Depois da pandemia vem o pandemônio
Clima político do país tende a ficar ainda mais tenso, trazendo preocupação para 2022, ano de eleições
A pandemia do novo coronavírus mostra sinais de desaceleração. Casos de mortes e contágios diminuíram. Os números coincidem com o aumento do universo de pessoas vacinadas. Esse panorama – a princípio- é um alento. Mas essa nova realidade não faz acender a luz verde do isolamento social. Afinal, o imponderável ronda a área, pois misteriosa incógnita entrou na macabra equação: a variante Delta. Até então, é muito difícil compreender claramente o comportamento dessa transmutação do vírus.
Ainda assim, o panorama para o futuro deixa no ar um quê de esperança em dias melhores. É apenas uma torcida pessoal. Afinal, o mercado da bruxaria ainda não produziu uma bola de cristal totalmente confiável. E ninguém aqui é pitonisa. Os recentes acontecimentos, porém, sinalizam para duas perspectivas contraditórias para os 365 dias vindouros. A primeira, alvissareira. A outra, pelo contrário, é extremamente tóxica.
A configuração atual é de engenho de fogo morto. A disseminação da Covid-19 foi o arcabouço de grave crise social, econômica, humanitária e política. É muito sério. O Brasil, hoje em dia, conta com um contingente de 14 milhões de desempregados. A esse montante soma-se a multidão que simplesmente desistiu de retornar ao mercado do trabalho. É a horda dos sem-esperança.
Apesar desse cenário adverso, a economia mostra leves indícios de reação. Então, tudo poderia ser bem mais promissor para 2022. Dois aspectos relevantes justificam esse meio otimismo: a encrenca sanitária estaria aparentemente sob controle e os indicadores econômicos em recuperação- com ligeiro crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).
Mas um complicador de altíssimo risco tem potencial para lançar tudo num imenso lamaçal: a polarização política. A disputa para a presidência da república terá componentes trágicos, em todos os aspectos. E pior. O Estado Nacional mergulhará na maior tribulação da sua história. O processo eleitoral do próximo ano envolverá os três poderes num confronto de consequências imprevisíveis. E aí começará o pandemônio. O visível na linha do horizonte não é nada animador, até mesmo porque rima com desesperador: confrontos de ruas, quebradeiras (em espaços público e privado), pancadarias generalizadas (brigas entre facções) e consequente derramamento de sangue.
Esse drama começa na instabilidade de agora. Nesse cenário apocalíptico, o melhor seria o aparecimento de um candidato mais competitivo na chamada terceira via. Mas, note-se. É pouco provável que isso aconteça. Esse personagem – praticamente messiânico – seria a mola amortecedora do radical embate entre Lula da Silva e Jair Bolsonaro. O ambiente sofreria uma distensão. Mas caso essa circunstância não ocorra, há iminente ameaça de ruptura do jogo democrático. Alguns segmentos das forças armadas já admitem uma interferência no sistema. Essa alternativa atende pelo singelo nome de golpe de estado.
E o golpe não é portador de boas notícias. O Brasil é um ator muito importante na geopolítica, por alguns fatores impactantes: o meio ambiente, riquezas naturais, demografia, extensão geográfica, economia e inquestionável liderança regional. A pátria tupiniquim – uma potência local – levaria a América do Sul a reboque num possível naufrágio institucional.
Então – até mesmo por essas circunstâncias – um colapso no establishment interno provocará fortes sanções do Sistema Internacional (SI). Primeira delas: dura retaliação econômica (ou boicote). O bananal ficaria praticamente isolado nas relações interestatais. O cenário é desanimador. Juntem–se, num mesmo efervescente caldeirão – grave crise política, violência urbana, caos socioeconômico e gelo planetário. Essa é a tempestade mais que perfeita.
Há data e movimentação determinantes para o avanço ou retrocesso da escalada da tensão. As manifestações de 7 de setembro serão os mais claros indicativos das tendências de amanhã. A data comemorativa da independência emitirá a primeira sinalização para 2022. O “dia da pátria” se transformará no Rubicão das próximas páginas da história do país.
Os homens públicos brasileiros necessitarão muito equilíbrio, serenidade, sensatez, responsabilidade e firmeza para colocar um ponto final no impasse institucional. Esses são os mais eficientes antídotos contra a bancarrota. Repito: equilíbrio, serenidade, sensatez, responsabilidade e firmeza.
Os políticos desse pedaço do globo terrestre têm duas escolhas capitais para as suas biografias: ou serão os grandes avalistas de uma tragédia ou passarão à história como paladinos da paz. Não peçam uma intervenção divina para a resolução desse problema meramente mundano. O futuro é uma construção exclusiva do livre arbítrio.
Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.
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