Cérebro podre e mente acelerada: os males da humanidade
No Brasil, a preocupação com o equilíbrio emocional segue em alta, com foco particular na ansiedade
No final de 2024, a Universidade de Oxford, na Inglaterra, apontou o termo “brain rot” como a expressão mais pesquisada do ano. Traduzido como “cérebro podre”, o conceito foi buscado mais de 130 mil vezes nos últimos 12 meses, segundo a instituição. Embora divulgada em dezembro, a abordagem ganhou relevância em janeiro no impulsionamento de campanhas voltadas para a conscientização sobre saúde mental.
No Brasil, a preocupação com o equilíbrio emocional segue em alta, com foco particular na ansiedade. Uma pesquisa do Instituto Ideia revelou que 22% dos brasileiros consideram a ansiedade a pauta mais relevante nas discussões sobre saúde. Outros assuntos destacados incluem resiliência (21%), inteligência artificial (20%), incerteza (20%) e extremismo (4%).
O conceito de “cérebro podre” descreve a deterioração intelectual provocada pelo consumo excessivo de conteúdos superficiais. Já a angústia reflete uma sobrecarga mental gerada pelo excesso de informações, acúmulo de tarefas e pela constante antecipação do futuro. Ambos os fenômenos estão ligados ao impacto das redes sociais e da tecnologia, que criam um ambiente de urgência e superficialidade.
Em 2013, o psiquiatra e escritor Augusto Cury definiu a ansiedade como a “doença do século” em uma de suas obras. Ele relacionou o transtorno à “síndrome do pensamento acelerado”, afirmando que “pensar excessivamente é a maior falha do Eu como gestor psíquico”. Essa perspectiva continua atual e reflete um padrão comportamental cada vez mais presente: a compulsão por múltiplas ocupações.
Atividades como assistir filmes em velocidade acelerada, realizar ações durante as refeições ou caminhar enquanto ouvimos podcasts exemplificam uma atitude frenética do cotidiano. Muitos desses hábitos passam despercebidos, mas evidenciam o desgaste psicológico a que estamos submetidos.
Recentemente, o depoimento do padre Fábio de Melo trouxe à tona a gravidade desse cenário. Durante uma apresentação, na Arena Pernambuco, em São Lourenço da Mata, o religioso revelou estar enfrentando a depressão, um problema que já o abalara anteriormente. “Eu só tenho um pensamento nessa vida: a vontade de deixar de viver”, desabafou, comovendo os fiéis.
Mesmo que os fatores específicos que levaram o sacerdote a essa condição sejam tema para um debate futuro, é inegável que sua situação dialoga com as questões aqui abordadas. Depressão e esgotamento da mente não se resolvem apenas com espiritualidade ou fé; exigem compreensão e enfrentamento dos desafios impostos pela modernidade.
A aceleração do tempo, incompatível com os limites biológicos, é um agravante. Além disso, as redes sociais, ao inundarem nossa rotina com novidades, dificultam o processamento de experiências significativas. Paralelamente, a evolução do conhecimento dilui as fronteiras entre trabalho e vida pessoal, ocupando momentos que deveriam ser de repouso e desconexão.
Por fim, uma reflexão pessoal ilustra o impacto desse ritmo. Em conversas recentes, com um amigo reservado, discutimos o esgotamento psíquico. Durante um desses encontros, ele afirmou: “Quem corre demais na terra chegará mais cedo ao céu.” A frase, carregada de significados, levou-me a questionar meus próprios hábitos. Não há como negar: a carapuça serviu-me.
P.S.: O termo “brain rot” (“cérebro podre”) foi usado pela primeira vez em 1854 por Henry David Thoreau, no livro “Walden”. O autor criticava a falta de valorização de ideias complexas e comparava o “brain rot” ao apodrecimento das batatas na Inglaterra.
Thiago Jacques é professor universitário, treinador na Escola Troka e administrador.
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