processo foi movido pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sintunifei) em 26 de abril e a sentença foi publicada em 2 de setembro. Uma semana depois, no dia 9, a universidade recorreu contra a decisão através da Procuradoria-Geral Federal da Advocacia-Geral da União (AGU) e a matéria está tramitando em grau de recurso.
Na sentença expedida por Adriano Antônio Borges, Juiz Titular da Vara do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho alegou que foram verificadas condutas ofensivas por parte de Gilberto Cuzzuol (diretor do campus de Itabira), Fabiana Costa Guedes (vice-diretora do campus de Itabira), Marcos Galvão (pró-diretor de Infraestrutura) e Cláudio José Freire Guimarães (procurador-chefe).
Os superiores hierárquicos teriam cometido os atos contra os servidores que lá trabalham, sem que fossem adotadas providências para coibi-las. Tais práticas se materializavam, conforme apurado em Inquérito Civil, por meio de tratamento grosseiro e desrespeitoso, dirigido aos trabalhadores, sobretudo do sexo feminino.
As atitudes, por exemplo, aconteciam pela: interrupção de falas, falas com tom alterado de voz, agressões verbais, obstaculização do relacionamento e diálogo com a diretoria, retardamento dos pedidos feitos pelos servidores, ordens diretas não intermediadas pelo superior hierárquico, falta de local adequado às refeições, impedimento à mudança de setor e atribuição de serviços estranhos aos subordinados. Tais fatos, segundo a sentença, teriam levado a pedidos de exoneração por três servidores.
Uma ex-servidora que atuou como técnica de laboratório na Unifei afirmou em audiência realizada pelo Ministério Público que dentro da instituição de ensino não havia refeitório para os funcionários, que utilizavam o Restaurante Universitário (que ainda não foi concluído integralmente e passou a ser utilizado por toda a comunidade acadêmica e terceirizados para realizar as refeições). Fora esta opção, o servidor deveria fazer suas refeições no restaurante existente no local pagando o valor cobrado ou realizar suas refeições no próprio local de trabalho. Também foi atestado pelo Corpo de Bombeiros ao MPT que um Auto de Vistoria (AVCB) estaria vencido — fato que denotaria a exposição dos trabalhadores a elementos químicos.
Durante o processo, os representantes da Unifei, ao comparecerem à audiência administrativa perante o MPT, se negaram a assinar um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) à Ordem Jurídica, apenas informando que a instituição de ensino estava adotando medidas para combater as práticas, como a instalação de locais adequados às refeições e o desenvolvimento de políticas que visem a garantia da segurança e saúde no ambiente de trabalho.
Em sua defesa durante o processo, a Unifei negou haver conduta ofensiva ou discriminatórias, afirmando que as reclamações feitas perante o Ministério da Educação e levadas ao conhecimento da reitoria, foram arquivadas por não configurarem situações de assédio moral, conclusão a qual também teria chegado o Ministério Público Federal.
Além disso, a defesa informou que as acusações dos servidores contra a administração da universidade originaram-se do descontentamento com os serviços, “uma vez que as incumbências dadas a eles não extrapolaram as atribuições dos respectivos cargos”, e que as irregularidades apuradas pelo Corpo de Bombeiros estão relacionadas às medidas de prevenção de incêndios, e não à falta de condições do almoxarifado de produtos químicos, o que teria sido o objeto do pedido.
Além da multa de R$100 mil por danos morais coletivos, o Juiz determinou que a instituição não deverá “tolerar, consentir ou aceitar que seus superiores hierárquicos pratiquem atos de violência psicológica ou assédio moral contra servidores e trabalhadores terceirizados que lhe prestem serviços”, sob pena de multa no valor de, no mínimo, R$10.000,00, a cada constatação de descumprimento.
A universidade também deverá manter os seus estabelecimentos de acordo com as legislações vigentes e manter atualizado o Auto Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB), sob pena de, no mínimo, R$30.000,00 a cada constatação de descumprimento.
Sindicato alerta para cultura de assédio moral dentro da Unifei
A DeFato procurou o Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sintunifei) para obter um posicionamento sobre o caso. Em nota, o Sintunifei afirmou que reuniu vários casos de assédio moral relatados pelos servidores de Itajubá que se assemelham com os casos de Itabira, e afirmou que as situações levam a crer “que há uma cultura de assédio moral praticada por docentes e gestores despreparados para lidar com os servidores”.
