Nesta quarta-feira (4), o conselheiro Mauri Torres, 71 anos, foi eleito presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG), pela segunda vez. Torres já havia ocupado o cargo no período 2019/2021. Em fevereiro deste ano, foi substituído pelo conselheiro José Alves Viana. Cada dirigente máximo da instituição cumpre mandato de dois anos. No dia 2 de agosto, Viana renunciou por motivo de saúde.
Mauri Torres iniciou a sua trajetória política em 1990. Na ocasião, candidatou-se a deputado estadual e conseguiu se eleger. A partir daí, desenvolveu uma extensa carreira no parlamento. Inclusive ocupou a presidência da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) em duas oportunidades (2003/2004 e 2005/2006).
Foi o primeiro deputado a se reeleger para o cargo mais importante do legislativo mineiro. Mauri foi deputado estadual em seis mandatos consecutivos (ou durante 24 anos). Em 14 de julho de 2011, foi nomeado conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Depois de confirmada a sua recondução ao comando do TCE-MG — na manhã desta quarta-feira — o “novo presidente” concedeu a seguinte entrevista exclusiva à DeFato.
DeFato: Depois de cumprir um mandato regular na presidência do TCE-MG (2019/2020), o senhor passou o bastão para o seu sucessor, naturalmente. Porém, agora, depois de poucos meses, o senhor é reconduzido à direção do órgão pelos demais conselheiros. Como o senhor classifica esse inédito privilégio na história da instituição?
Mauri José Torres Duarte: Não se trata exatamente de um privilégio, mas de um momento excepcional, porque, por uma questão de saúde, o conselheiro José Alves Viana precisou se afastar do cargo para tratamento. E, nesse caso, o regimento interno prevê uma nova eleição. E como eu deixei a presidência há pouco tempo, os colegas [conselheiros] entenderam que seria mais normal eu retornar à presidência. Então, por consenso dos conselheiros, a convite deles, nós aceitamos retornar à presidência para concluirmos o mandato do conselheiro José Alves Viana, que vai até fevereiro de 2023. Então, com muita honra, de acordo com as normas e a legislação vigente, vamos tentar cumprir, com muita paciência, as atribuições da presidência do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.
DeFato: Mas no organograma do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais não existe a figura do vice-presidente?
Mauri Torres: Sim, existe a figura do vice-presidente, que é o conselheiro Gilberto Diniz, que naturalmente assumirá, após cumprirmos esse mandato do conselheiro José Alves Viana. O conselheiro Gilberto preferiu aguardar a sua natural oportunidade de assumir a presidência do TCE. Ele (Gilberto Diniz) não quis assumir um mandato tampão.
DeFato: Mas não há a possibilidade de o conselheiro José Alves Viana retornar para completar o mandato?
Mauri Torres: Não, ele não retorna, porque o afastamento dele é irrevogável, por decisão pessoal.
DeFato: O senhor tem uma carreira política curiosa e de bastante destaque, chegando inclusive à presidência da Assembleia Legislativa, em duas oportunidades. Um fato, porém, não passa despercebido: o senhor sempre foi parlamentar. Nunca tentou, por exemplo, a Prefeitura de João Monlevade, sua base eleitoral. O senhor segue a lógica “rousseauniana” (do filósofo contratualista Jean-Jacques Rousseau) de que o Legislativo é o alicerce basilar dos três poderes?
Mauri Torres: Não é que o poder Legislativo seja o mais importante dos três, mas ele é o poder que representa a democracia. Não existe democracia sem o parlamento. Então acho que o povo brasileiro tem que valorizar muito o parlamento, que é formado por representantes de cada segmento da sociedade. Então, no Congresso Nacional, há 513 deputados, que representam todos os estados e todo o povo brasileiro. O Legislativo é um poder importantíssimo. Eu entrei como candidato a deputado, na primeira eleição em que disputei. Elegi-me e continuei me elegendo na sequência (seis mandatos consecutivos). Então, não tive a oportunidade de me candidatar a prefeito. Mas, em João Monlevade, nós sempre tivemos grandes nomes para exercer o cargo de Executivo. A cidade não poderia perder o seu representante na Assembleia, já que havia pessoas em condições de fazer um bom mandato de prefeito. É por isso que, quando assumimos uma cadeira de conselheiro no TCE, lançamos Tito Torres, meu filho, como candidato a deputado estadual, para que João Monlevade e região não ficassem sem um representante no parlamento. Eu sei que isso é muito importante porque, quando fui deputado, tive a oportunidade e a honra de trabalhar com políticos itabiranos, que exerciam também a atividade legislativa, como os ex-prefeitos Luiz Menezes e Ronaldo Magalhães. E agora, temos Bernardo Mucida, que representa Itabira, com toda a sua vontade de trabalhar, com toda a postura de se fazer um bom mandato em benefício de Itabira e toda a região.
DeFato: Mas a Prefeitura de João Monlevade nunca passeou pelo seu imaginário político?
