O PT reivindica a devolução simbólica do mandato de Dilma Rousseff: Fernando Collor também será beneficiado?

O alagoano foi atropelado por um Fiat Elba. Já a mineira (ou gaúcha) despencou de uma bicicleta

O PT reivindica a devolução simbólica do mandato de Dilma Rousseff: Fernando Collor também será beneficiado?
oto: Wilson Dias/Agência Brasil

Antes de tudo, um pequeno esclarecimento, embora desnecessário, mas é uma exigência da consciência. Primeiro ponto. Não votei em Fernando Collor de Mello nas eleições de 1989. Tenho dois motivos para tal decisão: antipatia e incompatibilidade filosófica. Não escolhi Dilma Rousseff no pleito de 2014.  Há uma causa para essa atitude: aversão pessoal, apesar de afinidade ideológica. Resumo da ópera. Nunca me encantei com a gerentona.  Jamais fui com a cara do fictício Caçador de Marajás”.  

Esses dois personagens foram vítimas de “acidentes de trânsito”. O alagoano foi atropelado por um Fiat Elba. Já a mineira (ou gaúcha) despencou de uma bicicleta. Não apresento, porém, o mais leve rubor facial para afirmar que o impeachment deles foi papagaiada de republiqueta de bananas. Uma patuscada típica da periferia do planeta. O antigo-governador de Alagoas é portador de natural arrogância. A madame também padece desse mal crônico. 

Os dois cometeram pecado mortal no presidencialismo de coalizão: bateram de frente com o Legislativo.  Fernando Imaginava ter respaldo suficiente para confrontar senadores e deputados. Apostou todas as fichas em seu suposto capital eleitoral. Mas os milhões de votos depositados nas urnas não conseguiram aplacar a fúria do PT e outras agremiações progressistas. A esquerda ainda contou com o reforço do recém-nascido Centrão.  Essa improvável conjunção antagônica (direita fisiológica e esquerda radical) demoliu Collor de Mello. 

Mas note-se. O governo colorido já nasceu enroscado. O chefe do Executivo tinha sérios problemas familiares. Essa situação complicou ainda mais quando o maluco Pedro Collor decidiu botar fogo no parquinho. O mano invejoso e ressentido deu uma longa entrevista à revista Veja. O vilão da República de Alagoas atirou em todas as direções. Fez sérias acusações e não apresentou provas de nada.  A conversa fiada, no entanto, foi suficiente para a propagação de intensas labaredas em Brasília.   O inconsistente depoimento do caçula ocasionou a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as suposições divulgadas pelo órgão de imprensa da família Civita. 

O morador da Casa da Dinda não tentou impedir a implantação da CPI. Foi infantil.  Achou que a estrovenga   daria  em nada. Mas deu. Deu tudo errado. Consequência previsível.  Uma multidão de “caras pintadas” invadiu as ruas das grandes cidades. Patricinhas e mauricinhos exigiram a cabeça do caçador de encrencas.  A pressão da multidão foi fatídica.  Fernando Collor de Mello caiu de maduro (ou podre) com apenas dois anos de mandato.  

O impeachment foi simples fruto de mera insatisfação parlamentar. Não havia nada de ilegal na administração do playboy. Um dos principais astros da quizumba institucional foi o jovem presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Lindbergh Farias. Hoje- já com os cabelos ligeiramente nevados-  é deputado federal pelo PT do Rio de Janeiro. Fernando Collor foi inocentado pelo STF em 1994.  A derrubada do político nordestino, portanto, foi uma farsa do parlamento tupiniquim.  

Dilma Rousseff foi reeleita e iniciou o segundo mandato em 2015. O novo governo começou sob o signo da desconfiança. A derrota do candidato Aécio Neves aconteceu no limite da margem de erro. Uma diferença de apenas 3,8%. A economia não ia bem. Nessa área, o Brasil funciona de uma forma bastante peculiar. A queda do poder de compra não afeta a elite econômica e nem pessoas em extrema pobreza.  Muito menos tem impacto nos sobreviventes da necropolítica (moradores em condição de rua, por exemplo).  A falta de dinheiro provoca muito mau humor   na   classe média (os consumidores compulsivos). Esse segmento lotou novamente as ruas e provocou a queda da petista. 

A pedalada fiscal-  o pretexto para o bota-fora de Rousseff- foi uma piada de mau gosto. A “bicicletada” é uma manobra corriqueira  em todos os níveis da administração pública nacional. Governadores e prefeitos pedalam   o tempo todo.  No final das contas, o PT acabou experimentando o mesmo veneno que injetou nas veias política de Collor. Resumo da ópera.  Dilma foi despejada do Palácio da Alvorada.  Recentemente, o poder judiciário inocentou a antiga mandatária. 

E aqui está a faceta mais irônica desse conto. Os petistas agora reivindicam uma revisão na história. Os “companheiros” exigem a devolução simbólica do mandato de Dilma. A proposta é do deputado Lindebergh Farias, um dos astros do impeachment do marajá alagoano. Concordo com a proposição do carioca.  Espero, porém, que a isonomia prevaleça. Afinal, a Justiça engavetou os processos contra os dois ex-presidentes. Então, a iniciativa de Farias deveria beneficiar a ambos. Afinal, Dilma Rousseff e Fernando Collor estão num mesmo balaio da história. É tudo uma questão de coerência.

Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

MAIS NOTÍCIAS