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Cfem bate R$ 4,5 bilhões em 2019, mas ainda esbarra na sonegação, diz Amig

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Compensação pela venda do minério de ferro poderia ser ainda maior, defende Amig - Foto: Divulgação

Relatório divulgado pela Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (Amig), com informações da Agência Nacional de Mineração (ANM), mostra que a arrecadação da Compensação Financeira por Exploração de Recursos Minerais (Cfem) alcançou valor recorde em 2019. Foram R$ 4,5 bilhões, valor 48,35% maior do que o país arrecadou no ano anterior (R$ 3,05 bilhões). A comparação fica ainda maior se levada em consideração a arrecadação de 2019 com os doze meses do ano de 2017, quando ainda não estava em vigência a Lei 13.540/2017, que alterou a alíquota dos royalties: diferença de 145%.

A Cfem é uma contraprestação paga à União pelo aproveitamento econômico dos recursos minerais não renováveis explorados sob regime de concessão pública. Os valores arrecadados são distribuídos entre a União (10%), o estado onde o mineral foi extraído (15%), municípios impactados e afetados pela atividade (15%) e a maior parte é destinada ao município produtor (60%).

Minério de ferro

O minério de ferro foi responsável por 76% de todo o recolhimento de Cfem no país, ou seja, dos R$ 4,5 bilhões arrecadados, cerca de R$ 3,5 bilhões são provenientes da produção desse tipo de commodity.

Quanto à produção exclusivamente de minério de ferro no Brasil, estudos realizados pela economista da Amig, Luciana Mourão, apuraram que, no ano de 2019, foram extraídos no país cerca de 416 milhões de toneladas, uma queda de quase 8% ante os 449 milhões produzidos em 2018. Essa queda é justificada pelas suspensões e paralisações de operações da Vale em 10 municípios mineiros após o rompimento da Barragem I da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), em janeiro do ano passado.

Do total produzido pelo país, aproximadamente 215 milhões de toneladas (51,6%) foram extraídos em Minas Gerais no ano de 2019, cerca de 34 milhões de toneladas a menos do extraído em 2018. Embora o volume produzido no ano de 2019 seja menor do que os dados de 2018, a Cfem deste ano apresentou crescimento no comparativo com o ano anterior.

 “A arrecadação aumentou, basicamente, por dois aspectos: a nova legislação, que mudou a base de cálculo das alíquotas, e a cotação média do minério de ferro no ano de 2019, que ficou na casa dos US$ 92, enquanto no ano de 2018 foi de US$ 70. O preço máximo da commodity chegou a US$ 120 no ano de 2019. Além disso, o dólar apresentou uma média de R$ 3,94 em 2019, enquanto em 2018 foi de R$ 3,65”, explica o consultor de Relações Institucionais e Desenvolvimento Econômico da Amig, Waldir Salvador.

Aumento aquém do ideal

Para a Amig, esses valores não refletem aumento na eficiência da fiscalização da ANM, tampouco grande incremento na produção mineral, deixando a arrecadação do país com a mineração bastante aquém do que poderia ser recolhido. Portanto, segundo a entidade, não há muito que comemorar.

Para a associação, o setor produtivo da mineração convive com uma fiscalização “totalmente ineficiente e de uma cultura permanente de sonegação endêmica por parte das mineradoras”. A Amig argumenta que, apesar do aumento constante na arrecadação nos últimos anos, o país poderia ter recebido um valor bem superior aos R$ 4,5 bilhões do último ano, “ocasionando, de forma mais justa, no incremento de desenvolvimento local dos municípios mineradores, com mais infraestrutura e geração de emprego e renda, o que é comprovado por meio de estudos técnicos”.

Na mão das empresas

Hoje, para arrecadar a Cfem, a empresa que explora recursos minerais realiza o levantamento dos valores devidos e emite, ela própria, a guia de recolhimento para repassar os recursos à União. Depois de finalizado o exercício financeiro, a empresa emite o Relatório Anual de Lavra (RAL), documento que contém informações dos quantitativos de recursos minerais extraídos, os respectivos valores e o total de Cfem recolhido. Portanto, as informações são puramente declaratórias.

