Em meio a críticas à Vale, AMIG lança versão moderna de livro histórico

“A concessão Itabira Iron – A origem da Vale e os primórdios da indústria da mineração no Brasil” foi publicado em 1934 e conta a história da mineração em Itabira

Em meio a críticas à Vale, AMIG lança versão moderna de livro histórico
Zé Fernando, presidente da AMIG, com o livro em mãos. Foto: Victor Eduardo/DeFato Online

Em um evento realizado nesta quinta-feira (1º), na Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade (FCCDA), a Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (AMIG) lançou a versão fac-símile do livro “A concessão Itabira Iron – A origem da Vale e os primórdios da indústria da mineração no Brasil”. A entidade – presidida pelo atual prefeito de Conceição do Mato Dentro, José Fernando Aparecido de Oliveira “Zé Fernando” (MDB) – financiou a edição remodelada do livro lançado originalmente em 1934 e escrito por Clodomiro Augusto de Oliveira, professor e diretor da Escola de Minas de Ouro Preto no biênio 1930/31.

Além do líder do executivo conceicionense, também participaram do evento o prefeito de Itabira, Marco Antônio Lage (PSB), o prefeito de Ouro Preto, Ângelo Oswaldo (PV), o consultor de Relações Institucionais e Econômicas da entidade, Waldir Salvador, e outras figuras importantes. Iniciado com grande atraso, já que Zé Fernando encontrou problemas na estrada durante a viagem, o encontro apresentou um tom bastante crítico, principalmente à Vale.

Boa parte dos discursos exigiu uma postura mais responsável da mineradora e o pagamento de uma multa bilionária, de R$ 2,2 bi, da empresa junto à AMIG, em um processo que se arrasta há aproximadamente 17 anos.

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Foto: Victor Eduardo/DeFato Online

Tema atualíssimo

Historiador e jornalista, Mauro Werkema já produziu diversas publicações sobre a história mineira, que, segundo ele, se mistura à da mineração. Um dos responsáveis pela edição de 2022 do livro, Mauro ressalta que, após 88 anos, a obra prossegue extremamente atual.

“Esse livro tem uma importância histórica, mas também é muito atual em vários aspectos, com informações técnicas sobre a mineração e, sobretudo, a visão nacionalista, que é o que me parece mais importante. De que Minas Gerais não pode ficar só exportando minério de ferro bruto, sem que haja um investimento na indústria de transformação. Minério de ferro bruto não acrescenta emprego maior, coisas dessa natureza. Então o professor Clodomiro fez esse livro que tem esse conteúdo histórico político, mas também um conteúdo técnico muito interessante sobre a mineração em Minas e a absoluta necessidade de implantação da indústria siderúrgica”, diz.

O jornalista ainda ressalta que não é possível ignorar a importância da mineração, mas é justo exigir que haja uma contrapartida ao estado. “Não podemos ser contra a mineração, ela é importante em vários aspectos da vida contemporânea. Mas é preciso que Minas Gerais tenha a devida retribuição pela exploração do seu rico subsolo. Isso não ocorre apenas com o minério de ferro, ocorreu desde o princípio da ocupação do território com o ouro. É um debate oportuno, necessário que se faça, e esse livro, ao ser patrocinado pela AMIG, tem o claro objetivo de estimular esse debate”.

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O jornalista Mauro Werkema fala ao público. Foto: Victor Eduardo/DeFato Online

Dívida inaceitável

Presidente da AMIG, Zé Fernando teceu críticas à Vale. Segundo ele, é “lamentável” que a gigante da mineração não pague uma dívida já reconhecida em todas as esferas.

“É lamentável que uma companhia do tamanho da Vale se negue a pagar uma dívida que já foi auditada, que já foi inscrita na dívida da União, que já foi perdida judicialmente. E que através de subterfúgios ganhe tempo para não pagar uma dívida líquida e certa em cima de um produto já vendido e que já teve lucro”, protesta.

Questionado pela reportagem se as empresas mineradoras tiram mais do que entregam para a região, o prefeito de Conceição do Mato Dentro adotou um tom mais conciliador.

“Acho que a mineração é fundamental e pode agregar muito aos municípios se feita de maneira responsável, protegendo o meio ambiente e cumprindo a lei. A AMIG apoia a mineração sustentável, apoia essa atividade que é a base da economia do nosso estado e dos nossos territórios. Tenho certeza que a mineração feita de uma maneira correta agrega muito mais do que gera prejuízos”, afirma.

E hoje ela é feita de maneira correta? Zé Fernando, mais uma vez, opta pela cautela. “Sobretudo depois das tragédias de Mariana e Brumadinho, não há mais espaço para uma mineração que não respeita o meio ambiente, não inclui as pessoas e não tem a sustentabilidade nas suas práticas cotidianas”.

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Foto: Victor Eduardo/DeFato Online

Realidade preocupante

Um dos nomes a falar ao público, Marco Antônio Lage é, hoje, diretor de meio ambiente da AMIG. Para além disso, o pessebista administra uma cidade que vive sob o temor de um possível fim da extração mineral. Em seu discurso, o prefeito de Itabira pontua que o município pode se tornar um case positivo ou negativo quanto ao cenário de pós-mineração.

Além das barragens, que estão numa situação em tese contornada, temos um drama pela frente da exaustão mineral, o empobrecimento e o esvaziamento de uma cidade que tanto deu ao país. Então agradeço muito a atuação da diretoria da AMIG, que abraçou a causa de Itabira como um case que vai ser muito negativo pro Brasil e pra própria Vale – que tem que se apresentar para o mundo – ou pode ser um case de recuperação, de regeneração e sustentabilidade, servindo de referência para outros territórios minerários do Brasil.

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Foto: Victor Eduardo/DeFato Online

Diálogo federal

A AMIG enviou, recentemente, um manifesto ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que abrange as diretrizes prioritárias para o setor mineral. Nesse texto, um dos pontos de atenção são as outorgas minerárias. “Diferentemente de outros países do mundo, as concessões dos recursos minerais brasileiros concedidos pela ANM são de caráter ‘eterno’ (até a exaustão da mina). Em decorrência disso, o Brasil perde porque as concessões são renovadas somente uma única vez, deixando de abrir oportunidades e uma concorrência, legítima e necessária, para outros empreendedores minerários, as vezes, em uma opção vantajosa para o país”, explica Waldir Salvador.

O documento também cobra a necessidade do cumprimento da Lei 13.540/2017, que determina que 7% da receita da Cfem seja aplicada na Agência Nacional de Mineração (ANM). “A falta de estrutura de uma agência reguladora no segmento favorece ações de sonegação e evasão fiscal por parte das empresas mineradoras”, ressalta.

A AMIG também solicita a revisão da Lei Kandir, retirando a incidência da lei sobre os recursos minerais não renováveis. A norma foi criada, em 1996, para incentivar as exportações e incrementar a produção nacional. Na sua concepção original, ao desonerar o ICMS destes produtos, o legislador estabeleceu que haveria uma compensação das perdas das receitas aos estados e municípios exportadores. A associação também trata da modernização do código mineral brasileiro, priorizando a autonomia do município sobre todo o processo, incluindo as concessões da licença minerária e ambiental.