Nesta sexta-feira (27), termina a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla. Esse marco de conscientização levou, nos últimos dias, debates de incentivo às políticas públicas para a promoção da inclusão e combate ao preconceito e discriminação, dentre outras questões, que se manifestam no dia a dia dessas pessoas, como a empregabilidade e a mobilidade urbana, por exemplo.
No âmbito da inclusão, destaca-se nos noticiários a Lei de Cotas nº 8.213 instituída em 1991, que estabelece normas e diretrizes às empresas brasileiras, para que as oportunidades de trabalho sejam estendidas às pessoas com deficiência.
Na literatura científica, há apontamentos sobre o cumprimento desta lei, mas os relatos de pesquisadores revelam que algumas instituições contratam pessoas com deficiência “leve”, ou seja, que não necessitam de adaptações nos ambientes de trabalho para realizarem suas atividades. Isso porque os custos para a adequação à estrutura de trabalho podem não significar prioridade de investimento.
E o que é pior: há empresas que adotam o discurso inclusivo simplesmente porque cumprem a lei, que obriga a contratação de pessoas com deficiência em percentuais equivalentes ao número de funcionários registrados. Para se ter uma ideia, uma empresa que possui de 100 a 200 empregados deve disponibilizar 2% das vagas de trabalho para as pessoas com deficiência. Isso mesmo, apenas quatro vagas do total existente.
No entanto, essas vagas, na maioria dos casos, são destinadas a funções auxiliares e de serviços gerais, com baixa remuneração, e que não oferecem oportunidade de desenvolvimento e progressão profissional.
A discriminação, a baixa escolaridade das pessoas com deficiência e a falta de conhecimento das empresas sobre o verdadeiro significado de inclusão são hipóteses, que podem justificar o porquê destas funções estarem em evidência nestes casos. Mas, há quem diga que a ausência de interesse das duas partes (empregado e empregador) também contribui para o distanciamento de oportunidades. O desconhecimento das regras de acessibilidade é outro ponto em questão.
E por falar em acessibilidade, a mobilidade urbana é um assunto que costuma chamar a atenção em período de campanhas de conscientização. Este conceito propõe que as pessoas transitem com autonomia para aonde desejarem ir. Ou seja, os espaços públicos devem ser projetados de forma a permitir o deslocamento das pessoas.
Mas não é o que geralmente acontece nos grandes centros urbanos e, principalmente, em cidades históricas. Calçamentos de pedras, morros, escadarias, passeios estreitos e percursos íngremes incomodam muito a vida dos pedestres e das pessoas com deficiência.
Em alguns municípios, é fácil perceber a dificuldade que usuários de cadeiras de rodas têm ao transitar pela cidade: existem postes de iluminação, vendedores ambulantes e outros obstáculos, que impedem a passagem nas calçadas, faltam rampas de acesso nas travessias e sinalização adequada.
Se já é difícil para os usuários de cadeiras de rodas, imagine para uma pessoa com deficiência visual?
Então, o que se espera, após a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla, é que os discursos em defesa dessas pessoas se tornem ações concretas para minimizar as implicações que prejudicam esse grupo social.
É preciso deixar claro que cumprir a lei de cotas é mera obrigação. A adequação dos espaços de uso comum, de equipamentos e de maquinários é essencial para a política de inclusão, mas é necessário rever conceitos.
É papel do Estado e das empresas garantir que as pessoas com deficiência sejam incluídas no mercado de trabalho, mas é dever do cidadão fazer prevalecer o respeito e a boa convivência. Afinal, são mais de 12,7 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência, sendo que 16,9% estão em idade produtiva.
Espera-se, ainda, que a semana de conscientização sirva de gatilho para dar início às práticas de adequações nos espaços públicos, de modo que seja possível garantir acessibilidade para todos.
E, mesmo que a deficiência se apresente como uma “pedra no sapato” de muitas pessoas, a ignorância não pode ser a pedra no caminho da inclusão.
Thiago Jacques é professor universitário na Funcesi, mestre em Administração, especialista em Gestão Empresarial e Marketing e Mídias Digitais.
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