“A melhor guerra é aquela que não acontece, porque numa guerra todo mundo perde”, adverte André Viana

Em entrevista exclusiva ao jornalista Fernando Silva, o presidente do Sindicato Metabase de Itabira fala sobre a exaustão do minério e as eleições sindicais de 2022

“A melhor guerra é aquela que não acontece, porque numa guerra todo mundo perde”, adverte André Viana
Foto: Jackson Faustino / DeFato Online
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O sindicato Metabase de Itabira passa por um dos mais tensos momentos da sua história. São 76 anos de muita tradição. O clima, porém, é de muita apreensão. A atmosfera pesada é um indicativo de como se desenvolverá o processo para a escolha da nova diretoria da instituição, daqui a um ano.

É muito difícil fazer sindicalismo hoje em dia. A margem para negociações com as empresas ficou bastante reduzida. Alguns fatores contribuem para esse quadro adverso: a acentuada precarização dos direitos trabalhistas e a grave crise econômica, que já provocou a demissão de 14,4 milhões de trabalhadores, em todo o país. Um recorde assustador.

Ainda assim, André Viana Madeira – presidente da entidade – mantém um discurso realista. “No mundo de hoje, o caminho do diálogo é o mais importante, mas às vezes, tem o caminho da resistência, do enfrentamento”, resume Viana.

Na entrevista a seguir, o dirigente analisa a atual situação do sindicalismo no Brasil, demonstra preocupação com a exaustão das minas da Vale e fala sobre a delicada eleição sindical de 2022.

DeFato: O advento do neoliberalismo, principalmente na economia, promoveu o enfraquecimento da atividade sindical. Nessa conjuntura, quais são as armas dos sindicatos para tentar, pelo menos, lutar em condições de igualdade com uma entidade- tão subjetiva quanto invisível- chamada mercado?

André Viana Madeira: Nós assumimos o sindicato no final de 2018, exatamente logo depois da reforma trabalhista proposta pelo governo Michel Temer, que inclusive retira recursos das entidades sindicais. Vários sindicatos fecharam as portas. Só em Minas Gerais, 168 sindicatos fecharam as portas. E é provável que esse número tenha aumentado. Então, precisamos promover a transformação cultural do meio sindical. Se por um lado temos o inimigo e algoz, que é o sistema ou o neoliberalismo, temos também outro inimigo, que é o fogo amigo, que se encontra dentro do próprio movimento sindical. Então, há um grande desafio para as mentes que dirigem os sindicatos Brasil afora, que é fazer uma renovação e inovação, porque o público que tínhamos antes era de empresas estatais, mas hoje, estamos lidando com um público de empresas privatizadas, como é o caso da Vale. Um poema de Carlos Drummond, de que gosto muito, diz o seguinte: “Eu procuro cantar uma canção, que faça adormecer as crianças e acordar os homens”. Então, quem precisa dormir é a criança. Os adultos precisam ficar acordados. Hoje, nós temos uma juventude trabalhista. Atualmente, na empresa Vale, de 70% a 80% dos empregados têm em torno de 30 anos de idade. Ou nós nos inovamos para nos adaptarmos a essas mudanças, ou realmente a sentença será de extinção.

DeFato: O senhor citou um termo que chamou a atenção: fogo amigo. Poderia definir mais claramente o real significado dessa expressão?

André Viana: O fogo amigo aconteceu porque as lideranças sindicais se misturaram com a política partidária, não que isso seja errado, mas houve muitos maus exemplos dessa situação (mistura de política com sindicalismo). Tem até um presidente da república oriundo do movimento sindical, é verdade, não é? Mas houve um enfraquecimento (do movimento sindical) e incompreensão pelos maus exemplos elencados. E essa contrariedade ficou tão grande, que chegou ao ponto de você ser mal interpretado até por usar uma camisa vermelha. Esse foi o ponto a que chegamos, porque todas as pessoas (os sindicalistas) começaram a ser julgadas como se estivessem num mesmo balaio. A imagem dos sindicatos começou a ser deturpada. Lógico que tem a participação da mídia porca e do capitalismo vassalo em tudo isso. Mas quando o enfraquecimento do sindicalismo, proposto pelo sistema, é alimentado por algumas situações dentro do movimento sindical, fica muito mais fácil esse objetivo do sistema (de enfraquecimento do sindicalismo).

DeFato: A mídia itabirana, inclusive a DeFato, tem divulgado algumas conquistas do Metabase em benefício dos trabalhadores. Qual tem sido a sua estratégia de negociação com a direção das empresas, nesse momento de enfraquecimento da atividade sindical?

