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Por trás dos números

ano novo

Os números do primeiro trimestre de 2020 já saíram do forno da economia brasileira e global, e, embora assustadores, sabemos que o segundo trimestre trará um panorama ainda pior. Mas, mesmo diante dos números e da certeza da piora que virá, o mercado financeiro global precificou em maio uma melhora generalizada das expectativas e a volta do apetite do investidor pelo risco.

Vamos entender o que está acontecendo?

Em primeiro lugar, uma análise dos números sob o ponto de vista do emprego e do crescimento. Na semana passada, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou a Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (Pnad) com os dados do emprego no Brasil medidos no trimestre findo em abril. A taxa de desocupação passou de 11,2% para 12,6%, na comparação com o trimestre anterior, e ficou praticamente estável em comparação com o mesmo trimestre de 2019, quando estava em 12,5% da população economicamente ativa. Até o final de abril, 12,8 milhões de brasileiros estavam desempregados, um número 7,5% maior do que no trimestre anterior.

Segundo o IBGE, ao final de abril, a população economicamente ativa, a força de trabalho no Brasil (pessoas ocupadas e desocupadas) estava estimada em 102,1 milhões para uma população total estimada pelo próprio IBGE em 211,5 milhões de brasileiros. A população ocupada estava em 89,5 milhões, uma queda de 5,2% em relação ao trimestre anterior, quase 5 milhões de desempregados a mais. Uma queda recorde. O percentual de pessoas ocupadas na população em idade de trabalhar caiu para 51,6%, o menor percentual da série histórica que começou a ser medida em 2012.

Outros recordes tristes que deverão ser quebrados na pesquisa que será divulgada em relação ao trimestre findo em maio foi a queda histórica no número de empregados com carteira assinada, que caiu de mais de 33 milhões para 32,2 milhões. A população subutilizada, que passou de pouco mais de 25 milhões para 28,7 milhões (aqueles que gostariam de trabalhar mais do que trabalham) e o recorde histórico de 5 milhões de desalentados (aqueles que desistiram de procurar emprego). Já o emprego informal, que até o trimestre terminado em março representava 40,7% da população ocupada, caiu para 38,8% ou 34,6 milhões de trabalhadores informais, também o menor da série histórica.

Por atividade, a construção civil apresentou uma contração de 13,1%, alojamento e alimentação de 12,4%, serviços domésticos de 11,6%, comércio e reparação de veículos de 6,8%, indústria de 5,6%, transporte, armazenamento e correio de 4,9%, e outros serviços de 7,2%.

Resumo da ópera: o setor de serviços foi duramente impactado e a construção civil que vinha contribuindo muito na recuperação do crescimento da economia brasileira tomou um soco na boca do estômago, assim como os empregados domésticos, que foram demitidos como nunca antes. Quase 800 mil trabalhadores domésticos perderam o emprego. Todos estes tristes recordes sobre o ponto de vista do emprego foram gerados com praticamente 15 dias de isolamento parcial em março. A taxa de desemprego no trimestre findo em maio, que ainda será divulgada pelo IBGE, pode atingir 15% da população economicamente ativa ou mais de 15 milhões de brasileiros e, infelizmente, todos estes recordes serão quebrados novamente. E eu te pergunto, qual foi o único setor que contratou? O setor público. O IBGE não mostra aonde foram gerados os 379 mil novos empregos púbicos, mas, como cidadã, espero que a grande maioria tenha sido na área de saúde para o combate ao Covid-19.

E o PIB?

Analisados os números do emprego, vamos à análise dos números da atividade econômica. O PIB, Produto Interno Bruto, que é a soma das riquezas produzidas pelo país, teve os números divulgados na sexta. Em relação ao último trimestre de 2019 houve uma queda de 1,5%, em relação ao primeiro trimestre de 2019, a queda foi de 0,3%, e, no acumulado nos últimos 4 trimestres, o PIB brasileiro conseguiu crescer 0,9%.

