Abolição da escravatura não bastou para combater as desigualdades raciais
Políticas públicas e reparação histórica são alguns dos vetores importantes para a promoção da igualdade racial; Prefeitura de Itabira promove resgate de tradição afro-brasileira

O Brasil aboliu oficialmente, no dia 13 de maio de 1888, a escravidão com a assinatura da Lei Áurea. O que é muitas vezes retratado como um marco libertador da história nacional, no entanto, está longe de representar justiça aos mais de 1.524.000 homens, mulheres e crianças escravizados, segundo o Censo, feito em 1872, como parte das políticas inovadoras de D. Pedro II. Sem qualquer ação de reparação ou inclusão social, as pessoas foram libertas apenas no papel, abandonadas à própria sorte em uma sociedade que continuaria a marginalizá-las por gerações.
“O povo negro foi liberto sem nenhuma política de reparação, a população negra, em geral, não podia frequentar escolas efetivamente, até a década de 70. As terras foram ‘distribuídas’ entre imigrantes e as pessoas escravizadas não recebiam salários, logo, não tinham condições de comprar terras. Foram construindo moradias precárias nas periferias, o que deu origem às favelas”, explicou Joice Maia, pedagoga, professora e ativista social que compõe a diretoria do Instituto Fala Quilombo.
De acordo com o demógrafo Mario Rodart, coordenador do Núcleo de Pesquisa Histórica Econômica e Demográfica da UFMG, um dos responsáveis pela digitalização do Censo de 1872, o País já pensava estratégias, naquela época, para acabar com a escravidão e passava por um processo de branqueamento da população. Além disso, a abolição no Brasil se tornou uma pauta a partir da luta de abolicionistas, pressão internacional econômica e do medo da organização e revolta dos quilombolas.
Essa exclusão sistemática lançou as bases para desigualdades que atravessam os séculos. O País ainda carrega as marcas do racismo estrutural, como a dificuldade de acesso à educação de qualidade e empregos mais valorizados. Diante deste cenário, o Dia da Abolição da Escravatura, segundo Joice Maia, é uma data para conscientizar e promover uma reforma ao nível histórico.
“Os principais vetores [para combater a desigualdade racial] são reparação histórica com base em políticas públicas efetivas para acessos negados por séculos, como os citados anteriormente, representantes antirracistas nas esferas políticas, no judiciário”, comentou.
A trajetória da população negra, apesar de marcada por esse sistema, não começa com a escravidão. Segundo Joice, é necessário repensar os currículos escolares para que a história da população negra seja contada a partir de uma perspectiva humana, que valorize as contribuições em áreas como tecnologia, medicina e engenharia, reconhecendo o papel essencial dos povos africanos na formação do Brasil, em detrimento à narrativa da população negra como escravizados e depois libertos.
Inspirado no Festival Fala Quilombo, que celebra a confluência da cultura afro-brasileira entre teatro, exposição, música e política, o Instituto Fala Quilombo nasceu oficialmente em fevereiro de 2025 e busca celebrar as conquistas, a ancestralidade e a cultura. A iniciativa surgiu através de um grupo de pesquisa e extensão da Universidade Federal de Itajubá (Unifei) – campus Itabira chamado OCDoce, o Observatório de Conflitos e Confluências de Comunidades Rurais da Bacia do Rio Doce.
Como parte da programação especial para o Dia da Abolição da Escravatura, a Diretoria de Promoção da Igualdade Racial da Prefeitura de Itabira promove neste domingo (18) o “Resgate da Festa de São Benedito, Santa Efigênia e Divino Espírito Santo, no bairro Praia”.
O evento começa às 7h, com a chegada das guardas de marujada na avenida Juiz de Fora, 413. Às 8h30, o cortejo segue com as imagens até a rua Carmésia, onde ocorre o restante da programação. A festa é uma forma de resistência cultural e reafirmação da identidade afro-brasileira.