Para a Amig, “é impossível que não haja risco de as informações não representarem a realidade”, necessitando acompanhamento constante e fiscalização pela ANM. O que não ocorre por falta de estrutura. Minas Gerais, por exemplo, conta com apenas três técnicos que atuam na fiscalização da Cfem.

Relatório da Gerência Regional da Controladoria-Geral da União (CGU) em Minas Gerais, com dados de 2018, aponta que, além do quadro de pessoal deficitário, há outros grandes problemas na fiscalização da mineração: a falta de sistemas, padrões e procedimentos que permitam que a operacionalização da apuração de débitos seja eficiente, integrada com outros órgãos e com segurança das informações. O documento ainda aponta a falta de efetividade dos acordos de cooperação técnica firmados pela ANM com os municípios e o governo estadual para troca de dados cadastrais de empresas mineradoras, informações econômico-fiscais e a prestação mútua de assistência, bem como a implantação de ações conjuntas no que se refere à fiscalização da Cfem.

Na visão da Amig, “a falta de estrutura dá às empresas o direito de atuarem como bem entendem e promoverem uma autorregulação”. “A estrutura da Agência reguladora simplesmente não acompanhou o setor. Nos últimos anos, observa-se a mineração triplicar em produção e exportação e, na contramão, a Agência Nacional de Mineração encolher, sendo lesada pelo governo federal, que não repassa recursos devidos por lei, e não exercendo seu papel de, não apenas fiscalizar, mas de potencializar o setor, a exemplo de outras agências como a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e a Agência Nacional de Águas (ANA)”, reclama a Amig, em nota.

Estudo feito no mês de fevereiro pela Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite) afirma que, entre os anos de 2006 e maio de 2019, foram repassados aos cofres públicos R$ 30,3 bilhões em Cfem, mas a cifra poderia ser o dobro, alcançando R$ 60,6 bilhões, caso não houvesse sonegação fiscal.

Em 2018, de acordo com a Febrafite, deveriam ser arrecadados R$ 6 bilhões, em vez de R$ 3 bilhões. O relatório produzido pela entidade aponta que é elevado o déficit de pessoal na fiscalização. “Carência observada tanto nas atividades-meio quanto nas atividades-fim. Como se não bastassem tantos problemas, há ainda a falta de cruzamento das bases de informações entre governos e instituições”, aponta o documento.

Fortalecimento da ANM é esperança

Conforme avaliação da Amig, mesmo com problemas históricos apontados, o próprio estabelecimento da ANM, que até 2017 foi o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), já é um avanço, mas ainda falta muito para se atingir um controle satisfatório sobre a atividade. Para a entidade, falta agora o governo federal fazer sua parte e não contingenciar o orçamento da Agência reguladora, previsto na Lei 13.540/2017.

“Sabemos que todas as agências têm sofrido contingenciamento de recursos; essa é a realidade do país que tenta equilibrar seu orçamento de todas as formas. Mas, no dia em que a ANM for eficiente, ganhar a atenção que ela merece do poder público e fiscalizar e regular efetivamente o setor, o valor da arrecadação da Cfem vai mais que dobrar, beneficiando estados, municípios e a União”, estima Rosiane Seabra, consultora Tributária da Amig. Ou seja, a ANM nasceu agora e se seus recursos forem contingenciados a tornarão natimorta.

A mudança do antigo DNPM para ANM criou uma autonomia legal para a Agência, institucional. Pela Lei 13.540, está estabelecido que 7% da arrecadação da Cfem devem ser destinados à ANM, ou seja, somente no exercício de 2019, quando a arrecadação dos royalties totalizou R$ 4,5 bilhões, deveriam ser repassados mais de R$ 300 milhões à Agência, o que não foi feito. “O governo federal vem descumprindo a lei desde a criação da ANM, impedindo seu crescimento e sua autonomia, na contramão de outras agências já estabelecidas”, cita a direção da Amig.

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