Moradores do Fênix denunciam violência policial em evento do MC Júnior PK; PM se posiciona

Participantes do sorteio questionam conduta da PM durante a ocorrência

Moradores do Fênix denunciam violência policial em evento do MC Júnior PK; PM se posiciona
Foto: Reprodução
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No último final de semana, uma entrega de prêmios promovida pelo MC Júnior PK terminou em tumulto e na prisão do cantor de funk belorizontino em Itabira. O caso aconteceu durante o sábado (3), na avenida Olímpio Domingos Cardoso, no bairro Fênix, e ganhou repercussão estadual.

Segundo a Polícia Militar (PM), o artista foi detido por “perturbação do sossego, co-autoria em lesão corporal e dano ao patrimônio público”. Além disso, a corporação alega ter sido recebida com pedras, paus, latas de cerveja e outros materiais, o que lhe forçou a “empregar o uso de força diferenciado”. Porém, moradores da região contestam a versão dada pela PM, amplamente divulgada nos últimos dias.

Participantes do evento acusam a Polícia Militar de Itabira de agir com agressividade e truculência, promovendo abuso policial, inclusive, contra crianças e idosos que participavam da atividade.

Relatos recebidos pelo portal DeFato apontam que o evento transcorria de forma tranquila até a chegada dos militares. Pouco depois do MC Júnior PK subir em uma caminhonete e falar ao público, uma viatura teria chegado ao local e um policial, identificado como Alvarenga, passou a espirrar gás lacrimogêneo na população. Até então, dizem os denunciantes, o clima era amistoso entre o cantor e os itabiranos, que o tratavam com bastante afeto. Outra militar mobilizada para a ocorrência, cujo nome não foi identificado, não teve a conduta questionada pelos denunciantes.

Uma moradora de longa data do Fênix, que preferiu falar de forma anônima, narrou à DeFato o que presenciou no sábado. “Até então estava tranquilo, sem confusão. Assim que o rapaz (MC Júnior PK) chegou, a rua ficou toda fechada, não tinha como ônibus passar. Aí de repente chegou o carro da polícia, e ele (policial) falou ‘que se f***, eu vou passar’, e começou a espirrar o negócio. O que mais revoltou todo mundo é que tinha muita criança, muitos pais com filhos, menino tossindo e vomitando. Foi muito triste”, detalha.

Segundo ela, a PM possivelmente foi acionada para desobstruir o trânsito da via, totalmente tomado pelos participantes do evento. Porém, não houve diálogo ou esclarecimento dos militares que se deslocaram ao local.

Ação e reação

Moradora do residencial do Fênix, a itabirana Anna Dallyla também faz relato parecido. Segundo ela, além do gás lacrimogêneo, a população também foi alvo de tiros de borracha e bombas de efeito moral após a chegada de novas viaturas. A essa altura, diz, a situação já estava fora do controle.

“A população estava esperando o MC Júnior PK para a entrega de um prêmio a um morador. Em dado momento, ele chegou e foi muito receptivo com a população, houve muita troca de carinho. Ele e o ganhador subiram na carroceria, ele explicou a premiação…”, inicia.

“Neste momento, passados alguns minutos, de forma totalmente abusiva, os policiais chegaram. E apenas um policial, chamado Alvarenga, desceu da viatura e já foi, de forma agressiva, abordando as pessoas, utilizando gás lacrimogêneo, tiro de borracha, bombas de efeito moral… e aí foi um alvoroço danado, uma correria danada. Até o momento não tinha uma confusão. A população realmente se revoltou e desferiu pedras contra a polícia, que causou aquele alvoroço todo e gerou a retaliação da população. Sendo que a PM iniciou a agressão”, completa a itabirana de 31 anos.

Anna Dallyla também é enfática ao dizer que não aprova nenhum tipo de agressão. Porém, ressalta, a reação revoltada de alguns dos presentes só ocorreu devido à truculência policial.

“Não concordo com agressões em hipótese alguma. Só que eu, como bem comum e cidadã, entendo que a polícia é um órgão pacificador de conflitos, organizador e de segurança. Então no momento em que eles chegaram, da forma que chegaram, e tendo as imagens do que aconteceu, eles colocam na cabeça da população que nossa segurança está forjada. Eles poderiam ter abordado tranquilamente, ter falado com o cara do evento e o ganhador ‘olha, precisamos evacuar porque está tampando a via’. Mas não foi assim que aconteceu”, analisa.

