Entenda porque os professores municipais de Itabira declararam estado de greve

De um lado, o Executivo Municipal propõe um pagamento proporcional às horas trabalhadas; do outro, professores querem o pagamento integral do piso salarial da categoria

Entenda porque os professores municipais de Itabira declararam estado de greve
Os professores realizaram uma assembleia em frente à Prefeitura de Itabira, onde declararam o estado de greve – Foto: Gustavo Linhares/DeFato
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Na noite da última terça-feira (5), os professores da rede municipal de ensino de Itabira decidiram por declarar estado de greve após negociações frustradas para que a Prefeitura de Itabira pague o piso salarial para a categoria conforme estabelece o governo federal. De um lado, o Executivo Municipal propõe um pagamento proporcional às horas trabalhadas; do outro, servidores da Educação querem o pagamento integral do valor — estipulado, em fevereiro deste ano, em R$ 3.845,63.

Negociações

Em 2022, foram realizadas ao menos duas rodadas de negociações entre representantes da Prefeitura de Itabira, comissão do magistério e Sindicato dos Trabalhadores e Servidores Públicos Municipais de Itabira (Sintsepmi).

Na primeira reunião, o Executivo Municipal propôs o pagamento do piso salarial proporcional — levando em consideração 30 horas trabalhadas — no valor de R$ 2.884,22. Os professores fizeram uma contraproposta pedindo a aplicação de 33,23% (índice de reajuste concedido pelo governo federal sobre o piso salarial da categoria) no salário inicial de carreira, que é de R$ 2.579,29, o que totaliza vencimentos na ordem de R$ 3.436,38.

Além disso, essa remuneração seria praticada até o governo municipal apresentar o novo Plano de Cargos e Carreiras para o funcionalismo do Município, quando os vencimentos seriam adequados ao piso nacional atual, de R$ 3.845,63. O encontro terminou sem entendimento entre as partes.

Já na segunda reunião, o governo Marco Antônio Lage propôs, novamente, o piso proporcional de R$ 2.884,22, dessa vez retroativo a janeiro de 2022. Somado a isso, seria antecipado o índice de 5% resultantes de uma ação judicial vencida pelo Sintsepmi e que obriga a Prefeitura de Itabira a conceder reposição salarial referente ao ano de 2016 — último ano da gestão Damon Lázaro de Sena.

Essa reposição salarial determinada pela Justiça beneficia todos os servidores do Município e, em 2021, o governo Marco Antônio Lage escalonou esse pagamento, com parcelas previstas para julho (2,5%) e dezembro (2,5%) deste ano. Essas duas parcelas é que seriam antecipadas nessa negociação. Dessa forma, somando o piso proporcional e a antecipação dos reajustes determinados pela Justiça, o piso salarial pago em Itabira chegaria a R$ 3.035,05 — conforme divulgado pelo Executivo Municipal na última terça-feira.

Essa proposta também foi rejeitada pela categoria. Mesmo assim, o governo Marco Antônio Lage informou, por meio de suas redes sociais e de release enviado à imprensa, que encaminharia um projeto de lei para a Câmara de Vereadores estabelecendo em R$ 3.035,05 os vencimentos da categoria.

Embora os servidores da Educação aguardassem uma nova rodada de negociação para a próxima sexta-feira (8), às 16h, a manobra da Prefeitura de Itabira deu a entender que as negociações estavam encerradas. Diante disso, em assembleia, os professores da rede municipal de ensino decidiram pelo estado de greve — que pode levar a uma paralisação nas escolas do Município a partir da próxima segunda-feira (11).

“Essa questão [encerrar as negociações com reunião marcada para sexta-feira] é considerado um desrespeito com o servidor. Nós temos sentado à mesa, tem discutido com o governo, demos prazo e era para o governo estar pagando o aumento do piso salarial desde fevereiro, ele não está pagando e dando prejuízo para a gente nesses meses — mas ele promete pagar o retroativo, tudo bem, mas o governo não se moveu enquanto começamos a discutir com ele a situação e a demostrar a situação do servidor. Mas quando ele vai à mídia e coloca, anterior a negociação, que já está terminado e os valores são de R$ 3.035,05, é um desrespeito com quem está negociando. Então esperávamos do governo no mínimo respeito, o que ele não teve nem com o sindicato da categoria e nem com a comissão que representa os servidores”, relatou Giovane Magno Lopes, de 48 anos, professor de história na rede municipal de ensino e um dos representantes do servidores da Educação.

Entenda porque os professores municipais de Itabira declararam estado de greve
Professores aprovaram o estado de greve na última terça-feira. Paralisações podem acontecer já na segunda-feira – Foto: Gustavo Linhares/DeFato

Comparativo histórico

Segundo um levantamento realizado pelos professores da rede municipal de ensino, a Prefeitura de Itabira chegou a pagar valores acima do piso nacional do magistério. Porém, com o passar dos anos, o valor pago pelo Município não acompanhou a evolução do piso nacional — causando uma defasagem nos vencimentos dos trabalhadores da Educação.

De acordo com esse levantamento, o piso nacional cresceu 304,8% entre 2009 a 2022. Já o piso salarial pago pelo Município aumentou apenas 96,5% no mesmo período. Já a inflação, no mesmo intervalo de tempo, evoluiu 108,9%.

Se levarmos em consideração o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) de Itabira, que são repasses federais voltados para a Educação e que podem ser usados para custear os salários dos professores municipais, o crescimento foi de 246,6% entre 2009 e 2022.

