17 cidades mineiras devem perder receita após reforma tributária

A unificação de cinco impostos em somente um pode terminar com a guerra tributária entre União, Estados e municípios

17 cidades mineiras devem perder receita após reforma tributária
Deputados na sessão do Plenário que aprovou a primeira parte da reforma tributária – Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Após 60 anos, a reforma tributária passa por uma mudança significativa em sua redação, por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que tramita no Congresso Nacional, com o objetivo de simplificar o sistema de cobrança de impostos, denominado por alguns de “manicômio” ou “pandemônio” fiscal.

A unificação de cinco impostos em somente um pode terminar com a guerra tributária entre União, Estados e municípios na retenção dos valores obtidos com os impostos sobre consumo de produtos e serviços. O Imposto Sobre Serviços (ISS), que é municipal, será unificado ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é estadual, para a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

Levantamento realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a pedido da Confederação Nacional de Municípios (CNM), demonstra que cerca de 98% dos municípios brasileiros devem melhorar suas arrecadações aos longo de 20 anos do novo modelo de tributação. O estudo demonstra que a tendência de alta é observada nacionalmente, inclusive em Minas Gerais.

No entanto, estimativas do Ipea, a partir do texto-base aprovado em junho na Câmara dos Deputados, indicam que ao menos 17, dos 853 municípios mineiros, podem perder arrecadação. A nova redação da PEC está agora sob avaliação do Senado e pode sofrer alterações.

O professor de direito tributário do Ibmec-BH, Bernardo Motta Moreira, sugere cautela sobre o assunto. Para ele, “as projeções só serão consolidadas se houver um crescimento econômico mais acelerado, mas é arriscado apostar nisso, ainda mais diante de um texto legislativo que já sofreu tantas alterações. O próprio estudo mostra que, no cenário em que a reforma não gera crescimento econômico adicional, cerca de 16% dos municípios acumulariam em 20 anos uma receita menor do que na hipótese de não realização da reforma”.

Marcos Vinicius Bizarro, presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM) e prefeito de Coronel Fabriciano, acredita que a reforma vai trazer impactos positivos, mas ressalta que 17 municípios mineiros podem, embora não necessariamente, ter queda na arrecadação.

Bizarro salienta que, “mesmo tendo perda de receita, a prefeitura pode recorrer ao fundo compensador, que é previsto para garantir que, durante a fase de transição, os municípios não fiquem desamparados”.

Faltam definir detalhes sobre esse fundo reparador, que será constituído e distribuídos nos casos em que houver demanda. Esses detalhes precisam ser debatidos e aprovados na forma de leis complementares. A PEC prevê a criação do Conselho Federativo para centralizar a arrecadação de Estados e municípios e normatizar o tributo.

Para o professor e advogado, Bernardo Motta Moreira, “em razão da queda de arrecadação que pode ser causada pela tributação no destino da mercadoria ou serviço e de alíquotas diferenciadas, o conselho fará uma redistribuição do que foi arrecadado durante a transição”.

Para alguns prefeitos das 17 prefeituras apontadas pelo Ipea que podem perder receita, a reforma tributária ainda é uma incógnita.

É o caso do prefeito de Cachoeira Dourada, Aleandro Francisco da Silva (Progressistas), que afirmou que os dados estão sendo estudados e, por isso, ainda não é possível falar sobre números, mas acentuou “que há uma articulação entre entidades representativas dos municípios que pretendem ir a Brasília, em agosto, com o objetivo de buscar alternativas para eventuais perdas”.

O prefeito de São Gonçalo do Rio Abaixo, Raimundo Nonato Barcelos, o Nozinho (PDT), disse que quem está tratando dessa questão em nome dele é a Associação de Municípios Mineradores de Minas Gerais (Amig). A Frente Nacional de Prefeitos (FNP) demonstra receio com a unificação dos impostos dos Estados com os municípios e, por meio de nota, a entidade declarou que: “O novo modelo tributário que unifica ICMS e ISS preocupa prefeitas e prefeitos das médias e grandes cidades”.

Em 2022, por exemplo, o ISS representou 45% das receitas desses municípios. “Para 145 cidades onde vive um terço da população, é a primeira ou a segunda fonte de recursos”.

A FNP disse que vai atuar junto ao Senado para que o texto da PEC assegure receitas próprias aos municípios, “já que depender da transferência de recursos de outros entes geraria insegurança de planejamento e interferiria na autonomia das prefeituras”.

O economista e professor do curso de Gestão do Uni-BH, Fernando Sette Júnior, explica que o sistema de arrecadação existente no Brasil prevê a tributação na origem, quando os impostos são devidos ao Estado e município onde o produto é fabricado ou onde o prestador de serviço reside. “Por esse motivo, grandes centros como São Paulo, por exemplo, concentram grande parte das riquezas geradas no País. Além disso, com a intenção de atrair investimentos, muitos governos concedem isenções fiscais a grandes empresas. Para compensar essas perdas, ampliam a incidência de tributos sobre itens consumidos por grande parte da população, o que leva ao aumento das desigualdades”.

A reforma tributária visa corrigir essas distorções, com a tributação sendo feita no destino, quando os impostos vão para os cofres locais, onde os produtos e serviços são consumidos. “Desta forma, a arrecadação será mais proporcional ao número de habitantes das cidades e dos Estados”, finaliza Sette Júnior.