Fracassou a movimentação do governo de Marco Antônio Lage (PSB) para aprovar, na Câmara de Vereadores, um empréstimo de R$ 70 milhões com a Caixa Econômica Federal. O projeto de lei (PL) 48/2021, de autoria do Executivo e que trata da operação, foi derrotado por dez votos, contra seis favoráveis e uma abstenção durante a 18ª reunião ordinária, realizada na tarde desta terça-feira, 8.
No placar, rejeitaram a contratação do empréstimo os emedebistas Neidson Freitas, Rosilene Félix, Luciano “Sobrinho” e Robertinho “da Autoescola”; os vereadores do PTB Júlio “Contador”, Heraldo Noronha, Rodrigo “Diguerê” e Sidney do Salão; além de “Tãozinho” Leite (Patriota) e Reinaldo Lacerda (PSDB).
Foram favoráveis Júber Madeira e Carlos “Sacolão”, do PSDB, Bernardo Rosa (Avante), Carlos Henrique (PDT), Júlio “do Combem” (PP) e Marcelino Guedes (PSB). O presidente da Casa, Weverton “Vetão” (PSB) se absteve.
O projeto
Marco Antônio Lage solicitou à Câmara de Vereadores, em pedido de urgência, autorização para contrair um empréstimo superior a R$ 70 milhões. O financiamento tem carência de 24 meses e prazo de amortização de 96 meses – totalizando 120 meses de operação. Ou seja, o empréstimo começa a ser pago na segunda metade do atual governo municipal, e se estenderá pelos oito anos seguintes. O recurso é proveniente do Programa de Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento (Finisa), linha de crédito destinada ao setor público.
De acordo com a redação do projeto, os R$ 70 milhões emprestados estariam sujeitos a juros de 100% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário), somados a 3,60% de correção ao ano e 2% do montante cobrados a título de taxa de contratação. No caso do CDI, o percentual caminha próximo à taxa Selic.
Portanto, somando juros e encargos, considerados moderados, a estimativa é que o município assumiria uma dívida superior a R$ 92 milhões. O projeto de lei atrelou o pagamento da despesa ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM), transferência obrigatória recebida da União.
Para quê?
A Prefeitura de Itabira divulgou recentemente, em material distribuído à imprensa, que o empréstimo custearia a primeira etapa de um pacote de obras, em resposta a “1,3 mil solicitações de intervenções em áreas urbanas e rurais do município”. Os pedidos citados vão de tapa-buracos à urbanização de ruas, passando por problemas como iluminação, zeladoria e outras demandas recebidas pela Secretaria de Obras. Inclui também modernização administrativa, treinamento de servidores e compra de veículos.
Entre as obras defendidas na empreitada está a conclusão da segunda etapa da avenida Integração (Machado de Assis) e a pavimentação da estrada entre os distritos de Ipoema e Senhora do Carmo.
Só o primeiro empréstimo
Todavia, o empréstimo de R$ 70 milhões não é o único sob planejamento. Na quarta-feira passada, 2, durante reunião de comissões antecipada por causa do feriado de Corpus Christi, o governo enviou à Câmara os secretários municipais de Fazenda, Gilberto Ramos, e de Obras, José Maciel Duarte de Paiva, para defenderem a aprovação do projeto de lei. E, eles informaram que é projetada a contratação de até R$ 150 milhões em empréstimos para tocar obras.
Gilberto Ramos disse que a Prefeitura de Itabira “tem um índice de endividamento muito baixo” e que a programação financeira do município pode absorver o impacto provocado. Ele demonstrou que o município amortiza hoje R$ 107 milhões, aproximadamente, com parcelamentos. “Gira em torno de 16% da receita corrente líquida”, indicou. “Considerando um pré-cálculo que fizemos, podemos absorver, ao longo de quatro anos, até R$ 150 milhões [em financiamentos]. O que passaria essa dívida para em torno de 32% [da receita corrente], o que é muito baixo”, afirmou o secretário, na ocasião.
Emenda modificativa
Antes do projeto de lei entrar no expediente desta terça-feira, o governo municipal protocolou, ainda, uma emenda modificativa. O documento assinado pelo próprio prefeito Marco Antônio Lage corrigiu o valor do financiamento, antes descrito em R$ 70 milhões, para R$ 70.150.000,00.