“Sabemos que a Prefeitura tem condições de pagar, que pode pagar de acordo com os valores do Fundeb. Sem contar os valores de repasse do município que, hoje, a Lei de Diretrizes Orçamentárias [LDO], aprovada no ano passado, estabeleceu R$ 108 milhões para a Educação. Se o governo dá esse reajuste para a gente, a folha de pagamento do magistério não chega a R$ 70 milhões. Então está sobrando aí cerca de R$ 40 milhões [em relação aos valores da LDO, sem contar o Fundeb] dos valores que a Prefeitura tem que gastar com Educação no Município de Itabira”, afirmou Giovane Lopes.

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Giovane Lopes é uma das lideranças dos professores municipais – Foto: Gustavo Linhares/DeFato

O que diz a legislação?

De acordo com a lei federal nº 11.738/2008, “o piso salarial profissional nacional [dos profissionais da educação básica] é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das carreiras do magistério público da educação básica, para a jornada de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais”.

Em fevereiro deste ano, o governo federal publicou uma portaria estabelecendo um reajuste de 33,24% no piso salarial nacional para os profissionais do magistério público da educação básica — elevando os vencimentos da categoria para R$ 3.845,63. “O piso nacional da categoria é o valor mínimo que deve ser pago aos professores do magistério público da educação básica, em início de carreira, para a jornada de no máximo 40 horas semanais. A Lei 11.738 de 2008, que institui o piso, estabelece que os reajustes devem ocorrer a cada ano, em janeiro”, diz trecho de uma publicação no site oficial da União.

Além disso, conforme a lei estadual 21.710/2015, “o piso salarial profissional nacional previsto na lei federal será assegurado integralmente ao servidor ocupante do cargo de Professor de Educação Básica com carga horária de 24 horas semanais”.

O que diz a Prefeitura de Itabira?

No início da tarde de terça-feira, a assessoria de comunicação do Executivo distribuiu para a imprensa um release com o seu posicionamento sobre a negociação com os professores municipais. No comunicado, também falou sobre o processo de negociação com a categoria. Confira na íntegra:

“A Prefeitura de Itabira apresentou ao Sindicato dos Trabalhadores e Servidores Públicos Municipais de Itabira (Sintsepmi) a proposta final para o reajuste dos professores da rede municipal. O Executivo ofereceu o pagamento de R$ 3.035,05, o que corresponde a 5,23% acima do piso para 30 horas semanais, que é a carga horária dos profissionais da rede pública local. O projeto é preparado para envio à Câmara de Vereadores.

A portaria nº 67/2022, do Governo Federal, estipulou o piso salarial dos professores no Brasil em R$ 3.845,63, mas para uma carga horária de 40 horas semanais. Em Itabira, os profissionais da rede municipal trabalham 30 horas semanais. Assim, o piso proporcional para essa jornada seria de R$ 2.884,01, valor inferior ao que é oferecido pela Prefeitura ao magistério.

Quando assumiu a Prefeitura de Itabira, a atual gestão encontrou o salário dos professores municipais estipulado em R$ 2.313,72. O reajuste para R$ 3.035,05, como é proposto agora pela equipe econômica significa um aumento de 31,17% na remuneração do magistrado em pouco mais de um ano de administração. A título de comparação, entre 2017 e 2020, o salário dos professores foi reajustado de R$ 2.097,67 para R$ 2.313,72, o que equivale a 10,3% em quatro anos.

‘Estamos fazendo um esforço grande para atingir esse valor do piso, que estará até mesmo acima da projeção de arrecadação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica). Teremos que colocar recursos próprios da Prefeitura ao longo do ano para pagamento da folha do magistério. Acreditamos que é uma manifestação de valorização por parte do Executivo, que não para por aqui, tendo em vista também a elaboração do Estatuto e Plano de Cargos e Carreiras do Magistério Público de Itabira, que está sendo trabalhado e vai propor mudanças’, explica a secretária municipal de Planejamento, Patrícia Guerra.

Segundo a Secretaria Municipal de Fazenda, a previsão de arrecadação do município com o Fundeb em 2022, atualizada em março, é de R$ 58,6 milhões, enquanto a projeção da folha, com o reajuste, é de R$ 71,5 milhões. A Prefeitura, então, terá que completar o pagamento em R$ 12,8 milhões, o que corresponde a 18% de toda a folha anual do magistério municipal.

O reajuste salarial vai beneficiar diretamente 895 professores da rede municipal, entre efetivos e contratados. Mas já é planejada entre as secretarias de Administração e Educação a contratação de mais profissionais ao longo do ano, além do Plano de Cargos e Salários, que será construído em 2022.

‘Está claro para nós que há a necessidade de aumentar o nosso quadro profissional, ainda mais quando observados os projetos robustos que são preparados, inclusive com adoção do ensino integral em unidades escolares. Quando falamos em transformar a Educação Municipal, logicamente estamos falando em uma política de valorização salarial, mas estamos falando também sobre adoção de novos métodos, uma nova concepção pedagógica, ações de qualificação e de tecnologia. Também há o aspecto físico das escolas, todas serão reformadas. São muitos os investimentos já em execução e programados para curto prazo. Então, fizemos este esforço com muita responsabilidade com as contas públicas’, afirma a secretária municipal de Educação, Laura Souza”.