André Viana: o nosso lema é diálogo para conquistar, resistência para avançar. Na atividade sindical, assim como na vida, você tem momentos. E o momento do diálogo é muito importante, porque é quando você chama as empresas para a responsabilidade e apresenta a real situação econômica delas e dos trabalhadores. Agora mesmo, estamos em acordo coletivo com a Vale, Anglo American e Grupo Belmont. Nós encomendamos um estudo para mostrar a situação econômica das empresas e dos trabalhadores. Então, é preciso embasamento para mostrar esse poder de convencimento. É claro que o capital sempre vai buscar lucrar mais e valorizar menos. No mundo de hoje, o caminho do diálogo é o mais importante, mas, às vezes, tem o caminho da resistência, do enfrentamento. Quando não é possível o diálogo, tem o caminho do enfrentamento pela via judicial ou política. Mas eu tenho aprendido que a melhor guerra é aquela que não acontece, porque numa guerra todo mundo perde.

DeFato: No passado, a mais importante ferramenta do sindicalismo era a greve. Na atualidade, essa alternativa encontra-se totalmente inviável, deixou de ser uma estratégia de negociação…

André Viana: pelo menos, na iniciativa privada, a greve é quase impossível. A gente ainda vê muitas greves no meio dos servidores públicos, por exemplo, por causa da estabilidade. No meio privado, o qual eu represento, há um receio muito grande de se perder o emprego. E tem outra situação, que é a do jovem que se encontra temporariamente na empresa. Ele (o jovem) está estudando e se não cresceu numa empresa, ele vai para outra. Com isso, o turnover (rotatividade de pessoal) é muito intenso. E, nesse caso, a greve seria a última opção. E pesa muito também a legislação. O entendimento dos tribunais trabalhistas normalmente é contrário aos trabalhadores.

DeFato: O senhor foi um vereador estreante, na legislatura anterior (2017/2020). E foi um dos destaques da Câmara de Itabira. Tinha amplas condições de emplacar um segundo mandato. Por que preferiu abrir mão da vereança para ser membro do Conselho de Administração da Vale, cargo que não traz tanta visibilidade? Está abrindo mão definitivamente da política partidária?

André Viana: Não abri mão da política partidária, porque mesmo nos bastidores e no cotidiano, ela se encontra em todos nós, que somos amantes da boa política. No ano passado, eu fiz uma opção pessoal, depois de discutir com a minha família e de conversar com algumas lideranças sindicais. Aqui em Minas Gerais, temos uma preocupação muito grande com a possibilidade de exaustão das minas de Itabira, que é algo gravíssimo, porque Itabira tem uma dependência extrema da mineração. Por tudo isso, eu resolvi me dedicar à minha origem, e tive essa oportunidade com a participação no Conselho da Vale. Mas eu não abro mão (de retornar à política partidária), numa oportunidade futura. Nesses quatro anos, que permaneci na Câmara de vereadores, conheci algumas pessoas maravilhosas e outras, nem tanto. Aprendi também a ser mais diplomático e humilde. Mas o futuro a Deus pertence.

DeFato: No ano que vem, haverá eleições para nova diretoria do Metabase. Há muitos raios na linha do horizonte, com prenúncio de forte tempestade. O processo eleitoral tem tudo para ser o mais tenso da história da instituição. O senhor tem alguma ferramenta para tentar distensionar minimamente essa situação política?

André Viana: Eu acho que o trabalho é importante. O trabalhador, o aposentado e a pensionista não estão interessados propriamente em eleições. Eles estão mais interessados nas conquistas, na representação dos seus anseios e desejos. A diretoria do Metabase está motivada e focada no trabalho, em cumprir esse mandato com um bom trabalho, porque a melhor forma de propaganda é o bom trabalho. O ano que vem será outro momento. Se concluirmos o mandato com um bom trabalho, aí chancelamos a oportunidade de tentarmos um novo mandato, e tudo caminha para isso, se Deus quiser. Mas estamos trabalhando muito para que a instituição seja protegida. O Metabase é uma instituição de vanguarda, com 76 anos de história. Antes de mim, grandes expoentes passaram pela instituição. Depois de mim, haverá outros grandes expoentes. Nós temos que proteger a instituição, que sempre foi um sindicato muito poderoso. Então, temos que proteger a instituição das vaidades e vontades pessoais, ou (vontades) políticas meramente. Vamos fazer essa ação com propriedade. Temos uma relação de respeito com os opositores, com aqueles que discordam. A discordância é benéfica, desde que haja respeito e, em alguns momentos, tem faltado o respeito de algumas pessoas envolvidas, mas isso está sendo tratado caso a caso. Nós temos o dever de conduzir o sindicato para uma democracia sadia e que as urnas definam o que é melhor para a instituição.