Promotora Giuliana Fonoff recomenda que asfaltamento Carmo-Ipoema não comece até que Prefeitura apresente a licença ambiental

Em entrevista à DeFato, a promotora de Justiça disse que solicitou ao governo Marco Antônio Lage explicações sobre o caso após uma representação feita pela Associação Mineira de Defesa do Ambiente

Promotora Giuliana Fonoff recomenda que asfaltamento Carmo-Ipoema não comece até que Prefeitura apresente a licença ambiental
Foto: Prefeitura de Itabira/Divulgação

No dia 29 de julho, o prefeito Marco Antônio Lage (PSB) assinou a ordem de serviço para o asfaltamento da estrada entre Senhora do Carmo e Ipoema, distritos de Itabira. Porém, o empreendimento vem gerando questionamentos. A Associação Mineira de Defesa do Ambiente (AMDA) entrou com uma representação no Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) pedindo esclarecimentos sobre o processo de licenciamento da obra — principalmente por entender que a via passa próxima a uma área de preservação permanente (APP), o Parque Estadual Mata do Limoeiro.

Diante disso, a promotoria já solicitou à Prefeitura Municipal um posicionamento sobre o caso e recomendou que a empreitada não seja iniciada até que todas as dúvidas sejam devidamente esclarecidas. O Executivo Municipal, em nota enviada à DeFato, garante que “trata-se de um trecho cuja a distância dispensa o licenciamento ambiental conforme documento emitido pela Superintendência Regional de Meio Ambiente (Supram)”.

O que diz a AMDA?

De acordo com a representação da entidade, assinada pela advogada Lígia Vial Vasconcelos, “há impactos ambientais negativos que devem ser analisados, mitigados e devidamente compensados”. Entre as situações citadas está o atropelamento de animais silvestres, considerado uma das principais consequências desse tipo de empreendimento para o meio ambiente.

O documento cita a bióloga Fernanda Abra, considerada umas das maiores especialistas no assunto. Segundo ela “o atropelamento de animais silvestres seria a principal causa de perda crônica de fauna no Brasil, junto com a caça ilegal e o tráfico de animais, e já foi equiparado à destruição de habitats como causa de extinção de espécies”.

“Considerando a importância e o grau de preservação da área proposta para o asfaltamento, o atropelamento certamente será um impacto significativo. É necessário, a realização de estudos específicos definindo os hotspots de travessia, medidas de mitigação e compensação, como, por exemplo, construção de passagens de fauna adequadas, cercas condutoras, sinalização e redutores de velocidades em pontos estratégicos”, afirma a AMDA.

Outro ponto destacado pela entidade é “a necessidade de regularização ambiental das jazidas que fornecerão cascalho e areia para construção da sub base do asfalto. Na regularização é fundamental que se preveja ações de recuperação dessas áreas quando da finalização das obras”.

A AMDA também diz que é necessário verificar “se haverá necessidade de supressão de vegetação e a observância das exigências contidas na Lei Federal n° 11.428/2006 (Lei da Mata Atlântica), principalmente no que tange a estudos de fisionomia e compensação”.

“Por fim, citamos a necessidade de anuência do órgão gestor do Parque Estadual do Limoeiro, após consulta ao seu Conselho Consultivo, de acordo com a Lei Federal n° 9985/2000. É de fundamental importância que os impactos para a unidade de conservação sejam devidamente debatidos pelo conselho a fim de que se estabeleçam as medidas de compensação e mitigação adequadas”, diz a entidade.

Além dos questionamentos referentes à licença ambiental, a AMDA garante que tem tentado contato diário, desde o dia 5 de agosto, com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Itabira “para obter informações sobre a pavimentação e acessar os estudos ambientais”. Mas sem conseguir nenhum retorno.

“Dessa forma, diante do exposto, e considerando que a estrada atravessa região considerada prioritária para proteção da biodiversidade, solicitamos a V. Sª. [MPMG] providência para que sejam considerados os impactos aqui citados na regularização ambiental da pavimentação da estrada em questão”, destacou a entidade.