Movimentações
A reunião desta terça, agendada para as 14h, começou sob atrasos. Depois de iniciada, enquanto Reinaldo Lacerda, primeiro secretário, lia a ata da reunião anterior, os colegas conversavam nos bastidores. O clima era de apreensão. O presidente, Vetão, então suspendeu a sessão e convocou os parlamentares ao gabinete. Neidson Freitas pediu que o assunto do encontro fosse informado publicamente. Vetão foi taxativo: “é um tema interno”.
No retorno, ocorrido pouco depois das 15h10, os parlamentares deliberaram sobre as contas do ex-prefeito Damon Lázaro de Sena (PV) e outras matérias que constavam na pauta antes do pedido de empréstimo.
Pedido de vista
Num primeiro passo, antes de votar o texto-base do empréstimo milionário, foi colocada em discussão a emenda modificativa que elevaria o teto do financiamento em R$ 150 mil. Tão logo o microfone foi aberto, Heraldo Noronha interviu e pediu vista da emenda, impedindo a apreciação do dispositivo. O líder do governo, Júber Madeira, tentou reverter o pedido ao argumentar que a emenda tinha caráter “tão somente corretivo”. A manifestação de Júber foi em vão.
Bate-boca
Sem a emenda, foi iniciada a discussão da íntegra do projeto de lei 48/2021 e o clima esquentou. Neidson Freitas expôs demonstrativo do Sistema Informatizado de Contas dos Municípios (Sicom), onde o município “dispõe de R$ 204 milhões em caixa”. O emedebista também demonstrou projeções de receita que apontam que a Prefeitura pode se aproximar de uma arrecadação histórica de quase R$ 800 milhões/ano, puxada pela alta nos preços do minério de ferro e dos royalties da mineração.
Neidson prosseguiu no detalhamento e afirmou que a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem) atualmente é apurada em torno de R$ 16 milhões/mês, muito além dos R$ 10 milhões, em média, observados no exercício anterior. Com dinheiro em caixa, o oposicionista classificou a proposta de empréstimo como “descabida”.
Após enfatizar a saúde financeira do município, Neidson instigou os pares a não aprovarem o projeto. ” O prefeito não mostrou a que veio até agora e nos envia um projeto de empréstimo como esse?”, disparou o parlamentar.
Júber Madeira assumiu a defesa. Afirmou existir um cenário de sucateamento de serviços em Itabira, “comprovado em 1,3 mil indicações de melhorias urbanas e rurais” feitas pela Casa. Carlos Henrique rendeu o pronunciamento do líder e exaltou o discurso da campanha que apoiou em 2020: “eu acredito no Marco40”. Júber ainda criticou Neidson e recordou a aprovação, na legislatura passada, de um financiamento de R$ 45 milhões para as obras de prolongamento da avenida Machado de Assis – nomeada, posteriormente, avenida Integração.
Neidson revidou, fez comparações à gestão de Damon de Sena, apontadas como “desastrosa”. “Naquele momento [empréstimo de R$ 45 milhões] era necessário [o financiamento]. As finanças do município estavam longe da organização hoje herdada. Não façam uma aposta no que vocês não sabem no que pode dar. O povo de Itabira levará anos para pagar essa divida. Que ele [Marco Antônio] faça uso de sua afirmada qualificação em gestão com o dinheiro que a Prefeitura tem”.
“Incoerente”
Conforme Neidson, Marco Antônio já criticou, em um passado breve, um alegado endividamento da máquina pública por administrações passadas. Ao fazer uso das falas do prefeito, o emedebista rendeu a crise de relacionamento entre o Executivo e o Legislativo e foi além na provocação dos pares. “Quantos de vocês foram consultados antes do projeto chegar aqui? Quantos foram consultados sobre os projetos incluídos nesse planejamento? É mais um atropelo da participação legislativa”, reiterou. Seguido por outros governistas, Bernardo Rosa, vice-líder do governo, arguiu pelo “compromisso de fiscalização”: “Obviamente não vamos assinar um cheque em branco. Vamos fiscalizar!”.
O presidente da Câmara, Weverton “Vetão” encerrou a troca de farpas e convocou a votação nominal do projeto de lei. O que se viu foi a maior derrota sofrida pelo atual governo municipal até o momento, quando entra em seu sexto mês de atuação.