O Senado Federal aprovou na segunda-feira (29), em votação simbólica, projeto de lei que obriga planos de saúde a cobrir tratamentos que estão fora da lista obrigatória de procedimentos estabelecida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o chamado rol taxativo. O texto vai agora para sanção ou veto do presidente Jair Bolsonaro (PL).
A mudança era defendida por entidades ligadas a pacientes e grupos de pais de crianças com deficiência, que temiam negativa de cobertura para tratamentos de doenças como câncer e outras terapias. Representantes das operadores de planos de saúde, no entanto, afirmam que a alteração na lei cria insegurança aos beneficiários e pode levar a um aumento de custos das mensalidades.
O PL 2033 estabelece que a cobertura de tratamentos prescritos e que não estejam no rol da ANS deverá ser autorizada pela operadora de saúde se houver: “comprovação da eficácia”; ou recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec); ou recomendação de, no mínimo, um órgão de avaliação de tecnologias em saúde com renome internacional, “desde que sejam aprovadas também para seus nacionais”.
Se sancionada, a mudança afeta os cerca de 49 milhões de brasileiros que contam com planos de assistência médica. O projeto de lei foi pautado no Congresso Nacional após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) restringir, em junho deste ano, a cobertura de planos de saúde. Naquela época, os ministros do STJ definiram que a natureza do rol da ANS era taxativa, o que desobrigava operadoras de saúde de cobrir pedidos médicos que estivessem fora da lista.
Como fica
Antes da decisão do STJ, o rol da ANS era considerado exemplificativo em muitos processos judiciais, ou seja, a lista de procedimentos descrita pela agência era considerada um parâmetro, mas as operadoras deveriam oferecer tratamentos fora desse rol. Caso seja sancionado, o projeto aprovado nesta segunda retoma o entendimento que prevalecia antes da decisão do STJ.
“Entendemos que a votação hoje foi uma correção de algo negativo que o STJ fez semanas atrás”, disse o advogado e pesquisador do programa de Saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Matheus Falcão. Para ele, o projeto de lei, caso sancionado, dá ainda mais segurança ao consumidor porque descreve “de forma muito nítida” que os procedimentos fora da lista devem ser cobertos. “Temos uma expectativa de que agora essas situações de conflito entre operadoras e consumidores se resolvam de forma administrativa (e não judicial).” Mesmo antes da decisão do STJ era comum que consumidores tivessem de recorrer à Justiça em caso de negativa de cobertura pelas operadoras.
O advogado especialista em direito à saúde Rafael Robba avalia, ainda, que a aprovação do projeto de lei pelo Senado mantém a exigência de que os tratamentos cobertos tenham comprovação científica — ou seja, não haverá liberação geral de qualquer procedimento. “Não estamos falando de tratamentos experimentais. A lei de planos de saúde exclui tratamentos experimentais, assim como exclui tratamentos puramente estéticos”, diz Robba, do escritório Vilhena Silva.
Já a advogada Thais Cordeiro, especialista em relações de consumo, pondera que a redação do projeto de lei deixa vago o que seria considerado um tratamento com eficácia comprovada a ser coberto pelo plano de saúde.
Crítica
A FenaSaúde argumenta que a cobertura de medicamentos e procedimentos “se dará sem a análise criteriosa de um órgão de avaliação, como hoje é feito pela ANS”.
Já a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) avalia que o projeto de lei aprovado “obriga os planos de saúde no Brasil a cobrirem terapias, procedimentos e medicamentos que não foram incorporados em nenhum país, o que trará sérios riscos à segurança dos pacientes”.
Preço
A Abramge afirma, ainda, que a mudança na legislação pode levar o setor de saúde brasileiro, privado e público, a um “colapso sistêmico”. Para a FenaSaúde, a alteração aprovada nesta segunda-feira pelo Senado compromete a previsibilidade de despesas e eleva os custos em saúde – o que também deve levar ao aumento no valor das mensalidades.
“A consequência esperada desse movimento é a diminuição da oferta de planos de saúde, saída em massa de beneficiários do sistema suplementar e maior sobrecarga para o SUS”, avalia a FenaSaúde, por meio de nota.