“Solicitamos ainda a tomada de providência para que o município de Itabira torne público e disponibilize à sociedade os documentos ambientais relativos à regularização ambiental supracitada”, encerra o documento.

O que diz o Ministério Público?

Em entrevista ao portal DeFato, a promotora Giuliana Talamoni Fonoff destacou a importância de ter acesso ao processo de licenciamento ambiental para o asfaltamento da estrada entre Carmo e Ipoema para verificar se todos os aspectos envolvendo a obra, sobretudo os impactos que podem ser gerados devido a proximidade com uma APP.

“Eles [AMDA] apontaram questões que eu achei bastante pertinentes, uma que tinha até passado meio despercebida, mas é extremamente relevante, é que essa estrada vai passar no meio do parque estadual [Mata do Limoeiro]. Só o fato de passar dentro de uma unidade de conservação, que é o parque estadual, já eleva, vamos dizer assim, a complexidade do processo de licenciamento. Isso em tese porque preciso analisar tudo”, avaliou Giuliana Fonoff.

“Também existe a necessidade de passar aí pelo conselho consultivo do parque, como se fosse uma autorização para que isso aconteça ali dentro. O parque tem que dar essa autorização”, continuou.

Em ao menos duas oportunidades (leia aqui e aqui), o secretário de Meio Ambiente, Denes Lott, comentou sobre o licenciamento ambiental, afirmando que apenas o Documento Autorizativo de Intervenção Ambiental (DAIA) seria suficiente para liberar a execução da obra. Porém, Giuliana Fonoff acredita que diante da complexidade do empreendimento, principalmente pela proximidade com uma APP, o DAIA não seria suficiente — mas ela ressalta que para se ter a melhor avaliação é necessário ver todo o processo de licenciamento ambiental da obra, mas que ainda não teve esse acesso.

“O DAIA é um documento diverso. Ele normalmente é requerido e conseguido para intervenções em áreas de preservação permanente. O licenciamento ambiental é outra coisa, um procedimento mais complexo. O DAIA é uma coisa específica para uma intervenção, então é possível que dentro de um processo ambiental, de um processo de licenciamento ambiental, tenham vários DAIAs por conta de várias intervenções”, explicou Giuliana Fonoff.

“Então, [o DAIA] é um negócio bem mais específico e que eu acho que não seria suficiente. Eu não tenho uma informação de detalhes técnicos da obra, então eu ainda não consigo verificar qual tipo de licença ou se só o DAIA seria suficiente — a princípio, entendo que não. Não é nem a questão de ser uma obra de grande monta, mas ela é extensa. Certeza que ela terá várias intervenções em todos os quilômetros que vão ser asfaltados”, acrescentou.

Por fim, a promotora de Justiça afirmou que já solicitou ao governo Marco Antônio Lage esclarecimentos sobre o licenciamento ambiental do asfaltamento entre Carmo-Ipoema, assim como uma cópia de todo o processo junto aos órgãos ambientais. Além disso, ela recomendou que a Prefeitura de Itabira não inicie a obra até que todas as dúvidas sejam esclarecidas.

“No nosso ofício para o prefeito, no final eu recomendei que não seja dado início a nenhuma obra sem que tenha o deferimento do licenciamento ambiental”, garantiu Giuliana Fonoff.

O que diz a Prefeitura de Itabira?

Nesta terça-feira (5), o portal DeFato procurou a assessoria de comunicação da Prefeitura de Itabira, que emitiu o seguinte posicionamento:

“Trata-se de um trecho cuja a distância dispensa o licenciamento ambiental conforme documento emitido pela Supram. Sendo assim, como será necessário alguns alargamentos, algumas árvores terão que ser suprimidas, o que gera a necessidade do DAIA, tanto para este fato quanto para as travessias situadas em margens de rios, denominadas APPs. Haverá compensação em área de mata Atlântica situada na mesma bacia hidrográfica a ser adquirida pelo município”.