“Presença de água na cava agrava a situação”, avalia especialista da Unifei sobre talude que pode ruir em mina de Barão de Cocais
O doutor em Geotecnica Nima Rostami Alkhorshid, professor do campus de Itabira da Unifei (universidade Federal de Itajubá), traça prognósticos preocupantes em relação aos efeitos do desprendimento do talude na cava da mina de Gongo Soco, em Barão de Cocais, na barragem Sul Superior, que já se encontra em risco máximo de alerta de rompimento: […]
O doutor em Geotecnica Nima Rostami Alkhorshid, professor do campus de Itabira da Unifei (universidade Federal de Itajubá), traça prognósticos preocupantes em relação aos efeitos do desprendimento do talude na cava da mina de Gongo Soco, em Barão de Cocais, na barragem Sul Superior, que já se encontra em risco máximo de alerta de rompimento: nível 3. O especialista ressalta como o maior agravante a existência de água na cava da mina. Nima Rostami é iraniano, graduado em engenharia pela Azad Shoushtar University (2007), mestre em Engenharia Civil (Geotecnia) pela Eastern Mediterranean University (2012) e doutor em Geotecnia pela Universidade de Brasília (2017). Confira abaixo a entrevista concedida à reportagem da DeFato Online.
Qual é o impacto geral de um rompimento de talude?
Geralmente, os deslizamentos de terra podem ser considerados um grande risco em regiões de configuração geológica mais acidentadas. Seu impacto depende muito de sua velocidade e tamanho, dos elementos que poderiam estar em seu caminho e da vulnerabilidade desses elementos. Grandes deslizamentos de terra, se acompanhados por água, podem resultar em enorme erosão e causar inundação no vale a montante, podendo ser subsequentemente violados pela pressão da água do lago, gerando assim inundações repentinas mortais ou fluxos de detritos a jusante. Os deslizamentos de terra também podem influenciar as pontas de resíduos de mina e as barragens de rejeitos e aterros sanitários, causando fatalidades e contaminando os solos e as águas superficiais e subterrâneas.
Como a barragem Sul Superior está em alerta de nível 3 para possível rompimento e a mina onde o talude se desprende está a 1,5 km dela, considerando que a cava ainda tem água, as medidas de precaução devem considerar o pior cenário?
Infelizmente, podemos considerá-lo como o pior cenário possível, porque, se a água não estivesse envolvida nesse rompimento, poderia ser melhor, pois o rompimento pode empurrar a água para produzir poropressão e diminuir as tensões efetivas dentro da massa do solo. Em outras palavras, a água pode lubrificar as partículas do solo e diminuir o atrito entre elas e transformar o solo em um fluido que pode ser muito mais fácil para as consequências do rompimento atingir a barragem Sul Superior. Se chegar à barragem, encontrará um potencial mais devastador para fazer grandes inundações de lama.
A vale chegou a definir um prazo para o desprendimento do talude. De acordo com a sua visão, é possível prever essa ação?
De fato, os solos, em geral, não são capazes de sustentar as forças de tração. É por isso que a gravidade é capaz de causar erosão, especificamente quando os solos sofrem de erosão interna devido ao escoamento da água dentro de seus vazios. Assim, como sabemos o comportamento dos solos nos taludes e utilizando GPS para monitorar os movimentos do solo, podemos prever o rompimento do talude.
No caso do talude que está na mina da vale, o tamanho é de 10 milhões de metros cúbicos de toneladas e o peso de 20 milhões de toneladas. É um tamanho normal, grande ou pequeno para o tipo de estrutura?
Geralmente é um tamanho normal.
Já existe um estudo de casos para lidar com essa situação?
Geralmente, é muito difícil lidar com deslizamentos de terra nas minas a céu aberto porque, dependendo do tamanho e da velocidade, não haverá muito tempo para fazer alguma estrutura de contenção para reduzir seu impacto nas estruturas vulneráveis próximas, como barragens de terra. Os deslizamentos de terra pioram com o seu acesso à água porque a água faz com que as partículas sólidas mudem seu estado de sólido para líquido e se movam como um fluido viscoso e devastem qualquer estrutura e vida em seu caminho. A única opção que poderia ajudar nesses casos é limitar o impacto e o acesso do deslizamento a qualquer fonte de água nas proximidades. Existem vários estudos de caso considerando o deslizamento de terra e seus efeitos, mas cada caso tem sua própria natureza e circunstâncias para lidar. Ao longo das últimas décadas tem havido vários estudos e simulações que contribuíram muito para o nosso conhecimento na compreensão da estabilidade de taludes.
Esse tipo de rompimento já aconteceu antes? É algo comum?
Em 10 de abril de 2013, um deslizamento ocorreu na Mina de Bingham Canyon, no estado de Utah, Estados Unidos. Cerca de 65 × 106 m3 de terra e rochas deslizaram pela lateral da cava. Neste rompimento não havia nenhuma fonte de água ou barragem de terra para escalar o seu poder devastador. Não é comum que ocorram tais rompimentos, mas ainda em regiões que estão sob efeitos de fortes chuvas, pode ocorrer o acúmulo de água nas camadas do solo no topo da cava. Essa água acumulada iria infiltrar-se nos vazios do solo e causar erosão interna e, consequentemente, o rompimento de talude.