Desde 2008, com a quebra do Lehman Brothers, um dos maiores bancos de investimento dos E.U.A., que foi o gatilho da maior crise financeira do século, os governos e os bancos centrais dos países desenvolvidos, e aí vale destacar o Banco Central Americano (Federal Reserve), o Banco Central Europeu e o Banco Central Japonês, passaram a adotar políticas expansionistas na defesa da atividade econômica baseadas na diminuição da taxa de juros e na injeção de dinheiro na economia.
Quando a economia global parecia sair da crise que teve início em 2008, veio a terceira guerra mundial com um inimigo global capaz de fechar o mundo e consequentemente capaz de destruir e atingir vários setores da economia. O mundo assistiu e está assistindo novamente, em uma escala muito mais elevada , a participação e intervenção de governos e bancos centrais no sentido de prover liquidez e segurança a pessoas , empregos e empresas e porque não dizer , no sentido de salvar a economia global. A consequência imediata desses pacotes de ajuda tão necessários é o aumento da dívida dos governos.
Em paralelo ao aumento da dívida, os governos também flexibilizaram o pagamento de impostos e contribuições o que impactou negativamente na receita agravando nos países emergentes, como é o caso do Brasil , a desconfiança em relação à gestão das contas públicas e ao cumprimento do teto fiscal. Essa desconfiança tem pressionado a cotação do dólar e provocado um aumento nos juros futuros.
A alta do dólar , por sua vez, pressiona a inflação porque puxa os preços de commodities e no nosso caso específico, vivemos uma alta significativa do grupo de alimentos provocada pela disparada da cadeia da soja e do milho que puxaram as carnes e o leite , e, pela inflação do arroz em função do aumento de consumo provocado pelo aumento de dinheiro na economia com o pagamento do auxílio emergencial. E aí está desenhado um cenário desafiador para o Banco Central.
Nos últimos meses assistimos uma aceleração forte da inflação, o IPCA, índice calculado pelo IBGE que mede a inflação oficial do Brasil , em 12 meses, já registra uma inflação de quase 4% mas que ainda está abaixo do centro da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional , mas os IGPs muito mais aderentes ao comportamento do preço das matérias primas, commodities, e portanto na sua grande maioria precificadas em dólar, já apontam uma inflação de quase 25% em 12 meses, refletindo a alta de 28% do dólar em relação ao real , no mesmo período.
Resumo da ópera: o Brasil passou e tem passado por um aumento substancial da dívida pública , tem a moeda mais desvalorizada em relação ao dólar nesses 11 meses de 2020, e assiste nos últimos meses a uma aceleração da inflação com a menor taxa de juros da história. E é por isso que nós temos que falar de dominância fiscal…
O Banco Central é o executor da política monetária e tem por missão proteger a nossa moeda, o Real, do fantasma da inflação, que destrói o poder de compra do brasileiro. A principal ferramenta da política monetária é a taxa de juros, o preço do dinheiro, que quanto menor melhor para o crescimento do investimento na economia real , na produção de bens e serviços, e quanto mais alta, maior a procura por aplicações financeiras em detrimento do investimento produtivo e do consumo.
A dominância fiscal ocorre quando a política monetária do BC perde relevância diante da situação das contas públicas. A autoridade monetária fica numa encruzilhada. Se eleva os juros para conter a alta de preços, aumenta o custo da dívida e com isso aumenta ainda mais a desconfiança do mercado em relação à situação fiscal e como consequência pode pressionar o dólar que pode pressionar a inflação que pode produzir um novo aumento da taxa de juros em uma espiral de perda de credibilidade e de controle das contas públicas.
Se diante de uma elevação da inflação o Banco Central não faz nada, a inflação pode ganhar força e afetar o poder de compra da população.
Nessa situação, as ferramentas que o Banco Central tem para controlar o avanço dos preços, entre elas a Selic, perderiam potência e poderiam até mesmo provocar o efeito inverso de alimentar a inflação, dado o impacto que teriam no aumento do custo de endividamento da União.
O Brasil não vive essa situação e não precisamos de passar por isso, de novo, ainda mais agora que se compararmos a nossa situação com os países latinos e com o resto do mundo , estamos saindo com louvor da terceira guerra mundial , com o setor agropecuário bombando, as vendas ao varejo no maior nível desde o recorde de 2014, a indústria da construção civil , a automotiva e a extrativa mineral operando em níveis superiores a fevereiro, a arrecadação da receita , em termos reais, crescendo na comparação mensal com 2019 e a retomada forte na criação de empregos formais.
Só para lembrar, o PIB do terceiro trimestre deve crescer 10% e podemos fechar 2020 com uma retração muito mais próxima de 4% do que de 5%, e no início da pandemia o FMI projetava uma retração de quase 10% para o Brasil.
Parabéns para o ministério da economia , parabéns para o Banco Central e deixo aqui a minha vontade de parabenizar o quanto antes o Congresso pela aprovação da PEC Emergencial, do Pacto Federativo, da Reforma Administrativa e da Reforma Tributária tão essenciais para entregar para a sociedade brasileira a tranquilidade fiscal tão necessária rumo ao crescimento sustentável.
Rita Mundim é economista, mestre em Administração e especialista em Mercado de Capitais e em Ciências Contábeis
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