Prefeitura anula cessão de terrenos, surpreende empresários e cria temor por desemprego em Itabira

O assunto foi trazido à tona na reunião ordinária da Câmara. O governo municipal cancelou a concessão de áreas para 15 empresas da cidade, em processo homologado na gestão anterior. Vereadores cobram esclarecimentos.

Prefeitura anula cessão de terrenos, surpreende empresários e cria temor por desemprego em Itabira
O chamamento público disponibilizou áreas produtivas no Distrito Industrial e outros bairros. Foto: Igor Procópio
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Quinze empresas de Itabira perderam o direito de uso de terrenos cedidos pela Prefeitura. A anulação dos contratos foi publicada pelo governo municipal na sexta-feira (12) e empresários afirmam serem pegos de surpresa: a notícia chegou através de ofício, sem esclarecimentos maiores. Segundo afirmam, a decisão engessa negócios já prejudicados pela pandemia e coloca em xeque o emprego de centenas de trabalhadores.

Trata-se do chamamento público 2/2020, homologado pelo ex-prefeito Ronaldo Magalhães (PTB) em dezembro. O processo concedeu áreas industriais e produtivas no Distrito Industrial e nos bairros Fênix, Novo Amazonas, Major Lage, Colina da Praia, Pedreira e Candidópolis. A licitação contemplou as empresas Kitorresmo, Agile, Odontoserv, Superconstru, Transfigueiredo, Nitronel, HR Domínio, Ferraço, Engemec, Avelândia, Engeter, Construtora Linhares, Lemaq, Itacoop e A.P.S Duarte Serviços e Locações.

O extrato do aviso de anulação consta na página 4 do caderno “Primeiro Plano”, no jornal Hoje em Dia de 12 de março. O documento é assinado por Breno Carvalho Lage Pires, secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia, Inovação e Turismo (SMDECTIT). De acordo com o extrato, a anulação se baseia nos termos do artigo 49, da Lei 8.666/93, que versa sobre ilegalidade no procedimento.

O Grupo DeFato procurou a Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Itabira ainda nessa terça-feira (16). Até a publicação desta reportagem, o governo não explicou o porquê da anulação dos contratos.

“O governo deveria ter nos chamado para o diálogo”

Entre as empresas atingidas está a M2 Ferraço, que soma 85 funcionários em seu grupo empresarial e tem planos de chegar a 120 colaboradores com a expansão do negócio. Neste momento, os planos estão sobre a mesa e a direção pensa no que fazer.

Arthur Maciel, sócio-proprietário, conta que a empresa vem passando por desafios imobiliários no bairro Praia, onde tem sede: parte das áreas que ocupa é alugada e seu proprietário tem outros projetos para os imóveis. A expectativa de Arthur estava na expansão para o Distrito Industrial, já que a empresa dele conquistou no local a cessão de um terreno de aproximadamente 2 mil m².

“Nós concorremos, fizemos um plano de negócios e de investimentos. Definimos o crescimento da empresa. Ficamos assustados com a notícia! O novo governo transmitiu uma mensagem que prezaria pelo desenvolvimento de Itabira. Agora, ao invés da expansão, a Ferraço pode ser obrigada a enxugar”, lamentou o empresário.

Prefeitura anula cessão de terrenos, surpreende empresários e cria temor por desemprego em Itabira
Entre as empresas contempladas no chamamento está a Ferraço, consolidada na cidade. Foto: Igor Procópio/Arquivo DeFato

Outros empresários também relataram surpresa e consternação. “Participamos do processo de chamamento, muito transparente à época e acreditamos que todo o procedimento estava legal. Se existem irregularidades, o governo deveria ter nos chamado para o diálogo e não enviar uma decisão por ofício, sem deixar claro o que está acontecendo”, contou um empreendedor que optou por não se identificar, temendo represálias.

As empresas foram informadas que o prazo para a assinatura do distrato, ou seja, do encerramento dos contratos de cessão, ocorre até 23 de março, terça-feira. Por telefone, parte dos representantes ouvidos pela reportagem disseram ter acionado seus advogados, já que a legislação prevê os princípios constitucionais da ampla defesa e contraditório.