Mauri Torres: Sim, eu já pensei e tive muita vontade [de ser prefeito de João Monlevade] ao encerrar a minha vida pública. Mas, depois, convivendo com os prefeitos de João Monlevade, inclusive o meu filho mais velho [ex-prefeito Teófilo Torres], eu achei que já estava bem representado pelos meus companheiros que passaram pela Prefeitura.
DeFato: O TCE é uma instituição auxiliar do Legislativo. Logicamente, quatro conselheiros (de um total de sete) são indicação da Assembleia Legislativa. Qual é o critério preponderante para essa indicação? Ele é meramente político ou tem algo de técnico?
Mauri Torres: O critério, que é determinado pela Constituição [do estado de Minas], define que a pessoa [o conselheiro indicado] não poder ter mais de 65 anos, então tem essa limitação de idade. A pessoa precisa também ter notório saber. E um mandato parlamentar confere essa notoriedade a qualquer deputado. Então, se a pessoa preencher esses requisitos da Constituição Estadual, ela poderá disputar [tentar uma vaga de conselheiro do TCE]. E quando esse candidato disputa, ele vai depender muito de sua relação com os seus pares [os deputados], pois eles serão os eleitores.
DeFato: Até mesmo diante disso que foi dito, a gente percebe que não é fácil participar de uma disputa interna na Assembleia Legislativa. No entanto, ainda sem ter uma presença muito ostensiva na mídia estadual, o senhor surpreendentemente ganhou uma eleição para presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Qual foi a sua estratégia para chegar a esse cargo pela primeira vez?
Mauri Torres: Esse é um processo [o relacionamento interno] que você aprende na atividade parlamentar, que é conversar muito e respeitar as divergências. O mais importante nesse relacionamento interno é o entendimento do posicionamento de cada parlamentar, pois cada um deles representa um segmento da sociedade. Cada deputado tem o seu pensamento próprio e foi eleito com um objetivo. Mas, mesmo o deputado representante de uma minoria tem que ser ouvido, ele tem que ter direito à tribuna. Então, num parlamento formado por pessoas com um mesmo poder e direitos, você precisa trabalhar para convergir. Você tem que se aproximar dos diferentes e convergir para aprovar matérias. Eu sempre respeitei os colegas parlamentares e trabalhei pela convergência.
DeFato: Então, o senhor é representante da velha escola mineira de se fazer política…
Mauri Torres: Não existe outra forma [de se fazer política] a não ser ouvir a todos. Então, na época em que me elegi [presidente da ALMG] pela primeira vez, o meu nome surgiu e foi muito bem aceito pelos colegas, e fui eleito. E, na história de Minas Gerais, fui o primeiro presidente da Assembleia que foi reeleito para o cargo. A Constituição mineira foi mudada, na ocasião, para que eu pudesse ser reeleito.
DeFato: Minas Gerais tem 853 municípios. Qual o segredo para se efetuar uma fiscalização eficiente, num número tão elevado de Prefeituras. A estrutura do TCE tem capacidade para desempenhar essa função com qualidade e agilidade?
Mauri Torres: O Tribunal de Contas é um órgão auxiliar do parlamento: da Assembleia Legislativa e das Câmaras Municipais. Então, nós fazemos a fiscalização e avaliamos as contas de todos os municípios. Mas, a visita in loco só acontece quando há uma inspeção de rotina, denúncia ou representação. Agora, nós temos o escopo e avaliamos as contas de todos os municípios. Então, o processo é diferente de estados como Rio de Janeiro ou Espírito Santo, que tem apenas 90 municípios. A estrutura governamental do nosso estado é muito grande.
DeFato: Uma curiosidade bastante pertinente: o senhor foi presidente do TCE, enquanto seu filho (Teófilo Torres) era prefeito de João Monlevade. Como conciliar a condição de pai com a de conselheiro de uma instituição fiscalizadora?
Mauri Torres: Quando você tem um parente no processo [o filho prefeito], o impedimento para a fiscalização e julgamento das contas acontece naturalmente. Eu nuca participei do processo de votação das contas da administração do meu filho.
DeFato: O senhor é um político bastante experiente, com sólida liderança regional, inclusive já conquistou a notória habilidade da tradicional escola política de Minas Gerais. O ano que vem, com a sucessão presidencial, por todas as características e perspectivas, há o risco de o país mergulhar numa crise sem precedentes. No alto de sua experiência de vida e política, qual é a antevisão do senhor para o quadro institucional do próximo ano?
Mauri Torres: Aproveito para esclarecer uma situação: quando eu deixei o parlamento e vim para o Tribunal [TCE], eu me desfiliei de partido político. Essa é uma obrigação constitucional. Nenhum conselheiro pode ser filiado a um partido político. Hoje, eu não sou filiado a nenhum partido, por exigência constitucional. Então, eu posso pensar e analisar o processo político, mas evito opinar a respeito. Mas, com relação ao processo político do ano que vem, a gente torce para que tudo corra bem. Acho que não existe clima para qualquer rompimento do sistema democrático, embora isso traga preocupação. Eu acho que o povo brasileiro e as autoridades do país estão muito conscientes da importância da democracia.