Para variar, como em toda crise, o setor agropecuário deu show e cresceu 0,6% em relação ao trimestre anterior, 1,9% em relação ao mesmo período do ano passado e 1,6% nos últimos 4 trimestres.

A indústria foi fortemente impactada pelo recuo na indústria extrativa, na construção civil, na indústria automotiva e apresentou uma retração de 1,4%, 0,1% e um crescimento de 0,7% na mesma comparação trimestral. E o setor de serviços encolheu 1,6%, 0,5% e cresceu 0,9% nos últimos 4 trimestres.

O PIB tem que ser analisado pelo lado da oferta e da demanda. Pelo lado da oferta, nós acabamos de analisar, ou seja, como foi o comportamento da produção nos 3 setores da economia. Agora vamos entender como foi o consumo. Quem consome? As famílias, as empresas e o governo. O consumo das famílias apresentou uma queda de 2,0%, o consumo do governo cresceu 0,2% e o das empresas, que é conhecido pelo nome de formação bruta de capital fixo, cresceu 3,1%, em relação ao último trimestre de 2019.

Qual a leitura desses números? As famílias já estavam pisando no freio mesmo antes da pandemia e este número deve despencar no próximo trimestre; o governo, sem dinheiro em todos os níveis, União, estados e municípios, ficou praticamente no zero a zero e estes gastos devem aumentar e muito para mitigar os efeitos do COVID-19; e o dado mais positivo e mais triste: o crescimento do investimento das empresas na compra de bens de capital, ou seja, máquinas e equipamentos para aumentar a produção, para crescer. Esse consumo cresceu e muito em todas as comparações: 4,3% em relação ao mesmo período de 2019 e 3,0% nos últimos 4 trimestres. Esse crescimento vai desaparecer no segundo trimestre e vai apresentar a maior retração da história. A esperança é de que volte a crescer em 2021. As empresas que estavam efetivamente investindo no crescimento da produção, hoje fazem caixa e se endividam para se manterem vivas enquanto esperam a volta da nova normalidade que será cruel para alguns setores que vinham se destacando na retomada do crescimento brasileiro, como a construção civil, a indústria automotiva e o setor de petróleo e gás.

Juntando o tico com o teco, os empregos só voltarão a serem gerados a partir dos investimentos, em especial os privados, capazes de produzir bens e serviços, e os públicos, com juízo, em parceria com a iniciativa privada, para melhorar a produção de bens e serviços coletivos, com destaque para a infraestrutura em todas as suas dimensões: saneamento, transporte, comunicação, tecnologia e, consequentemente, investimentos capazes de melhorar a qualidade de vida de toda a população brasileira e de tornar o custo Brasil menos pesado para quem quer produzir aqui.

O que vem pela frente

Os números são assustadores e vão piorar muito no Brasil e no mundo neste segundo trimestre que termina em junho. Mas tivemos o melhor mês de maio possível para o mercado financeiro global e para o mercado brasileiro. O índice Bovespa, principal indicador de desempenho da bolsa brasileira, fechou o mês em alta de 8,57%; o dólar em queda de 1,83% em relação ao real; os juros futuros negociados na B3, nas mínimas históricas; e o risco Brasil voltando aos níveis de abril.

A Petrobrás foi ao mercado internacional buscar US$ 3,25 bilhões e teve uma demanda de mais de US$15 bilhões. Como é aquele ditado mesmo? Quem desdenha quer comprar. Com um dólar valendo 35% a mais do que o Real em um ano; com uma equipe econômica liberal, privatizante, responsável e focada na responsabilidade fiscal, apesar da pandemia; com a reforma tributária e administrativa; e, queira Deus, a política, no forno das transformações do Estado brasileiro, sairemos bem dessa crise, e seremos, com certeza, a bola da vez dos investimentos globais.

E por que que eu estou falando tudo isso? Porque os números refletem o passado e o mercado precifica as expectativas em relação ao futuro.

Vamos trabalhar, porque o mercado está comprando, Brasil!

Rita Mundim é economista, mestre em Administração e especialista em Mercado de Capitais e em Ciências Contábeis

O conteúdo expresso neste espaço é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

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