Vereadores cobram posicionamento

O cancelamento da concessão foi assunto na reunião ordinária dessa terça-feira (16). A Comissão de Indústria, Comércio, Turismo e Desenvolvimento Agrário remeteu ofício ao secretário Breno Pires pedindo esclarecimentos. O colegiado é presidido por Rodrigo Alexandre Assis Silva – “Diguerê” (PTB) -, tem como relator Bernardo de Souza Rosa (Avante) e, na posição de vogal, Neidson Dias Freitas (MDB).

O ofício pede a descrição das irregularidades identificadas pelo município – e se há dano ao erário público -, além dos documentos comprobatórios. Questiona também se foi garantido o direito de ampla defesa aos empresários e pede a prorrogação do prazo de distrato definido para terça-feira (23). O documento foi protocolado ontem (16), de forma presencial.

“São empresários que apresentaram planos de negócios viáveis para gerar emprego e renda em Itabira; são empresários que têm atividades consolidadas no município. O objetivo da comissão é buscar o diálogo e entender se há um problema e como podemos sanar. Conto com o apoio da Casa para lutarmos por uma classe que gera emprego à cidade”, argumentou Rodrigo Diguerê, durante a palavra aberta da reunião ordinária virtual.

Neidson critica ausência de diálogo

Procurado por empresários prejudicados pela anulação, o vereador Neidson Freitas endureceu as críticas ao governo municipal. O emedebista pediu diálogo à equipe do prefeito Marco Antônio Lage, uma vez que o cancelamento do chamamento público não foi informado à Câmara.

“Para haver diálogo é preciso ter duas vias de comunicação. Nós recebemos a notícia com muito espanto. São empresas que simplesmente receberam uma carta comunicando que estava totalmente suspenso o ato que lhe deram condições de crescerem e investir. Ouvimos tanto na campanha [política] sobre a diversificação econômica, sobre Itabira fortalecer suas empresas e, com menos de 100 dias de gestão, temos mais uma ação sendo desfeita”, discursou o parlamentar.

Prefeitura anula cessão de terrenos, surpreende empresários e cria temor por desemprego em Itabira
Vereador lamentou diálogo unilateral do Executivo com a Câmara. Foto: Reprodução/Google Meet

Neidson frisou que se há vícios no chamamento público, até então não informados, a Câmara deve convocar, inclusive, o ex-titular da SMDECTIT, José Don Carlos Alves Santos, para ser ouvido.

Itabira pode perder empresas para São Gonçalo, adverte Bernardo Rosa

O vice-líder do governo na Câmara, Bernardo Rosa, relatou ter acompanhado o secretário Breno Pires em visita ao Distrito Industrial e, “do que pôde observar, em princípio, há problemas pequenos a serem sanados, sem a necessidade de cancelar todo o processo licitatório”.

Na avaliação do parlamentar, a anulação do processo gera um efeito em cadeia. Entre as empresas, há terciários da mineradora Vale que, para não perderem o contrato para concorrentes, podem migrar para São Gonçalo do Rio Abaixo, cidade vizinha.

“A maioria deles tem prazo para iniciar as obras de expansão, pois tem prazos a cumprir dentro da Vale. Se eles não iniciarem as obras, podem ir para São Gonçalo. Temos que fazer todo o possível para manter esses empresários em Itabira. Não podemos perder mais”, contrapôs o também presidente da 52ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Há perseguição?

O presidente da Câmara, Weverton Vetão (PSB), endossou os discursos dos colegas e cobrou uma resposta rápida do governo municipal. “Se não tiver apoio do Poder Executivo para com os empresários, nós teremos o aumento nas demandas da Assistência Social [em função dos desempregados e dos prejuízos trazidos pela pandemia de Covid-19] e nas demais demandas do poder público. Eu não quero acreditar que estamos vivenciando todos esses problemas, ou que a Prefeitura tome medidas de perseguição a empresários”.