Ailton Krenak analisa efeitos da mineração em Itabira. “É um legado que as crianças terão que dar conta”

Líder indígena está na cidade para participar do III Flitabira

Ailton Krenak analisa efeitos da mineração em Itabira. “É um legado que as crianças terão que dar conta”
Ailton Krenak (à esq.) é uma das ilustres presenças do III Flitabira.
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Uma das principais vozes brasileiras nas pautas indígenas e ambientais, Ailton Krenak comentou sobre o legado deixado pela mineração para o futuro de Itabira e o impacto – ressaltado, inclusive, por Drummond – da atividade em cada morador do município. A fala ocorreu durante a abertura do III Flitabira, realizada nesta quarta-feira (1º). O escritor participou de uma entrevista coletiva ao lado do sociólogo Sérgio Abranches, o neto de Carlos Drummond de Andrade e curador da obra do poeta, Pedro Drummond, e João Cândido Portinari, filho do icônico artista plástico brasileiro Cândido Portinari.

Fazendo referência à letra de Sampa, de Caetano Veloso, Ailton Krenak opina que caberá às crianças itabiranas “darem conta” do legado da atividade que “ergue e destrói coisas belas”. Ele, no entanto, não exime de responsabilidade as atuais gerações.

“Nessa atmosfera drummondiana, não me esqueço de onde estou. Estamos na Bacia do Rio Doce. Itabira é uma das cidades mais antigas que se estabeleceu na Bacia do Rio Doce, ainda no ciclo da colonização. Ela ainda tem características coloniais escondidas atrás dessa fachada moderna que os prédios e outros equipamentos trouxeram para facilitar a vida da população urbana. Mas eu sei que os reflexos da atividade econômica que ergue e destrói coisas belas está no centro da vida dessa comunidade. E o poeta Carlos Drummond deixou uma marca indelével da sua visão e do seu entendimento de experimentar o ferro nas calçadas e também nas pessoas. E muito provavelmente essas marcas ainda vão permanecer presentes para as futuras gerações, é um legado que as crianças vão ter que dar conta. Então nós temos que ter uma corresponsabilidade com essa realidade, do ponto de vista presente, e com a história da ocupação da região do Vale do Rio Doce”, diz.

Krenak

Como alguém que reside às margens do Rio Doce, o líder indígena se diz atento e tocado por estar em Itabira. “Eu vivo à margem desse rio, a reserva indígena Krenak fica lá no município de Resplendor, à margem esquerda do rio para quem acompanha seu curso. Da janela da minha cozinha, avisto o corpo do rio flagelado pela lama de Mariana. Então não tenha dúvida do quanto me toca estar aqui e o sentido de estar aqui”.

Duras críticas

Outro tema comentado por Krenak é a condução das pautas indígenas no país. Em clara crítica ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP), e ao Senado, hoje presidido por Rodrigo Pacheco (PSD), o ambientalista reconhece o tímido e recente avanço da causa, mas diz acreditar que é preciso mais.

“Se a gente considerar o que vinha acontecendo nos últimos seis ou oito anos, poderíamos entender esse momento de agora como um momento muito criativo da vida nacional, onde assuntos que estavam interditados vem à tona. E quem é contra se manifesta contra, como o atual presidente da Câmara dos Deputados (Arthur Lira). Tanto o Senado quanto a Câmara dos Deputados mostraram os dentes, mostraram que eles queriam mesmo que os índios tivessem desaparecidos, estão alinhados com o fascismo que tentou botar fogo na floresta até o ano passado. A gente saiu de um pesadelo e agora estamos começando a redimensionar a questão social no Brasil, onde a pauta indigena ganha expressão. Mas não significa que ganha aceitação”.