Confira a nota na íntegra:
“A atual gestão do SINTUNIFEI, após tomar conhecimento do processo movido pelo MPT em Itabira, reuniu vários casos de assédio moral relatados pelos servidores de Itajubá que se assemelham com os casos de Itabira, tendo em vista que após consultar diversos servidores, incluindo já aposentados, nos levam a crer que há uma cultura de assédio moral praticada por docentes e gestores despreparados para lidar com os servidores.
Desta forma coube a nós entrar como amicus curiae no processo, a fim de juntar forças e interromper esse ciclo vicioso, que causa prejuízos diversos para a instituição com absenteísmo devido a doenças, remoções forçadas, entre outras práticas que nos são abomináveis e não deixam outro caminho a não ser pedir justiça para que se encerre tal ciclo.
Continuaremos vigilantes para que o assédio seja extirpado do nosso meio e para que todos tenham o devido respeito no trato com funcionários e toda comunidade acadêmica incluindo os terceirizados que ficam à mercê pela falta de uma representação que também lute pelos seus direitos básicos”.
Unifei se posiciona
Em resposta à solicitação de posicionamento feita pela DeFato, a Unifei respondeu que já recorreu da decisão judicial e que a matéria está tramitando em grau de recurso. A Universidade também disse que “os procedimentos não terminam nas eventuais condenações de supostos assediadores. Há todo um contexto institucional que precisa ser abordado para que situações de assédio não prosperem”.
Confira a nota na íntegra:
“A UNIFEI foi condenada no dia 02 de setembro de 2024, na 2. Vara do Trabalho de Itabira, em processo movido pelo Ministério Público da União, por suposto assédio moral. Em 09 de setembro de 2024, a Universidade recorreu dessa decisão através da Procuradoria-Geral Federal da AGU (Equipe de Matéria Administrativa da 6. Região) e a matéria está tramitando em grau de recurso.
Em paralelo ao trâmite jurídico, a Instituição deve buscar análise mais profunda dos procedimentos que levaram às denúncias de assédio moral, pois, independente do resultado do processo jurídico, há insatisfações que levaram às denúncias e que precisam ser tratadas adequadamente, sob risco de outras denúncias do gênero se repetirem. Vale ressaltar que relatos de supostos casos de assédio, que remontam a todo o período desde 2009, encontram-se listados no processo que foi julgado.
Ao longo dos últimos anos, a administração da Universidade se debruçou sobre o assunto, concluindo que os procedimentos não terminam nas eventuais condenações de supostos assediadores. Há todo um contexto institucional que precisa ser abordado para que situações de assédio não prosperem. A simples substituição de supostos assediadores, em geral, não surtem os efeitos desejados se não forem contempladas alterações organizacionais e, principalmente, culturais no seio da Universidade”.
Mais assédio na Unifei
Em 17 de setembro, um professor do instituto de Ciências Tecnológicas foi afastado da Unifei após ter sido alvo de mais de 10 denúncias por assédio moral contra um estudante itabirano, durante uma aula ministrada pelo docente. Inicialmente, o professor foi afastado apenas da turma onde ocorreu o caso, mas está sendo levantado pela Reitoria da Unifei se existem casos semelhantes em uma outra turma onde o docente também atua.
“Havendo, ele poderá ser afastado de todas atividades docentes durante a investigação”, informou Cleber Gonçalves Jr, secretário de comunicação da Unifei. Nas redes sociais, vários estudantes da instituição de ensino afirmaram que a aula do professor é conhecida por ter um clima tenso, com relatos de gritos de palavrões, tapas no quadro e humilhações.
Segundo relatos, na data do ocorrido a vítima teria sido insistentemente constrangida pelo professor por não conseguir resolver um exercício no quadro, e devido ao desconforto causado — e a forma hostil que foi tratado pelo homem na frente da turma —, o jovem passou mal e por duas vezes chegou a desmaiar. Estudantes também relataram que o professor seguiu dando a aula normalmente, mesmo após a ida de uma enfermeira no local.