Grupo de artistas itabiranos questiona contratações para o Festival de Inverno; Fundação esclarece critérios

Segundo os artistas, o problema existe há anos, independentemente da gestão presente na Fundação Cultural ou na pasta de Cultura do município

Grupo de artistas itabiranos questiona contratações para o Festival de Inverno; Fundação esclarece critérios
Foto: FCCDA
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Um grupo de artistas itabiranos têm demonstrado insatisfação com os critérios de contratação de propostas musicais nos eventos da Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade (FCCDA), principalmente no 49º Festival de Inverno. Segundo os músicos, a Fundação tem priorizado artistas que não passaram por edital, recusa propostas com justificativas inexistentes e ‘‘sempre contrata os mesmos nomes’’ em detrimento de projetos que recebem pouca ou nenhuma visibilidade. A DeFato colheu alguns relatos dos artistas e procurou o superintendente da FCCDA, Marcos Alcântara, que se posicionou diante às críticas.    

Wurdeivison Novaes (vocalista da banda Fourtons e que é inscrito no projeto ‘Cultura Todo Dia’) participou do edital do 49º Festival de Inverno, onde inicialmente teve a proposta negada por ‘falta de documentação’. Ao entrar com recurso, a banda conseguiu provar que todos os trâmites estavam certos e a proposta foi aprovada. No entanto, o documento não teve a contratação finalizada pela Fundação. 

Na visão do vocalista da banda de rock/pop rock, a FCCDA prioriza ‘‘uma turma que está sempre participando’’ dos eventos com maiores públicos, enquanto outros artistas – quando contratados – são delegados para eventos sem muito apelo de público.

‘‘Infelizmente isso só vai acabar quando mudar a gestão da Fundação […] Pra te falar a verdade, já estou desistindo de apresentar aqui em Itabira. Estou procurando fazer shows em outras cidades, onde estamos sendo mais valorizados’’

Quem também participou do edital e ficou de fora da edição do Festival de Inverno, foi Ronan Fabrício da Silva, o ‘‘Barbazul”. Ronan faz parte da cena musical itabirana há 20 anos e diz estar frustrado por mais uma vez ter uma proposta negada de forma errônea e ter que ver nomes que não fizeram propostas ao edital serem convidados a participar de mais uma edição. 

‘‘Muitas bandas e projetos incríveis são discriminados e nem se inscrevem mais nos editais […] A questão não é nem a galera que vai tocar. Se deixassem de trazer um show grande, poderiam dar oportunidade pra todo mundo tocar, mostrar o trabalho… A Fundação sempre fala em fomentar a cultura, mas nunca vi. Quando tem a oportunidade de tocar no Festival de Inverno, um festival grande, que atrai a região inteira, eles não dão a oportunidade. Esse papo aí é marketing, na prática eles não fazem isso. Muita gente também tem vontade de falar, mas tem medo de retaliação.’’

Ainda segundo o músico, o problema não é musicalidade e repertório, pois isso os artistas tem de sobra. Em sua avaliação, a questão existe há anos, independentemente da gestão presente na Fundação Cultural ou na pasta de Cultura do município. Após a publicação da programação completa, Ronan disse ter ficado surpreso ao ver diversos projetos convidados, que não passaram por edital e com ‘figuras marcadas’ da Fundação. Ele indagou: ‘‘Pra que lançam o edital? Pra que tenho que inscrever meus projetos? Vi ali que tem projetos que nunca tocaram juntos, que nunca se apresentaram em conjunto. Tem pessoas ali que vão tocar em dois, três projetos convidados. Estão tirando o espaço de outras pessoas’’

Outro artista que também teceu críticas à Fundação foi Eduardo Patrocínio. Segundo ele – que não quis participar do edital neste ano – a ‘panelinha’ não é uma novidade dentro da instituição: ‘‘Não é de hoje, isso é antigo. A Fundação sempre teve seus preferidos, isso é fato. Sempre os mesmos músicos lá dentro, sempre com seus queridinhos. Profissionais, claro. Eles fazem o seu corre. Mas sempre teve isso […] Se observar, a maioria dos músicos que vão atuar nesse festival são convidados’’

‘Quando a gente bate de frente e vai contra, a Fundação fecha as portas. Se você vai contra, te prepara que vai ficar sozinho nessa maré’’, disse Eduardo sobre possíveis retaliações da instituição.

Gustavo ‘Nego Massa’ também não participou das inscrições do edital (por problemas de saúde), mas corrobora com as reclamações a respeito da desvalorização dos artistas locais. Segundo ele, essas questões são antigas e frequentes, e existe uma ‘diferença de tratamento’ da Fundação com os artistas itabiranos em relação a músicos de fora, sem citar os grandes nomes do mainstream. ‘‘Eles agem como se estivessem fazendo um favor para a gente’’, disse Gustavo. O músico também disse que já procurou a FCCDA para tirar dúvidas em relação à trâmites de documentação e afins, mas não obteve nenhum retorno. 

Confira a lista de classificados e desclassificados para o 49º Festival de Inverno de Itabira. 

O que diz a Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade?

Segundo o superintendente da FCCDA, Marcos Alcântara, quando a instituição lança algum edital, ele é publicado com regras bem estabelecidas, sinalizando que ‘‘nenhuma proposta pré-aprovada tem a obrigação de ser contratada’’. De acordo com Alcântara, existe uma comissão de curadores (geralmente composta por pessoas que não pertencem ao município) que analisam cada uma das propostas enviadas pelos artistas. 

O superintendente da FCCDA, Marcos Alcântara durante o lançamento do 49º Festival de Inverno. Foto: Guilherme Guerra/DeFato.

Marcos também disse que neste ano, 98% dos artistas da programação do Festival de Inverno não participam frequentemente das atividades da Fundação, citando os nomes de Rafael Formiga, André Lima, Clevinho Martins, DJ Vinni, o projeto Groove Paralelo, Ruben, Cláudio Zimba e Amine Jabour. 

O superintendente também afirmou que para dar neutralidade às contratações, não participa de nenhum processo de seleção das propostas e que quando algum funcionário da Fundação faz parte da curadoria, essa participação se dá ‘‘por questões específicas’’. 

‘‘Muitos dos motivos que as vezes o artista itabirano precisa entender e precisa buscar a cada dia ter um procedimento claro sobre o que é o objetivo, é seguir o que o edital pede, principalmente a temática. Não é somente a pessoa fazer um show, ela precisa estar com um proposta dentro da temática do festival ou do edital que está participando’’, disse Alcântara. 

Ao se referir às críticas sobre a falta de instrução nos editais, Marcos disse que a Fundação oferece treinamentos, atendimentos e análise de planejamentos em parceria com a Unifei através do Centro de Referência e Atendimento ao Artista Itabirano (Criar). Questionado sobre a existência de uma ‘panelinha’ de artistas em detrimento de nomes da cena musical itabirana que não recebem – ou pouco recebem – oportunidades da atual gestão, Alcântara disse que ‘isso não existe’: ‘‘A Fundação é democrática, dá oportunidade a todo momento para pessoas novas, que estão trazendo concepções voltadas dentro da temática do edital’’

‘‘Essas pessoas podem estar reclamando porque elas não estão fazendo ou tendo aquela participação constante como sempre foram nos antigos festivais, com os mesmos grupos participando […] Não são as mesmas pessoas que estão trocando, a cada projeto buscamos trazer um novo projeto ou alguém que não participa tanto, visando que a Fundação possa ser essa casa da cultura, representar todo mundo e que esse ‘bolo’ possa ser dividido por várias pessoas, não sempre os mesmos. Nós não temos panelinha’’, finalizou.