Acompanhada de um dos seus filhos, de apenas sete anos, Anna foi uma das atingidas pelo gás lacrimogêneo. Embora tenha ficado até desacordada, ela pondera que o pior poderia ter acontecido, caso os alvos fossem outros grupos de risco.

“Quando usaram gás lacrimogêneo, eu fui uma das atingidas. Sou portadora de asma, meu filho menor, Arthur, também é. E no momento a única coisa que tentei fazer foi protegê-lo. Só que quando fui proteger ele, me expus. Então automaticamente o gás lacrimogêneo entrou por minhas vias aéreas, fazendo com que não conseguisse mais respirar, e vindo até a perder os sentidos. Da mesma forma que aconteceu comigo, poderia ter acontecido com outras pessoas, pois tinha criança, idoso e grávida. Colocou a vida da população em risco também”, conta.

“A notícia que está rodando está descrita de forma totalmente incorreta, não é aquilo que aconteceu. Se a gente não tivesse vídeo, estaríamos sendo massacrados 24 horas”.

Desabafo

Ainda de acordo com Anna Dallyla, a situação do sábado ajuda a entender o preconceito sofrido por ela e os demais moradores da região. Como base, a itabirana menciona uma atuação policial feita em um contexto parecido, mas com postura bem diferente, nas últimas semanas.

“Sou moradora do residencial Fênix, somos vistos como favelados, bandidos e pessoas que gostam de fazer arruaça. Somos vistos como pessoas desrespeitosas. No dia da premiação do rei e da rainha do carnaval, logo após o fim do evento, uma galera se juntou no centro, colocou um som automotivo para fazer um baile. A Polícia Militar chegou, simplesmente estacionou na região, se posicionou, e transmitiu à população que a polícia estava no local. Mostrou que ali não iria ocorrer nenhum ato ilícito”. 

“Qual a diferença do que aconteceu lá para o que aconteceu aqui no Fênix? Será que é o bairro? Será que é a população ou a classe social? E é isso que a gente sente. Lógico que existem pessoas aqui que não são do bem, mas existem muitos trabalhadores, mães, mães solteiras, pais de família. Então é nítida essa diferença”, finaliza.

O que diz a PM

Procurado pela reportagem, o 26º Batalhão da Polícia Militar de Itabira, por meio de sua assessoria, afirma não ter recebido nenhuma reclamação formal quanto à abordagem do último sábado. Porém, a corporação diz analisar as imagens divulgadas, além de prometer medidas cabíveis caso necessário. Nos últimos dias, a PM também divulgou um release no qual dá sua versão sobre os fatos, confira-o abaixo

No sábado, dia 03, por volta das 18h25min, a Polícia Militar foi acionada para intervir em um evento não autorizado na Rua Matilde Bragança Pereira, Bairro Fênix, Itabira. O local estava aglomerado com mais de 200 pessoas, bloqueando a via sem autorização. 

Durante a intervenção, vários participantes do evento atiraram objetos, como paus, pedras, latas de cerveja e garrafas, dentre outros, contra as guarnições. Com o intuito de conter a agressão e garantir a segurança dos militares e cidadãos presentes, foi necessário empregar o uso de força diferenciado, utilizando espargidor de pimenta e disparos com munição de elastômero. No local não foram verificadas vítimas resultantes dessas ações da PM.

Duas viaturas foram danificadas e dois militares sofreram lesões, um nos braços e outro nos joelhos, devido a objetos arremessados pela multidão. Após o cessar das agressões, identificou-se o responsável pelo evento, que visava entregar prêmios e distribuir dinheiro na via, sendo conduzido à Delegacia de Polícia Civil por perturbação do sossego e co-autoria em lesão corporal e dano ao patrimônio público, por assumiu o risco do resultado ao realizar o evento sem nenhuma autorização, comunicação ou condições de segurança à população.

Salienta-se que não houve comunicação prévia com a Polícia Militar sobre a realização do evento, o que comprometeu a segurança, culminando na interdição total da via e violação do direito de ir e vir dos cidadãos. Participantes do evento chegaram a ameaçar e chutar veículos que tentavam circular no local, causando diversos acionamentos à PM para restabelecer a ordem e cessar a perturbação do sossego aos moradores locais.

A DeFato também entrou em contato com o MC Júnior PK, mas também não recebeu retorno do cantor. O espaço segue aberto para eventuais posicionamentos.