Fraternidade e fome

Confira o novo texto do padre e colunista da DeFato Online Hideraldo Vieira

Fraternidade e fome

A Quaresma é o Tempo favorável para a conversão. Contudo, embora a conversão seja um movimento inicialmente pessoal e interior, ela não pode ser apenas uma atitude individualista, uma vez que a vontade de Deus, desde a criação, se manifesta como projeto de vida a um povo eleito, nutrido, formado e enviado pelo próprio (Texto Base da CF – 2023, Nº 5).

A  Igreja Católica, neste período da Quaresma, convida a todas as pessoas de boa vontade  a refletir sobre  a situação da FOME e por isso apresentou como tema quaresmal “Fraternidade e Fome” e  o lema “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16). A fome é uma tragédia, um  escândalo, é a negação da própria existência. A Campanha da Fraternidade é um modo brasileiro de celebrar a Quaresma.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) faz eco às palavras do Papa Francisco: Digamos NÃO a uma economia de exclusão e desigualdade, onde o dinheiro reina em vez de servir. Esta economia mata. Esta economia exclui. Esta economia destrói a Mãe Terra. A economia não deveria ser um mecanismo de acumulação, mas a condigna administração da casa comum. […] Uma economia verdadeiramente comunitária – poder-se- -ia dizer, uma economia de inspiração cristã – deve garantir aos povos dignidade, prosperidade e civilização em seus múltiplos aspectos (Discurso aos Movimentos Sociais, em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia, em 09/07/2015).

O Texto-Base da CF-2023 apresenta diversas relações necessárias à compreensão do fenômeno da fome no Brasil atual: fome e escassez hídrica, fome e moradia, fome e política, fome e ecologia, fome e educação, entre outras. E uma série de consequências da fome. Por fim, a CF reconhece o muito que se tem feito no combate à fome no Brasil, ao elencar os reconhecidos trabalhos das diversas Igrejas, ONGs, Movimentos Sociais e outras instituições. Dentro do âmbito eclesial destaca-se o trabalho da Sociedade São Vicente de Paulo (SSVP), da Cáritas Brasileira e da Pastoral da Criança, fundada pela Dra. Zilda Arns.

Alguns dados que são assustadores, com relação à fome no nosso país: há  125,2 milhões de brasileiros que nunca sabem quando terão a próxima refeição; 33 milhões de pessoas enfrentam a fome. A desigualdade alimentar se manifesta com maior força em domicílios rurais, 18, 6%. Em termos geográficos, 25,7%  das famílias em realidade de fome  residem na região Norte e 21% no Nordeste (Dados da REDE PENSSAN).

Hoje, como ontem, discípulos de Jesus que somos, precisamos aprender e reaprender a lógica da partilha, conscientes de que “o homem não vive somente de pão” (Mt 4,4), mas também de pão. Não é simplesmente aprender a partilhar. É aprender a pensar em todo o tempo e lugar, a partir do paradigma da partilha, a partir da lógica na qual o outro ocupa o primeiro lugar e não eu, onde o ser humano é o centro e não o lucro.

O  Texto Base da Campanha da Fraternidade,  apresenta algumas sugestões do que cada um pode fazer diante do flagelo da fome, para ajudar. Afinal, quem tem fome tem pressa:

  • Partilhar o que tem, ainda que seja pouco, com aqueles que mais necessitam, sendo especialmente solidário com quem passa fome de forma mais aguda; Jejuar em atitude solidária com aqueles que passam fome e converter o resultado do seu jejum e penitência quaresmal em alimentos para essas pessoas;
  • Questionar o próprio estilo de vida e de alimentação;
  • Colaborar com entidades sérias e transparentes que arrecadam alimentos;
  • Abolir o desperdício de alimentos, estabelecendo práticas de alimentação saudável;
  • Realizar uma doação significativa para a Coleta Nacional da Solidariedade, no Domingo de Ramos, cujos recursos serão destinados a projetos ligados ao tema da CF 2023;
  • Praticar o voluntariado e envolver-se nos trabalhos e nas ações que já existem na comunidade, como as realizadas pela Sociedade São Vicente de Paulo (Vicentinos), o Serviço da Caridade, as Pastorais Sociais, a Cáritas, etc.;
  • Participar mais ativamente das discussões sociais de políticas públicas e se envolver nas iniciativas públicas (governamentais ou não) de combate à fome e à pobreza.

Que, portanto, esta Quaresma seja vivida em forte espírito de solidariedade. Que nosso jejum abra nosso coração aos irmãos e  irmãs que sofrem com a fome. Que nossa solidariedade seja intensificada. Que saibamos encontrar soluções criativas para a superação da fome, seja no nível mais imediato, assistencial, seja no nível de toda sociedade (Texto Base da CF – 2023).

Padre Hideraldo Verissimo Vieira é pároco na Paróquia Nossa Senhora da Conceição Aparecida – João XXIII – Itabira e licenciado em Filosofia – UFJF, com especialização em Ensino Religioso – PUC Minas.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

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